ANÁLISE DO
POEMA “A ARTE DE AMAR”, DE MANUEL BANDEIRA
“Arte de
amar” é um poema de Manuel Bandeira que compõe a obra Belo Belo publicada em
1948. O livro foi incluído na nova edição de Poesias Completas; esta lançada
pela primeira vez em 1940. Durante a década de quarenta, Bandeira já era um
poeta elogiado pela crítica. Seus poemas tinham alcançado enorme aceitação
entre o público. A admiração pelo poeta era tamanha. A prova disso se deu na
década anterior, mais especificamente em 1936 — ano do cinquentenário de
Bandeira —, quando os amigos editaram um livro intitulado de Homenagem a Manuel
Bandeira. A obra continha estudos críticos, comentários e impressões sobre o
poeta.
Para analisarmos qualquer poema de Manuel Bandeira,
é de suma importância ressaltar que ele foi uma das figuras mais importantes do
modernismo brasileiro. O movimento modernista no Brasil eclodiu de fato em 1922
na semana da arte moderna. A idéia basilar dos seus integrantes era a de romper
com os padrões tradicionais da arte. Destarte, na poesia, isso ocorreu de forma
bastante marcante, uma vez que a versificação tradicional cedeu espaço aos
versos livres. Temas, como, por exemplo, o do cotidiano brasileiro foram
trazidos à tona através dos versos modernos. Além disso, a poesia modernista
incorporou um vocábulo diferente nos poemas, diferindo-se desta maneira,
totalmente da linguagem utilizada pelos movimentos que o antecederam, que como
sabemos calcavam-se mormente no português lusitano.
A morte sempre foi um dos temas mais recorrentes da
poesia bandeiriana, visto que o poeta sofreu durante vários anos com a
tuberculose e fora desenganado por uma pluralidade de médicos. Em Belo Belo,
onde encontramos o poema ” Arte de amar”, e nos livros subseqüentes de
Bandeira, a morte tornou-se um tema ainda mais constante. Todavia, não
encontramos nestes poemas, uma ironia tão acentuada. Isto não quer dizer que o
poeta abandonou totalmente este tropo. Pelo contrário, ele lança mão deste
recurso, no entanto, o faz de maneira mais leve e reflexiva.
Depois de tudo que foi explicitado anteriormente,
podemos nos ater a ” Arte de amar”. O poema conta com seis versos e uma estrofe
composta por uma quintilha feitos de maneira livre. Esta organização realizada
mediante à disposição dos versos supracitada, ajudam a dar um tom maior de
reflexão à leitura do poema. Neste viés, de despertar esse pensamento
reflexivo, Bandeira ardilmente, no que tange à pontuação, utiliza-se de pontos
finais e vírgulas bem distribuídos no decorrer do texto. Os versos em “Arte de
amar” são curtos; aqueles um pouco maiores recebem a vírgula, que tem como
característica precípua a função realizar as pausas. O travessão, outrossim é
utilizado no quinto verso, para realizar um efeito de explanação.
No tocante a rima, que segundo Antônio Candido: “no
modernismo nunca foi abandonada. Mas os poetas adquiram grande liberdade no seu
pensamento. O uso do verso livre, com ritmos muito mais pessoais, podendo
esposar todas as inflexões do poeta, permitiu deixá-la de lado.”, “Arte de
Amar” não possuí este recurso em seus versos. salvo no verso sete.
As figuras de linguagem não possuem neste poema
papel preponderante, bem como os tropos que são tão comuns na poesia
bandeiriana.
Feita a análise, podemos partir agora para o
processo hermenêutico de “Arte de amar.” O sujeito lírico por meio dos versos
quer passar uma idéia do que ele entende por amor, de como se dá essa arte.
Antes de mais nada, é importante definirmos o que entender-se-á por alma no
decorrer destes versos. Este substantivo quando empregados em certos contextos
pode ganhar significados e usos diferentes. Neste poema, optamos por
compreender alma através do conceito socrático, ou seja, a alma que tem a
capacidade de exercer um comportamento ético é dotada de faculdades distintas e
hierarquizadas: sentido, liberdade e inteligência. E para complementar este
conceito elencado pelo filósofo grego, poder-se-á dizer que a alma seria a psique,
isto é, um conjunto de fenômenos psíquicos, conscientes e inconscientes.
