Segunda
Geração Modernista (1930-1945)
Estendendo-se de 1930 a 1945, a segunda fase foi
rica na produção poética e, também, na prosa. O universo temático amplia-se com
a preocupação dos artistas com o destino do Homem e no estar-no-mundo. Ao
contrário da sua antecessora, foi construtiva.Não sendo uma sucessão brusca, as
poesias das gerações de 22 e 30 foram contemporâneas. A maioria dos poetas de
30 absorveram experiências de 22, como a liberdade temática, o gosto da
expressão atualizada ou inventiva, o verso livre e
o antiacademicismo. Portanto, ela não precisou ser tão combativa quanto a de
22, devido ao encontro de uma linguagem poética modernista já estruturada.
Passara, então, a aprimorá-la, prosseguindo a tarefa de purificação de meios e
formas direcionando e ampliando a temática da inquietação filosófica e
religiosa, com Vinícius de Moraes, Jorge de Lima, Augusto Frederico Schmidt,
Murilo Mendes, Carlos Drummond de Andrade. A prosa, por sua vez, alargava a
sua área de interesse ao incluir preocupações novas de ordem política, social,
econômica, humana e espiritual. A piada foi sucedida pela gravidade de
espírito, a seriedade da alma, propósitos e meios. Essa geração foi grave,
assumindo uma postura séria em relação ao mundo, por cujas dores,
considerava-se responsável. Também caracterizou o romance dessa época, o
encontro do autor com seu povo, havendo uma busca do homem brasileiro em
diversas regiões, tornando o regionalismo importante. A Bagaceira,
de José Américo de Almeida, foi o primeiro
romance nordestino. Rachel de
Queiroz, Jorge Amado, José Lins do Rego, Érico Verissimo, Graciliano
Ramos, Orígenes
Lessa e outros escritores criaram um estilo novo, completamente
moderno, totalmente liberto da linguagem tradicional, nos quais puderam
incorporar a real linguagem regional, as gírias locais. O humor quase
piadístico de Drummond receberia influências de Mário e Oswald de
Andrade. Vinícius, Cecília, Jorge de Lima e Murilo Mendes
apresentaram certo espiritualismo que vinha do livro de Mário Há uma Gota de Sangue em Cada Poema (1917). A consciência
crítica estava presente, e mais do que tudo, os escritores da segunda geração
consolidaram em suas obras questões sociais bastante graves: a desigualdade
social, a vida cruel dos retirantes, os resquícios de escravidão, o
coronelismo, apoiado na posse das terras - todos problemas sociopolíticos que
se sobreporiam ao lado pitoresco das várias regiões retratadas.
A poesia Modernista da 2ª Fase
A poesia da segunda fase do Modernismo representa um amadurecimento e um
aprofundamento das conquistas da geração de 1922: é possível perceber a
influência exercida por Mário e Oswald de Andrade sobre os jovens que iniciaram
sua produção poética após a realização da Semana. Lembramos, a propósito, que
Carlos Drummond de Andrade dedicou seu livro de estréia, Alguma poesia (1930),
a Mário de Andrade. Murilo Mendes, com seu livro História do Brasil, seguiu a
trilha aberta por Oswald, repensando nossa história com muito humor e ironia,
como ilustra o poema “Festa familiar”:
“Em outubro de 1930
Nós fizemos – que animação!
Um pic-nic com carabinas.”
Formalmente, os novos poetas continuam a pesquisa estética iniciada na
década anterior, cultivando o verso livre e a poesia sintética, de que é
exemplo ó poema “Cota zero”, de Drummond:
“Stop. A vida parou
ou foi o automóvel’?”
Entretanto, é na temática que se percebe uma nova postura artística:
passa-se a questionar a realidade com mais vigor e, fato extremamente importante,
o artista passa a se questionar como indivíduo e como artista em sua “tentativa
de explorar e de interpretar o estar no mundo”. O resultado é uma literatura
mais construtiva e mais politizada, que não quer e não pode se afastar das
profundas transformações ocorridas nesse período; daí também o surgimento de
uma corrente mais voltada para o espiritualismo e o intimismo, caso de Cecília
Meireles, de Jorge de Lima, de Vinícius de Moraes e de Murilo Mendes em
determinada fase. É um tempo de definições, de compromissos, do aprofundamento
das relações entre o “eu” e o mundo, mesmo com a consciência da fragilidade do
“eu”. Observemos três momentos de Carlos Drummond de Andrade em seu livro
Sentimento do mundo (o título é significativo), com poesias escritas entre 1935
e 1940:
“Tenho apenas duas mãos / e o sentimento do mundo”
Mais adiante, em verdadeira profissão de fé, declara:
“Não, meu coração não é maior que o mundo.
