Mário de Miranda Quintana (Alegrete, 30 de julho de 1906 — Porto Alegre, 5 de maio de 1994) foi um poetatradutor e jornalistabrasileiro.
Mário Quintana fez as primeiras letras em sua cidade natal, mudando-se em 1919 para Porto Alegre, onde estudou no Colégio Militar, publicando ali suas primeiras produções literárias. Trabalhou para a Editora Globo e depois na farmácia paterna. Considerado o "poeta das coisas simples", com um estilo marcado pela ironia, pela profundidade e pela perfeição técnica, ele trabalhou como jornalista quase toda a sua vida. Traduziu mais de cento e trinta obras da literatura universal, entre elas Em Busca do Tempo Perdido de Marcel ProustMrs Dalloway de Virginia Woolf, e Palavras e Sangue, de Giovanni Papini.
    Em 1953, Quintana trabalhou no jornal Correio do Povo, como colunista da página de cultura, que saía aos sábados, e em 1977 saiu do jornal. Em 1940, ele lançou o seu primeiro livro de poesias, A Rua dos Cataventos, iniciando a sua carreira de poeta, escritor e autor infantil. Em 1966, foi publicada a sua Antologia Poética, com sessenta poemas, organizada por Rubem Braga ePaulo Mendes Campos, e lançada para comemorar seus sessenta anos de idade, sendo por esta razão o poeta saudado naAcademia Brasileira de Letras por Augusto Meyer e Manuel Bandeira, que recita o poema Quintanares, de sua autoria, em homenagem ao colega gaúcho. No mesmo ano ganhou o Prêmio Fernando Chinaglia da União Brasileira de Escritores de melhor livro do ano. Em 1976, ao completar setenta anos, recebeu a medalha Negrinho do Pastoreio do governo do estado do Rio Grande do Sul. Em 1980 recebeu o prêmio Machado de Assis, da Academia Brasileira de Letras, pelo conjunto da obra.

Vida pessoal

 Mário Quintana não se casou nem teve filhos. Solitário, viveu grande parte da vida em hotéis: de 1968 a 1980, residiu no Hotel Majestic, no centro histórico de Porto Alegre, de onde foi despejado quando o jornal Correio do Povo encerrou temporariamente suas atividades, por problemas financeiros[1] e Quintana, sem salário, deixou de pagar o aluguel do quarto. Na ocasião, o comentarista esportivo e ex-jogador da seleção Paulo Roberto Falcão cedeu a ele um dos quartos do Hotel Royal, de sua propriedade. A uma amiga que achou pequeno o quarto, Quintana disse: "Eu moro em mim mesmo. Não faz mal que o quarto seja pequeno. É bom, assim tenho menos lugares para perder as minhas coisas".
Essa mesma amiga, contratada para registrar em fotografia os oitenta anos de Quintana, conseguiu um apartamento no Porto Alegre Residence, um apart-hotel no centro da cidade, onde o poeta viveu até sua morte. Ao conhecer o espaço, ele se encantou: "Tem até cozinha!". Em 1982, o prédio do Hotel Majestic, que fora considerado um marco arquitetônico de Porto Alegre, foi tombado. Em 1983, atendendo a pedidos dos fãs gaúchos do poeta, o governo estadual do Rio Grande do Sul adquiriu o imóvel e transformou-o em centro cultural, batizado como Casa de Cultura Mario Quintana. O quarto do poeta foi reconstruído em uma de suas salas, sob orientação da sobrinha-neta Elena Quintana, que foi secretária dele de 1979 a 1994, quando ele faleceu  Segundo Mario, em entrevista dada a Edla Van Steen em 1979, seu nome foi registrado sem acento. Assim ele o usou por toda a vida. Faleceu em 1994 em Porto Alegre. Encontra-se sepultado no Cemitério São Miguel e Almas em Porto Alegre. Em 2006, no centenário de seu nascimento, várias comemorações foram realizadas no estado do Rio Grande do Sul em sua homenagem.