No primeiro verso o sujeito lírico diz que: “Se
queres sentir a felicidade de amar, esqueça a tua alma. No verso seguinte fala
que: “a alma é que estraga o amor.” Neste ínterim, baseando nestes versos,
poder-se-á falar que para sentirmos a alegria de amar devemos abdicar das
nossas vontades. O versos subseqüentes, dois e três, evocam o amor agapé, que
na língua grega significa o amor, caridoso, compassivo. Esta forma de amor é o
amor-compaixão, “é o sentimento que nega a vontade ao invés, em vez de
afirmá-la.” O amor analisado a partir deste viés, foi aquele praticado por
Cristo, santos et cetera. Com estes fatores explicitados anteriormente em
mente, para o sujeito lírico a alma só encontra aprazimento quando está em
contato com Deus, e não em outra alma. Além disso, outrossim volta a frisar a
figura divina, indo até mesmo além, dizendo que a satisfação não pode se dar
com nenhum outro ser terreno. O sétimo verso é pautado por um leve erotismo,
pois os corpos entender-se-ão apenas com outros corpos. Isto demonstra que para
o sujeito lírico o amor se dá apenas por meio de algo erótico, este sentimento
é diferente do agapé. Assim sendo, vemos que o eu-lírico não crê no amor tão
exaltado por uma miríade de poetas ao longo do séculos. Pelo contrário, ele
chega até a ser pessimista em relação ao amor, e podemos dizer que sua visão
talvez seja até mesmo baseada na idéia schopenhauriana. Para o filósofo alemão
Schopenhauer, o amor estaria arraigado apenas na idéia de Eros, em outras
palavras, no impulso sexual. Entretanto, não podemos afirmar com veemência que
este pensamento versificado pelo sujeito lírico esteja totalmente em
confluência com a do filósofo. No entanto, poder-se-ia falar que a arte de amar
no poema é carnal — tendo a influência filosófica de Schopenhauer ou não —,
pois afasta a possibilidade de um amor que se dá nas faculdades da alma.
Análise do poema “A arte de
amar”, de Manuel
Bandeira |
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ESTRELA DA
VIDA INTEIRA
A posição entre uma natureza apaixonada que
aspirava a plenitude, e o exílio em que a doença o obrigara a viver, marcaram profundamente
a sua sensibilidade, traduzindo-se, no plano estrutural, pelo gosto das
antíteses, dos paradoxos, nos contrastes violentos; no plano emocional, por um
movimento polar, uma oscilação constante que, no decorrer da obra, vai alternar
a atitude de serenidade melancólica e o sentimento de revolta impotente.
[Gilda e Antonio Cândido de Mello e Souza -
Introdução in Estrela da vida inteira]
PASÁRGADA: a poesia das coisas mais simples. Quando
Manuel Bandeira morreu, em outubro de 1968, um jornal dedicou-lhe a manchete
Bandeira, enfim, Pasárgada! em referência ao seu mais conhecido poema - Vou-me
embora pra Pasárgada. Neste poema o poeta evoca a vida que poderia ter sido e
que não foi, uma espécie de paraíso pessoal, lugar de sonhos e de desejos, em
que ele poderia realizar as felicidades mais simples, como andar em burro
bravo, subir em pau-de-sebo, andar de bicicleta, tomar banho de mar...