É muito menor.
Nele não cabem nem as minhas dores.
Por isso gosto tanto de me contar.
Por isso me dispo, por isso me grito,
por isso freqüento os jornais, me exponho cruamente nas livrarias:
preciso de todos.”
Essa consciência de ter “apenas” duas mãos e de o mundo ser tão grande,
longe de significar derrotismo, abre como perspectiva única para enfrentar
esses tempos difíceis a união, as soluções coletivas:
“O presente é tão grande, não nos afastemos. Não nos afastemos muito,
vamos de mãos dadas.”
Modernismo no Brasil - a 2ª geração: O Romance de
30
Depois da Semana de Arte Moderna, a ideia de
"modernismo" - ou seja, de novas atitudes artísticas contra a arte
encarada como artificial, contra tudo o que os escritores consideravam
"velho"- parecia não ter sido absorvida e a literatura no Brasil
parecia não ter mudado em nada. Entretanto, alguns intelectuais de
várias regiões começaram a manifestar-se: a verdadeira arte moderna devia
retratar criticamente um Brasil mais abrangente, que mal se conhecia, cujas
desigualdades sociais fossem retratadas com vigor num realismo próprio do século
20. A arte literária, segundo vários intelectuais, devia sair dos "salões
aristocráticos de São Paulo", quer dizer, devia abandonar o contato apenas
com o urbano, influenciado pelas vanguardas europeias.
O Romance de 30
Em 1926, ocorre um
congresso em Recife e nele se encontram escritores do Nordeste; estes se
dispõem, aos poucos, a fazer uma prosa regional consistente e participativa. É
dessas primeiras manifestações que surgirá um dos momentos mais autênticos da
literatura brasileira, o Romance de 30.A data de 1930 é
marcante porque consolida a renovação do gênero romance no Brasil, ou seja,
traz novos rumos à prosa. Depois de tanta arruaça intelectual dos primeiros
modernistas no Sudeste do país, procura-se atingir equilíbrio e estabilidade,
que, aos poucos, vai aparecendo em obras e mais obras: O quinze, de Rachel de Queiroz(1930); O país do Carnaval, de Jorge Amado (1931); Menino de engenho,
de José Lins do Rego (1932); São Bernardo, de Graciliano Ramos (1934); e Capitães da areia, de Jorge Amado (1937).Esta nova
literatura em prosa será antifascista e anticapitalista, extremamente vigorosa
e crítica. Os livros didáticos a chamam com vários nomes: "Romance de
30" (porque é o início cronológico da nova literatura); romance neo-realista(porque essas obras conseguiram
renovar e modernizar o realismo/naturalismo do século 19, enriquecendo-o com
preocupações psicológicas e sociais) ou romance regionalista moderno (porque
escapa das metrópoles e vai ao Brasil regional, preso ainda a antinomias dos
séculos anteriores).Lembremos,
inclusive, que algumas obras sociológicas fundamentais surgem nessa mesma
época: Casa-grande & senzala,
de Gilberto Freyre, é de 1933, e Raízes do Brasil, de Sérgio Buarque de Hollanda, de 1936.De todos os nomes
para essa época, o melhor parece ser o do título deste artigo. Por quê? Porque
os romances de Rachel de Queiroz, Jorge Amado, José Lins do Rego, Érico
Verissimo, Graciliano Ramos e outros escritores criaram um estilo novo,
completamente moderno, totalmente liberto da linguagem tradicional, nos quais
puderam incorporar a real linguagem regional, as gírias locais.
A consciência crítica
Mais do que tudo,
através dessa "fala", consolidaram em suas obras questões sociais
bastante graves: a desigualdade social, a vida cruel dos retirantes, os
resquícios de escravidão, o coronelismo, apoiado na posse das terras - todos
problemas sociopolíticos que se sobreporiam ao lado pitoresco das várias
regiões retratadas.
Leia, por exemplo,
um trecho de Vidas secas, de
Graciliano Ramos:
“Na planície
avermelhada os juazeiros alargavam duas manchas verdes. Os infelizes tinham
caminhado o dia inteiro, estavam cansados e famintos
[...]