Relações com a ABL
O poeta tentou por três vezes uma vaga à Academia Brasileira de Letras, mas em nenhuma das ocasiões foi eleito; as razões eleitorais da instituição não lhe permitiram alcançar os vinte votos necessários para ter direito a uma cadeira. Ao ser convidado a candidatar-se uma quarta vez, e mesmo com a promessa de unanimidade em torno de seu nome, o poeta recusou.
Cquote1.svg
Só atrapalha a criatividade. O camarada lá vive sob pressões para dar voto, discurso para celebridades. É pena que a casa fundada por Machado de Assis esteja hoje tão politizada. Só dá ministro.
Cquote2.svg
— Mario Quintana

Cquote1.svg
Se Mário Quintana estivesse na ABL, não mudaria sua vida ou sua obra. Mas não estando lá, é um prejuízo para a própria Academia.



Cquote1.svg
Não ter sido um dos imortais da Academia Brasileira de Letras é algo que até mesmo revolta a maioria dos fãs do grande escritor, a meu ver, títulos são apenas títulos, e acredito que o maior de todos os reconhecimentos ele recebeu: o carinho e o amor do povo brasileiro por sua poesia e pelo grande poeta e ser humano que ele foi...
Cquote2.svg
Obras
Obra poética
A Rua dos Cataventos,1940 
Canções,1946 
Sapato florido,1948 
O aprendiz de feiticeiro,1950 
Espelho mágico,1951 
Poesias,1962 
Quintanares,1976 
A vaca e o hipogrifo, 1977 
Esconderijos do tempo,1980 
Baú de espantos,1986 
Preparativos de viagem,1987 
Da preguiça como método de trabalho, 1987 
Porta giratória,1988 
A cor do invisível, 1989 
Velório sem defunto,1990 
Água, 2001 

 Antologias 
 Antologia poética, 1966 
Prosa & verso, 1978 
Na volta da esquina,1979 
Nova antologia poética,1981 
Literatura comentada,1982 
Primavera cruza o rio,1985 
80 anos de poesia,1986 

Ora bolas, 1994 
Traduções
Dentre os diversos livros que o poeta traduziu para a Livraria do Globo (Porto Alegre) estão alguns volumes do Em Busca do Tempo Perdido, de Marcel Proust (talvez seu trabalho de tradução mais reconhecido até hoje), e obras de Honoré de BalzacVoltaireVirginia WoolfGraham GreeneGiovanni Papini e Charles Morgan. Além disso, estima-se que Quintana tenha traduzido um sem-número de histórias românticas e contos policiais, sem receber créditos por isso - uma prática comum à época em que atuou na Globo, de 1934 a 1955.
Homenagens
Manuel Bandeira dedicou-lhe um poema, onde se lê:

Meu Quintana, os teus cantares
Não são, Quintana, cantares:
São, Quintana, quintanares.
Quinta-essência de cantares…
Insólitos, singulares…
Cantares? Não! Quintanares!

pajador Jayme Caetano Braun, dedicou ao poeta a Payada a Mario Quintana, segue abaixo um trecho da poesia:
Entre os bem-aventurados
Dos quais fala o evangelho,
Eu vejo no mundo velho
Os poetas predestinados,
Eles que foram tocados
Pela graça soberana,
Mas a verdade pampeana
Desta minh’alma irrequieta,
É que poeta nasce poeta
E poeta é o Mario Quintana!
Em Pelotas, há uma escola que recebeu o nome do poeta. Em Porto Alegre, Mário Quintana é nome de um bairro da Zona Norte da cidade.

Prêmio Jabuti
Em 1981 recebeu o Prêmio Jabuti de Personalidade Literária do Ano.