A enumeração, neste lugar ideal, de fantasias tão
simples e despojadas já revela um dado biográfico que se transformará em fonte
de muitos temas da poesia de Bandeira: a presença da morte, anunciada em plena
adolescência, sob a forma de uma tuberculose, doença mortal na época [início do
século XX]. [...] fui vivendo, morre-não-morre, e, em 1914, o doutor Bodner,
médico-chefe do Sanatório de Clavadel, tentando-lhe eu perguntado quantos anos
me restariam de vida, me respondeu assim: o senhor tem lesões teoricamente
incompatíveis com a vida: no entanto, está sem bacilos, come bem, dorme bem,
não apresenta em suma nenhuma sintoma alarmante. Pode viver cinco, dez, quinze
anos... Quem poderá dizer? Continuei esperando a morte para qualquer momento,
vivendo sempre como que provisoriamente. [Manuel Bandeira - Itinerário de
Pasárgada]
A permanente consciência da morte, a luta contra
ela, a convivência com sua presença - fazedoras de ausências - transformam-se
poeticamente numa descoberta essencial de vida, numa valorização intensa da
existência mais cotidiana, redescoberta como única, irrepetível,
insubstituível. Não é possível separar a experiência de vida da experiência
poética do autor de Pasárgada, embora sua poesia - de uma universalidade
intensa, ardente e simples - não possa ser reduzida a acontecimentos
biográficos, que se revelam matrizes de imagens, de emoções, de ritmos,
transfigurados na alquimia da criação.
O critico Alfredo Bosi, em sua História concisa da
literatura brasileira, escreve: [...] veremos que a presença do biográfico é
ainda poderosa mesmos nos livros de inspiração absolutamente moderna, como
Libertinagem, núcleo daquele seu não-me-importismo irônico, e, no fundo,
melancólico, que lhe deu uma fisionomia tão cara aos leitores jovens desde
1930. O adolescente mau curado da tuberculose persiste no adulto solitário que
olha de longe o carnaval da vida e de tudo faz matéria para os ritmos livres do
seu obrigado distanciamento.
A sua obra, escrita ao longo de mais de meio
século, atravessa praticamente toda a história do Modernismo no Brasil e
apresenta muitos dos mais expressivos livros da poesia moderna, como Ritmo
dissoluto, Libertinagem, Estrela da manhã e outros.
Estrela da vida inteira / Da vida que poderia / Ter
sido e não foi. Poesia, / Minha vida verdadeira.
Nascido na Recife, em 1886, tendo passado a
infância principalmente no Rio e no próprio Recife, Manuel Bandeira publica seu
primeiro livro de poema em 1917 - A cinza das horas, que será seguido por
Carnaval, em 1919, em que apresenta pela primeira vez, versos livres na
literatura brasileira. Conhece Mario de Andrade e os modernistas paulistas em
1921.
Não participa diretamente da Semana de Arte Moderna
de 1922, mas o seu poema Os sapos, paródia contundente dos parnasianos, provoca
um dos momentos de maior escândalo, ao ser lido por Ronald de Carvalho, no
Teatro Municipal de São Paulo, no dia 15 de fevereiro: o de maior polemica de
toda a Semana.
A partir de então, não é possível pensar a poesia
moderna no Brasil sem a presença de Bandeira, que atravessará todas as chamadas
fases do Modernismo, com uma produção poética de mais alto nível. Já na fase
heróica, de 1922, em que a ruptura com o passado e com as estruturas
estabelecidas era a mais vital palavra de ordem, Mário de Andrade chamava o
poeta de S. João Batista do Modernismo, reconhecendo o seu papel de anunciador
da nova poesia.
Aos poemas de Bandeira nascem e crescem dos
acontecimentos mais cotidianos, mais comuns, dos momentos que aparentemente são
banais e insignificantes. Do dia a dia mia desapercebido desentranha sua
poesia, em que instantes da existência aparecem transfigurados em pura
essencialidade da vida.
Detalhes prosaicos e perdidos na rotina descolorida
dos dias revelam-se instantes de iluminação, instantes de transcendência e de
proximidade da essência mais profunda - e mais simples - da vida. O grande
milagre da existência, a mais cotidiana, que a consciência da morte revelará
como algo intenso, único, irrepetível.
Sua linguagem coloquial e, despojada, atinge algum
dos momentos mais expressivos da língua: grande intensidade, grande
condensação, com imensa simplicidade. Ao lado de Carlos Drummond, Bandeira é o
grande incorporador do prosaico e do coloquial na poesia brasileira moderna.
... a poesia está em tudo - tanto nos amores como
nos chinelos, tanto nas coisas lógicas como nas disparatas.