Arrastaram-se para lá, devagar, Sinhá Vitória com o filho mais novo escanhacado no quarto e o baú de folha na cabeça, Fabiano sombrio, cambaio, o aió a tiracolo, a cuia pendurada numa correia presa ao cinturão, a espingarda de pederneira no ombro. O menino mais velho e a cachorra Baleia iam atrás.”
Arrastaram-se para lá, devagar, Sinhá Vitória com o filho mais novo escanhacado no quarto e o baú de folha na cabeça, Fabiano sombrio, cambaio, o aió a tiracolo, a cuia pendurada numa correia presa ao cinturão, a espingarda de pederneira no ombro. O menino mais velho e a cachorra Baleia iam atrás.”
Perceba a força
narrativa com que o narrador descreve a cena cruel, de retirantes exaustos sob
o sol, a família silenciosa e triste, com a qual ele se solidariza ("os
infelizes"); ele e nós, os leitores. A lentidão proposital da narrativa é
a superação difícil do caminho sob o sol (para onde vai quem não tem terras?) e
a secura descritiva reproduz o silêncio dos que estão exaustos. Essa é a seca
vida do herói - agora um anti-herói -, humilhado e vencido pelo meio hostil. Esses romances
foram fundamentais para o amadurecimento da consciência crítica e social do
leitor brasileiro. Com eles, encontramos formas de compreensão do homem em
várias faixas da sociedade brasileira e do determinismo que o persegue em
situações adversas. É injusto pensarmos que esses romances mostraram apenas as
"mulatas gabrielas" para o mundo exterior. As formas de narrar o
cotidiano ficaram mais complexas e tensas.
Leia mais um trecho
de Graciliano Ramos, não da história de Fabiano, mas da de Paulo Honório, que
foi guia de cego e trabalhador de enxada, mas conseguiu conquistar, com
violência e determinação, além da fazenda de São Bernardo, respeito, dinheiro e
prestígio: virou um coronel. Teria sido um Fabiano que deu certo? Parece que
não:
“Cinquenta anos
perdidos, cinquenta anos gastos sem objetivo, a maltratar-me e a maltratar os
outros.
O resultado é que
endureci, calejei
[...]
Creio que nem
sempre fui egoísta e brutal. A profissão é que me deu qualidades tão ruins.
[...]
Não consigo modificar-me, é o que aflige.
[...]
Não consigo modificar-me, é o que aflige.
[...]
A culpa foi minha, ou antes, a culpa foi desta vida agreste que me deu uma alma agreste”.
A culpa foi minha, ou antes, a culpa foi desta vida agreste que me deu uma alma agreste”.
A adesão ao socialismo impôs aos escritores da época,
às vezes de forma radical, fórmulas de compreensão do homem em sociedade. Os
romancistas, imbuídos do sentimento de missão política, queriam mostrar as
tensões que transformavam ou destruíam os homens - aliás, um tema universal e
sempre vivo na literatura. Mas o fato é que
sem os modernistas de 1922 (1ª geração), dificilmente os modernistas de 1930
(2ª geração) teriam conseguido o feito literário e social que obtiveram, porque
aqueles foram os primeiros que provocaram a atualização da
"inteligência" brasileira, foram eles que trouxeram para a literatura
o fato não-literário e a oralidade, que tanto beneficiou o realismo seco dos
escritores regionalistas, dando-lhes maior autenticidade. Por outro lado,
mesmo com os romances mais pitorescos e menos brutais, os leitores aprenderam,
como nos ensina Alfredo Bosi (História concisa da literatura
brasileira), que o velho mundo dos homens poderosos não acaba tão
facilmente: as estruturas das oligarquias regionais se mantêm através do poder
e da força, e é contra eles que se tem de lutar. Como nos conta Jorge Amado, ao
final de Capitães da areia:
“No ano em que
todas as bocas foram impedidas de falar, no ano que foi todo ele uma noite de
terror, esses jornais (únicas bocas que ainda falavam) clamavam pela liberdade
de Pedro Bala, líder da sua classe, que se encontrava preso numa colônia.
[...] E no dia em que ele fugiu..., em inúmeros lares, na hora pobre do jantar,
rostos se iluminaram ao saber da notícia. [...] Qualquer daqueles lares se
abriria para Pedro Bala, fugitivo da polícia. Porque a revolução é uma pátria e
uma família.”
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