Frases de Quintana

Esperança
Lá bem no alto do décimo segundo andar do Ano Vive uma louca chamada Esperança E ela pensa que quando todas as sirenas, Todas as buzinas, Todos os reco-recos tocarem Atira-se — ó delicioso voo! Ela será encontrada miraculosamente incólume na calçada, Outra vez criança... E em torno dela indagará o povo: — Como é teu nome, meninazinha de olhos verdes? E ela lhes dirá (É preciso dizer-lhes tudo de novo!) Ela lhes dirá bem devagarinho, para que não esqueçam: — O meu nome é ES-PE-RAN-ÇA.
Vida
Vale a pena viver - nem que seja para dizer que não vale a pena...
Alma
A alma é essa coisa que nos pergunta se a alma existe.
Arte
A arte de viver é simplesmente a arte de conviver simplesmente, disse eu? Mas como é difícil!
Amizade
A amizade é um amor que nunca morre.
Ginástica
Qual Ioga, qual nada! A melhor ginástica respiratória que existe é a leitura, em voz alta, dos Lusíadas.
Preguiça
A preguiça é a mãe do progresso. Se o homem não tivesse preguiça de caminhar, não teria inventado a roda.
Nuvem
E o que quer dizer uma nuvem? - respondi triunfante. Uma nuvem - disse ela - umas vezes quer dizer chuva, outras vezes bom tempo...
Perguntas
Mas o que quer dizer este poema? - perguntou-me alarmada a boa senhora.
Ideias
Qualquer ideia que te agrade, Por isso mesmo... é tua. O autor nada mais fez que vestir a verdade Que dentro em ti se achava inteiramente nua...
Amor Alheio
E assim, ouvi-lhe todo o amor alheio. Ah, pobre amigo, nunca saibas tu Como é ridículo o amor... alheio!
Reflexão
Reflexão de Lavoisier ao descobrir que lhe haviam roubado a carteira: nada se perde, tudo muda de dono.
Esquecimento
Se me esqueceres, só uma coisa, esquece-me bem devagarinho.
Comunicação Direta
Não me ajeito com os padres, os críticos e os canudinhos de refresco: não há nada que substitua o sabor da comunicação direta.
Passado
O passado não reconhece o seu lugar: está sempre presente.
Beber
Só se deve beber por gosto: beber por desgosto é uma cretinice.
Expressão
Se um poeta consegue expressar a sua infelicidade com toda a felicidade, como é que poderá ser infeliz?
Crer
Não importa saber se a gente acredita em Deus: o importante é saber se Deus acredita na gente.
Jardim
O segredo é não correr atrás das borboletas. É cuidar do jardim para que elas venham até você.
Velho
O tempo é um ponto de vista. Velho é quem é um dia mais velho que a gente.
Carta
Quando completei quinze anos, meu compenetrado padrinho me escreveu uma carta muito, muito séria: tinha até ponto-e-vírgula. Nunca fiquei tão impressionado na minha vida.
Sofre
Um poeta sofre três vezes: primeiro quando ele os sente, depois quando ele os escreve e, por último, quando declamam os seus versos.
Poeta
Ser poeta não é dizer grandes coisas, mas ter uma voz reconhecível dentre todas as outras.
Vento
O que mais enfurece o vento são esses poetas invertebrados que o fazem rimar com lamento.
Colcha
Minha vida é uma colcha de retalhos. Todos da mesma cor.
Poema
Um poema só termina por acidente de publicação ou de morte do autor.
Isolado
Sempre me senti isolado nessas reuniões sociais: o excesso de gente impede de ver as pessoas.
Esgotar
Há duas espécies de livros: uns que os leitores esgotam, outros que esgotam os leitores.
Interpretação
Não tem por que interpretar um poema. O poema já é uma interpretação.
Poesia
A poesia não se entrega a quem a define.
Moralistas
Ah, esses moralistas... Não há nada que empeste mais do que um desinfetante!
Sonhar
Sonhar é acordar-se para dentro.
Beleza
Dizes que a beleza não é nada? Imagina um hipopótamo com alma de anjo... Sim, ele poderá convencer os outros de sua angelitude - mas que trabalheira!
Amores
Três amores... Quem me deu Tão estranha sorte assim? Três amores, tenho-os eu E nenhum me tem a mim!
Palavras
Se alguém te perguntar o quiseste dizer com um poema, pergunta-lhe o que Deus quis dizer com este mundo...
Amor
Tão bom morrer de amor e continuar vivendo.
Autodidata
Autodidata é um ignorante por conta própria.
Pecados
Esses padres conhecem mais pecados do que a gente.
Chove
Esses que puxam conversa sobre se chove ou não chove - não poderão ir para o Céu! Lá faz sempre bom tempo...
Chatos
Há 2 espécies de chatos: os chatos propriamente ditos e ... os amigos, que são os nossos chatos prediletos.
Hora Exata
Há uns que morrem antes; outros depois. O que há de mais raro, em tal assunto, é o defunto certo na hora exata.
Susto
Mas que susto! Não irão levar essas velhas carolas se Deus existe mesmo.
Estudos
E um dia os homens descobrirão que esses discos voadores estavam apenas estudando a vidas dos insetos...
Modernidade
O mais triste da arquitetura moderna, é a resistência do seu material.
Semelhante
Se eu amo o meu semelhante? Sim. Mas onde encontrar o meu semelhante?
Problemas
O pior dos problemas da gente é que ninguém tem nada com isso.
Macaco
O que me impressiona à vista de um macaco, não é que ele tenha sido nosso passado: é este pressentimento de que ele venha a ser nosso futuro.
Senhora
Senhora, eu vos amo tanto / Que até por vosso marido / Me dá um certo quebranto.
Necropsia
Só a poesia possui as coisas vivas. O resto é necropsia.
Far West
O ruim dos filmes de Far West é que os tiroteios acordam a gente no melhor do sono.
Saudade
O tempo não para! Só a saudade é que faz as coisas pararem no tempo.
Analfabetos
Os verdadeiros analfabetos são os que aprenderam a ler e não leem.
Viagem
O leitor que mais admiro é aquele que não chegou até a presente linha. Neste momento já interrompeu a leitura e está continuando a viagem por conta própria.
Natural
Tudo o que acontece é natural, inclusive o sobrenatural.
Consolo
O grande consolo das velhas anedotas são os recém-nascidos.
Essencial
A resposta certa, não importa nada: o essencial é que as perguntas estejam certas.
Escola Poética
Pertencer a uma escola poética é o mesmo que ser condenado à prisão perpétua.
Livro
O livro traz a vantagem de a gente poder estar só e ao mesmo tempo acompanhado.
Expressão
O estilo é uma dificuldade de expressão.
Burro
Quando alguém pergunta a um autor o que este quis dizer, é porque um dos dois é burro.
Difícil
O mais difícil mesmo, é a arte de desler.
Número Um
Esquece todos os poemas que fizeste. Que cada poema seja o número um.