Uma poética de iluminações da existência cotidiana,
com a mais expressiva coloquialmente, e com intensa condensação de imagens e
ritmos, a obra de Bandeira lembra muitas vezes a criação poética dos haicais
japoneses, em que se flagram instante de plenitude, de frágil e plena percepção
da vida, concentrada em um detalhe aparentemente banal.
Ao mesmo tempo, em unidade indissociável, a obra de
Bandeira representa a mais longa convivência com a morte, de toda a poesia
brasileira. Sem ser dominado pelo desespero, sem ser possuído pelo medo, sem
dramatizações retóricas. Com amadurecida amargura. Com ironia e auto-ironia,
melancólicas. Com sofrida serenidade. Com nostalgia da vida que poderia ter
sido e que não foi e nem será.
Até mesmo com ternura pela morte, companhia
constante de muitos anos, interlocutora secreta que, paradoxalmente, revela o
valor absoluto de cada dia, de cada pessoa, de cada coisa. A sabedoria da morte
- quando se descobre que não apenas os outros morrem - transformou-se, como em
muitas correntes filosóficas, em sabedoria de vida. A importância da
existência, de cada um: simples, essencial, passageira. Milagre. E a morte,
também milagre.
Bandeira é poeta da mais intensa ternura. De ardor
terno e intenso pela vida. Uma sensibilidade moderna, não grandiloquente.
Ternura melancólica pela infância perdida, e por seus personagens. Ternura
ardente pelo corpo. A sua poesia amorosa revela-se como ardente lírica erótica.
Poesia do corpo, de grande intensidade. Os corpos se estendem, as almas não.
Imagens eróticas que se tornam experiências sagradas, transcendentalizadas, tal
a naturalidade, o ardor e a intensidade da ternura. O físico se funde com o
onírico, terna e desconcertantemente.
Além disso, revela-se um dos mais versáteis e
flexíveis fazedores de versos do modernismo brasileiro. Suas estruturas de
métrica e de ritmo vão desde as mais libertárias experiências de verso livre,
dos fluxos mais soltos e irregulares até as estruturas mais tradicionais, de
verso em redondilhas da lírica medieval, dos versos decassílabos clássicos e
neoclássico e outros combinados com variadas formas fixas de estrófica regular,
com sonetos, canções etc. um fazedor de versos e estrofes extremamente
versátil, com raro domínio técnico e com grande erudição, capaz de traduzir de
varias línguas e de escrever à moda de, imitando estilos os mais diversos, da
época e autores.
Manuel Bandeira é também expressivo criador de
imagens, com igual e desconcertante simplicidade. Nas constelações de imagens
dos seus poemas percebemos um movimento oposto e complementar: por um lado, o
cotidiano parece transfigurado, instante de iluminação, com aura de símbolo
transcendente, e, por outro lado, o desconhecido, o misterioso, o onírico
aparecem configurados familiarmente, tornados próximos e confidentes, tornados
íntimos do dia a dia.
Morto há mais de vinte anos, Bandeira continua se
revelando como o mais simples e mais despojado dos poetas do Modernismo
brasileiro, como o poeta capaz de simplicidade mais essencial e mais
expressiva.
ANTOLOGIA
COMENTADA
Pneumotórax
Febre, hemoptise, dispneia, e suores noturnos.
A vida inteira que podia ter sido e que não foi.
Tosse, tosse, tosse.
Mandou chamar o médico:
- Diga trinta e três.
-Trinta e três... trinta e três... trinta e três...
- Respire.
.............................................................................................
- O senhor tem uma escavação no pulmão esquerdo e o
pulmão direito infiltrado.
- Então, doutor, não é possível tentar o
pneumotórax?
- Não. A única coisa a fazer é tocar um tango
argentino.
Um dos mais conhecidos textos de Bandeira e de todo
o modernismo. O tema é claramente autobiográfico. Observe o tom coloquial e
irônico, quebrado por uma frase-síntese de grande intensidade [segundo verso] e
pelo final inesperado, desconcertante, do humor absurdo diante da morte sem
remédio, final típico de poema piada característico da poesia moderna.