Leia Mais
Biografia, obras e estilo literário 

  Cecília Meireles é uma das grandes escritoras da literatura brasileira. Seus poemas encantam os leitores de todas as idades. Nasceu no dia 7 de novembro de 1901, na cidade do Rio de Janeiro e seu nome completo era Cecília Benevides de Carvalho Meireles.
   Sua infância foi marcada pela dor e solidão, pois perdeu a mãe com apenas três anos de idade e o pai não chegou a conhecer (morreu antes de seu nascimento). Foi criada pela avó Dona Jacinta. Por volta dos nove anos de idade, Cecília começou a escrever suas primeiras poesias.  
   Formou-se professora (cursou a Escola Normal) e com apenas 18 anos de idade, no ano de 1919, publicou seu primeiro livro “Espectro” (vários poemas de caráter simbolista). Embora fosse o auge do Modernismo, a jovem poetisa foi fortemente influenciada pelo movimento literário simbolista. 
  No ano de 1922, Cecília casou-se com o pintor Fernando Correia Dias. Com ele, a escritora teve três filhas.  
  Sua formação como professora e interesse pela educação levou-a a fundar a primeira biblioteca infantil do Rio de Janeiro no ano de 1934. Escreveu várias obras na área de literatura infantil como, por exemplo, “O cavalinho branco”, “Colar de Carolina”, “Sonhos de menina”, “O menino azul”, entre outros. Estes poemas infantis Colar de Carolina são marcados pela musicalidade (uma das principais características de sua poesia). 
  O marido suicidou-se em 1936, após vários anos de sofrimento por depressão. O novo casamento de Cecília aconteceu somente em 1940, quando conheceu o engenheiro agrônomo Heitor Vinícius da Silveira.  
   No ano de 1939, Cecília publicou o livro Viagem. A beleza das poesias trouxe-lhe um grande reconhecimento dos leitores e também dos acadêmicos da área de literatura. Com este livro, ganhou o Prêmio de Poesia da Academia Brasileira de Letras. 
     Cecília faleceu em sua cidade natal no dia 9 de novembro de 1964.    
Algumas obras:
poesia - Nunca mais e poema dos poemas, Baladas para El-Rei, Viagem, Vaga Música, Mar absoluto, Retrato natural, Amor em Leonoreta, Doze noturnos da Holanda, Romanceiro da Inconfidência, Poemas escritos na Índia, Solombra, Ou isto ou aquilo, etc.
prosa - Notícia da poesia brasileira; Problemas de literatura infantil; Escolha o seu sonho; Giroflê, Giroflá; etc.

A importância de CECILIA MEIRELES para a literatura
   Cecília Meirelles é, sem sombra de dúvida, única. Dentro de uma fase em que o modernismo se voltava para as lutas políticas, para uma produção que tinha como objetivo "educar" e conscientizar, ela apresentou um estilo de poesia diferente - com algumas características simbolistas, como o uso constante de sinestesias - que se voltava mais para o interior do ser humano, tinha um clima mais sincero e intimista, naturalmente instrospectivo. Seus poemas têm um cuidado muito grande com a musicalidade e são envoltos em um universo muitas vezes de sonho, de fantasia, às vezes de solidão (como vocês podem notar no poema "Canção", ).
    Por todas essas características, suas produções costumam ser muito belas e, ao meu ver, extremamente agradáveis de se ler. E, embora muitos possam criticá-la por não seguir a tendência "educativa" de grande parte dos poetas de sua época, não há como a acusá-la de alienada. O poema "Mulher ao Espelho" deixa isto claro, quando, através da introspecção, faz uma crítica às pressões sociais em relação à imagem colocada em cima dos indivíduos no mundo capitalista e à falsidade.
    Cecília Meireles, portanto, foi a grande responsável por consagrar e também popularizar uma literatura intimista e introspectiva que, no futuro, iria se tornar uma marca da literatura feminina, representada também por Clarice Lispector.
    Ainda é interessante lembrar que os poemas de Cecília são também muito marcados pela presença do tempo, ou melhor, pela passagem dele. Ela tem a clara visão de que tudo é transitório e de que o fim está sempre no horizonte; característica que se evidencia no poema "Retrato".
   Uma última coisa que acho legal comentar, é a similaridade de estilos entre ela e Fernando Pessoa. O poeta português e sempre destaco a musicalidade em suas poesias, além da beleza dos versos, exatamente como acontece com Cecília. Inclusive, arrisco-me a dizer que Fernando Pessoa só não é o meu poeta favorito porque não leio a sua obra com a frequência que deveria. 

Características das obras de Cecília Meireles
     Suas principais características são sensibilidade forte, intimisno, introspecção, viagem para dentro de si mesma e consciência da transitoriedade das coisas (tempo = personagem principal). Para ela as realidades não são para se filosofar, são inexplicáveis, basta vivê-las.
    Sua obra reflete uma atmosfera de sonho, de fantasia e, ao mesmo tempo, de solidão e padecimento. Intimismo, lirismo, misticismo e universalidade são as principais características da obra de Cecília Meireles.
  Ela nunca esteve filiada a nenhum movimento literário, porém algumas publicações iniciais (“Espectros”, “Baladas para El-Rei”) revelam alguma ligação com o Simbolismo.
   Sua poesia é intimista e reflexiva (com um tom filosófico), de profunda sensibilidade feminina. Em suas obras ela aborda temas como vida, amor e tempo. A musicalidade (uma das características do Simbolismo) também está presente em seus escritos.
   Cecília Meireles, através de suas próprias experiências de vida, procurou questionar e compreender o mundo em que vivia.
   Todas essas indagações, tristezas e desencantos, marcaram sua poesia, enchendo sua obra de lirismo.
    A autora destacou a necessidade de escrever especificamente para crianças com vistas ao seu pleno desenvolvimento. Escreveu artigos jornalísticos, pronunciou conferências, escreveu poesias, livros, peças teatrais e cantigas de roda de maneira que sua produção literária, em especial, as direcionadas à infância, é uma referência aos educadores que trabalham a leitura em salas de aula da educação infantil.