Poética
Estou farto do lirismo comedido
Do lirismo bem comportado
Do lirismo funcionário público com o livro de ponto
expediente protocolo e manifestações de apreço ao
sr. Diretor.
Estou farto do lirismo que pára e vai averiguar no
dicionário o cunho vernáculo de um vocábulo.
Abaixo os puristas
Todas as palavras sobre tudo os barbarismos
universais
Todas as construções sobre tudo a síntese de
exceção
Todo os ritmos sobretudo os instrumentais
Estou farto do lirismo namorador
Político
Raquítico
Sifilítico
De todo o lirismo que capitula ao que quer que seja
fora
de si mesmo
De resto não é lirismo
Será contabilidade tabela de co-senos secretário do
amante exemplar com cem modelos de cartas e as
diferentes maneiras de agradar às mulheres etc.
Quero antes do lirismo dos loucos
O lirismo dos bêbados
O lirismo difícil e pungente dos bêbados
O lirismo dos clowns de Shakespeare
- Não quero mais saber do lirismo que não é
libertação.
Este texto equivale a um manifesto modernista.
poema, poesia que fala de poesia. Observe que ele apresenta negações e rupturas
- contra as convenções que desfiguram a criação poética, em especial as do academicismo
parnasiano - e apresenta, por outro lado, afirmações libertárias típicas da
luta modernista [particularmente no final do poema]. Observe o título verso,
frase síntese, verdadeiro slogan do momento heroico do modernismo.
Estrela da
manhã
Eu queria a estrela da manhã
Onde está a estrela da manhã?
Meus amigos meus inimigos
Procurem a estrela da manhã
Ela desapareceu ia nua
Desapareceu com quem?
Procurem por toda à parte
Digam que sou um homem sem orgulho
Um homem que aceita tudo
Que me importa?
Eu quero a estrela da manhã
Três dias e três noite
Fui assassino e suicida
Ladrão, pulha, falsário
Virgem mal-sexuada
Atribuladora dos aflitos
Girafa de duas cabeças
Pecai por todos pecai com todos
Pecai com malandros
Pecai com sargentos
Pecai com fuzileiros navais
Pecai de todas as maneiras
Com os gregos e com os troianos
Com o padre e o sacristão
Com o leproso de Pouso Alto
Depois comigo
Te esperarei com mafuás novenas cavalhadas comerei
terra e direi coisas de uma ternura tão simples
Que tu desfalecerás
Procurem por toda à parte
Pura ou degradada até a última baixeza
Eu quero a estrela da manhã.
Outro texto-síntese, um dos mais expressivos poemas
lírico-amoroso de todo o Modernismo. Observe a celebração da mulher amada,
evocada na metáfora estrela; a enumeração caótica das imagens, o desconcerto
amoroso. Na quinta e sexta estrofes, observe uma espécie de ladainha para
celebrar a amada, para fazer uma invocação [na verdade, é uma paródia da
ladainha para a Virgem Maria, que acompanhava a reza do terço: consoladora dos
aflitos / rogai por nós etc]. observe a intensidade - até o delírio - da
confissão amorosa nas duas últimas estrofes.
Arte de amar
Se queres sentir a felicidade de amar, esquece a
tua alma.
A alma é que estraga o amor.
Só em Deus ela pode encontrar satisfação.
Não noutra alma.
Só em Deus - ou fora do mundo.
As almas são incomunicáveis.
Deixa o teu corpo entender-se com outro corpo.
Porque os corpos se entendem, mas as almas não.
Um dos mais conhecidos poemas com tema da morte. Observe
o tom sereno, familiar, camarada. Consolada, a ceia de fim de ano, no texto
representa encontro simbólico com a morte. O poema apresenta um balanço do
vivido, sem ilusões contra a própria finitude, e não se desfigura diante da
presença indesejada pelas gentes. O dia foi bom, com cada coisa no seu lugar.
Observe também, tal como nos outros textos, a linguagem coloquial, a estrófica
irregular, heterogênea, o verso livre.