   VIAGEM: A METAPOESIA EM CECÍLIA MEIRELES
André Luiz Alves Caldas Amóra (UniverCidade)
Tatiana Alves Soares Caldas 
(UNESA e UniverCidade)
Uma palavra caída
das montanhas dos instantes
desmancha todos os mares
e une as terras mais distantes.

     A poesia brasileira, na segunda fase do modernismo, vivia seus melhores momentos. Era uma geração despreocupada com as questões imediatistas da geração de 22. Percebe-se, do ponto de vista literário, uma maturidade, pois não há mais a necessidade de escandalizar os meios acadêmico-culturais - tônica da Geração de 22 -, mas de levar adiante o projeto de liberdade de expressão. Nota-se a presença de versos livres e de sonetos voltados para as questões universais do homem e para os problemas de uma sociedade capitalista. Verificam-se ainda reflexões sobre o fazer poético, além do misticismo e da religiosidade.
     Nessa fase encontram-se poetas como: Carlos Drummond de Andrade, com poesias sociais e de combate e reflexões sobre o papel do homem no mundo; Jorge de Lima, com poesias metafóricas e metafísicas; Murilo Mendes, com poesias surrealistas; Vinícius de Moraes, cuja poesia caminha cada vez mais para a percepção material da vida, do amor e da mulher, e Cecília Meireles, que envereda pela direção da reflexão filosófica e existencial, sendo a autora objeto deste estudo.
     Cecília Benevides de Carvalho Meireles (1901-1964) é a primeira grande escritora da literatura brasileira e a principal voz feminina de nossa poesia moderna. Sua obra privilegia a riqueza do léxico, numa linguagem que explora os símbolos e as imagens sugestivas, sobretudo os de forte apelo sensorial, enveredando inclusive pela musicalidade.
     A rigor, Cecília Meireles nunca esteve filiada a nenhum movimento literário. Sua poesia, de modo geral, filia-se às tradições luso-brasileiras. Apesar disso, suas publicações iniciais - Espectros (1919), Nunca mais... e poemas dos poemas (1923) e Baladas para El-Rei (1925) - evidenciam certa inclinação para o Simbolismo. Essa tendência é confirmada pela participação da autora na revista carioca Festa, órgão literário de orientação espiritualista que defendia o universalismo e a preservação de certos valores tradicionais da poesia. Mário de Andrade enfatiza a sua qualidade artística, mostrando-nos a grande importância dessa poetisa em nossa literatura:
    Ela é desses artistas que tiram seu ouro onde o encontram, escolhendo por si, com rara independência. E seria este o maior traço de sua personalidade, o ecletismo, se ainda não fosse maior o misterioso acerto, dom raro com que ela se conserva sempre dentro da mais íntima e verdadeira poesia. (ANDRADE, 1955: 71)
    Do ponto de vista formal, a escritora foi uma das mais habilidosas, apresentando cuidadosa seleção vocabular. Cultivou uma poesia reflexiva, de fundo filosófico, que abordou, dentre outros, temas como a transitoriedade da vida, a efemeridade do tempo, o amor, o infinito, a natureza, a criação artística. Além disso, a freqüência com que os elementos como o vento, a água, o mar, o ar, o tempo, o espaço, a solidão e a música aparecem em sua poesia dá a ela um caráter fluido e etéreo, que confirmam a inclinação neo-simbolista. A atitude de questionamento e a tentativa de compreender o mundo revelam uma postura intuitiva, realizada a partir das próprias experiências, como se percebe em comentário feito pela poetisa:
     Nasci aqui mesmo no Rio de Janeiro, três meses depois da morte de meu pai, e perdi minha mãe antes dos três anos. Essas e outras mortes ocorridas na família acarretaram muitos contratempos materiais, mas, ao mesmo tempo, me deram, desde pequenina, uma tal intimidade com a Morte que docemente aprendi essas relações entre o Efêmero e o Eterno. (GOLDSTEIN, 1982: 3)
    Viagem, obra que consagra a autora, além da interpretação de uma trajetória espiritual, apresenta poemas que refletem sobre o fazer poético, em indagações ainda encontradas em livros posteriores. Utilizando-se de jogos de palavras, metáforas, sinestesias, dentre outras figuras de linguagem, o eu-lírico investiga o processo de criação literária. Tal questão é tematizada em várias poesias, como se verifica no poema Motivo:

Eu canto porque o instante existe
e a minha vida está completa.
Não sou alegre nem sou triste:
sou poeta.
Irmão das coisas fugidias,
não sinto gozo nem tormento.
Atravesso noites e dias
no vento.
Se desmorono ou se edifico,
se permaneço ou me desfaço,
- não sei, não sei. Não sei se fico
ou passo.
Sei que canto. E a canção é tudo.
Tem sangue eterno a asa ritmada.
E um dia sei que estarei mudo:
- mais nada.
(MEIRELES, 1982: 14)

     Na primeira estrofe, a preocupação com a fugacidade do tempo é evidenciada, como se observa nos dois primeiros versos, com a valorização do instante, que surge como justificativa do cantar que lhe preenche a vida. Ao afirmar não ser alegre nem triste, mas poeta, o eu-lírico defende o distanciamento entre o sentir e o cantar, à semelhança do fingimento pessoano.
     A segunda estrofe reitera a efemeridade e a inconstância do viver. O eu-lírico coloca-se como irmão das coisas fugidias, e essa inconstância é confirmada pela imagem do vento.
Na estrofe seguinte, à imagem da inconstância segue-se a da dúvida, expressa pela repetição da conjunção alternativa, bem como da condicional. O ou e o se que denotam a indefinição que vitima o sujeito lírico são intensificados pelo não sei que se repete de forma exaustiva, marcando a interrogação do eu diante da vida. Observe-se ainda que as inquietações do eu-lírico sugerem uma reflexão sobre o papel da poesia e sobre a recepção da obra de arte pelo público:

Se desmorono ou se edifico,
se permaneço ou me desfaço,
- não sei, não sei. Não sei se fico
ou passo.
(Ibidem: 14)
    A última estrofe retoma a imagem do cantar, aqui visto como um estado de plenitude. A arte teria o poder de retratar o instante e, ao mesmo tempo, de eternizá-lo. O eu-lírico associa diferentes aspectos da criação literária, como a eternidade e a liberdade, nas imagens do sangue eterno e da asa ritmada:

Sei que canto. E a canção é tudo.
Tem sangue eterno a asa ritmada.
E um dia sei que estarei mudo:
- mais nada.
(Ibidem: 14)

    Os dois últimos versos confirmam a importância do canto, na medida em que mostram um eu que tem na poesia sua razão de viver. A mudez a que o eu-lírico se refere opõe-se ao canto poético, e o nada que fecha o poema contrasta com o tudo, relativo aocantar. Nota-se, portanto, que o fazer poético representa a totalidade, restando somente o vazio quando não houver mais arte.
    Um dos aspectos relacionados à metapoesia em Cecília diz respeito à imagem do eu-lírico enquanto poeta. A preocupação quanto ao sentido do ser poeta é evidenciada no poema Discurso:

E aqui estou, cantando.
Um poeta é sempre irmão do vento e da água:
deixa seu ritmo por onde passa.
Venho de longe e vou para longe:
mas procurei pelo chão os sinais do meu caminho
e não vi nada, porque as ervas cresceram e as serpentes andaram.
Também procurei no céu a indicação de uma trajetória,
mas houve sempre muitas nuvens.
E suicidaram-se os operários de Babel.
Pois aqui estou, cantando.
Se eu nem sei onde estou,
como posso esperar que algum ouvido me escute?
Ah! se eu nem sei quem sou,
Como posso esperar que venha alguém gostar de mim?
(MEIRELES, Op. Cit.: 17)

     Neste poema, a idéia do instante verificada em Motivo é retomada através de imagens que traduzem a transitoriedade, como vento e água, e marcas textuais que denotam o instante espaço-temporal presente - E aqui estou -, como se observa nas duas primeiras estrofes. Percebe-se a constatação de um eu que se assume como poeta no verbo cantar e na referência à figura do escritor, também colocado como algo fugidio.
    As duas estrofes seguintes relatam a busca incessante, por parte do eu-lírico, do sentido do canto, expresso inclusive pelo termo discurso, que intitula o poema. O poeta aparece aqui como um andarilho, e sua busca fracassa justamente em virtude da constante mudança das coisas:

Venho de longe e vou para longe:
mas procurei pelo chão os sinais do meu caminho
e não vi nada, porque as ervas cresceram e as serpentes andaram.
Também procurei no céu a indicação de uma trajetória,
mas houve sempre muitas nuvens.
E suicidaram-se os operários de Babel.
(Ibidem: 17)

    Nota-se que o eu-lírico buscou, no chão e no céu, os sinais de sua trajetória. A conjunção mas demonstra uma frustração do ser poético, quando se depara com a falta de clareza - metaforizada pelas nuvens -, ou com serpentes e ervas que lhe cobriram o caminho, simbolizando a efemeridade das coisas. No último verso, é explicitada a angústia do não-entendimento, presente na imagem do suicídio dos operários de Babel.
O instante espaço-temporal é novamente explorado na estrofe seguinte. O eu-lírico enfatiza a insistência de seu cantar:

Pois aqui estou, cantando.
Se eu nem sei onde estou,
como posso esperar que algum ouvido me escute?
Ah! se eu nem sei quem sou,
Como posso esperar que venha alguém gostar de mim?
(Ibidem: 17)

    Observa-se, nas duas últimas estrofes, um ser poético sem rumo, em conflito pela incompreensão do sentido da vida, ou da própria arte. Além da busca ontológica, vê-se a temática da recepção da obra de arte pelo público, expressa pela preocupação comalgum ouvido que o escute ou com alguém que goste dele.
   A reflexão sobre a obra de arte e seu público é encontrada também em Herança, poema que pensa a figura do poeta, bem como sua permanência na posteridade:

Eu vim de infinitos caminhos,
e os meus sonhos choveram lúcido pranto
pelo chão.
Quando é que frutifica, nos caminhos infinitos,
essa vida, que era tão viva, tão fecunda,
porque vinha de um coração?
E os que vierem depois, pelos caminhos infinitos,
do pranto que caiu dos meus olhos passados,
que experiência, ou consolo, ou prêmio alcançarão?
(MEIRELES, op.cit.: 111)

    A herança refere-se tanto à preocupação em permanecer, por meio da obra, no futuro, quanto à influência advinda dos estilos passados, sobretudo do Simbolismo, que marcou de forma inegável a produção ceciliana. Tal influência pode ser mais claramente percebida na primeira estrofe, em que o eu-lírico mostra o lado cósmico de sua poesia, na imagem dos infinitos caminhos. Há também uma reflexão sobre a linguagem - poesia - no lúcido pranto decorrente dos sonhos, quando o eu-lírico pensa o processo de criação artística. Note-se que, apesar de ter sua origem nos sonhos, o pranto é lúcido e se espalha pelo chão, remetendo à transcendência simbolista acrescida de traços modernistas. A questão do surgimento da obra será explorada na estrofe seguinte, na qual é reiterada a indagação referente ao fazer poético, ao abordar a inspiração, aqui associada ao sentimento - coração.
    A última estrofe enfoca diretamente a temática da influência da obra de arte sobre as gerações futuras. Nesse momento, o eu-lírico trabalha a herança a ser deixada por ele. Ao se referir a experiência, consolo ou prêmio, o eu pensa os diferentes olhares lançados sobre a obra de arte:

E os que vierem depois, pelos caminhos infinitos,
do pranto que caiu dos meus olhos passados,
que experiência, ou consolo, ou prêmio alcançarão?
(Ibidem: 111)

    Enfim, a preocupação com o fazer poético nas poesias aqui estudadas cultiva uma reflexão, uma atitude de questionamento e a tentativa de compreender o mundo, através da efemeridade do tempo, da transitoriedade da vida. A poesia de Cecília Meireles, em Viagem, caminha para a fusão da vida e poesia / natureza e poeta, com um caráter fluido e etéreo, que confirma a sua inclinação neo-simbolista.





Leia Mais