Poema filosófico, fundamentador da lírica erótica,
intensamente corporal, de Manuel Bandeira. Observe a ruptura do senso comum,
das concepções espiritualizantes e platônicas de amor. O texto, de natureza
dissertativa, com ponto de vista e processo de argumentação, é também
radicalmente poético, pela força das imagens e dos ritmos. O texto é dirigido
para alguém, para um interlocutor, que acaba se transformando no próprio
leitor.
Consoada
Quando a Indesejada das gentes chagar
[Não sei se dura ou coroável],
Talvez eu tenha medo.
Talvez sorria, ou diga:
- Alô, iniludível!
O meu dia foi bom, pode a noite descer.
[A noite com os seus sortilégios.]
Encontrará lavrado o campo, a casa limpa.
A mesa posta,
Com cada coisa em seu lugar.
Estrela
da Vida Inteira |
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Lit. -
MANUEL
BANDEIRA, INTÉRPRETE DO BRASIL
Ainda
hoje não conseguimos equacionar o legado do Modernismo brasileiro. O
denominador-comum é o reconhecimento da importância do movimento. Para além
desse ponto de concórdia, surgem diversas interpretações que procuram ora tirar
o peso de alguns medalhões, ora aumentar o impacto da obra de alguns desses mesmos
medalhões. Em termos de Modernismo brasileiro, quando falamos em medalhões,
falamos em Mario de Andrade, Oswald de Andrade, Anita Malfatti, Tarsila do
Amaral, Victor Brecheret, Menotti del Picchia e Manuel Bandeira. Seria
exaustivo fazer a súmula das linhas interpretativas que trabalham com cada um
desses nomes.
Mas o
espaço desta coluna permite tocar num ponto mal explorado pela crítica: a
produção jornalística de Manuel Bandeira. Uma pessoa minimamente letrada não
ignora que Manuel Bandeira é dos principais poetas brasileiros do século XX.
Vários de seus poemas são citados como exemplos de simplicidade e agudeza.
Muitos deles são lidos com encantamento, dada a simpatia que o poeta parece
nutrir pelas coisas mais singelas da existência. Merecidamente o poeta Manuel
Bandeira é mais conhecido que o articulista Manuel Bandeira. O caso aqui não é
o de diminuir o poeta, e sim o de mostrar que o prosador teve atuação das mais
notáveis.
O leitor
que se aventurar pela produção jornalística de Manuel Bandeira haverá de levar
um susto inicial. Se a produção poética de Bandeira é magra, a jornalística é
das mais volumosas. (Sinal de que temos muito a fazer em termos de política
cultural: muitos dos artigos de Bandeira ficaram esparsos em jornais da época.
Por décadas, o estudioso da obra de Bandeira teria de se contentar com seletas
de prosas realizadas pelo próprio autor. Já era alguma coisa, mas ficava-se com
a impressão de que algo muito maior estava perdido por aí. Somente em 2006,
através da editora Cosac Naify, tivemos a oportunidade de conhecer melhor a
notável produção em prosa de Manuel Bandeira.)
Passado
o susto inicial, logo vem outro, que diz respeito à natureza espantosamente
variada dos interesses de Bandeira. Manuel Bandeira escreve sobre quase tudo.
Se alguém pedisse uma explicação do fenômeno, eu diria que ele é resultado de
uma mistura de temperamento com ambiente dos anos 20 e 30. Explicar
temperamento é tarefa para profissionais de outras áreas, sem contar que este
espaço não comporta análises que remontariam à infância do poeta na Recife do
final do século XIX. Tratar do ambiente dos anos 20 e 30 já é algo mais
plausível.
Do
emaranhado de linhas que envolvem o Modernismo, é possível puxar o fio de uma
certa postura de vários dos envolvidos no movimento. É a postura de cobrar um
novo olhar para as coisas do Brasil. Não foi algo inédito em nosso cenário
cultural. O indianismo romântico, para ficarmos num exemplo, olhou, ainda que
de forma deformadora, hiperbólica, para nossas florestas e habitantes nativos.
A busca modernista, fato inegável, foi muito mais bem articulada. O processo de
estudo sério, de documentação mais rigorosa substitui a fantasia que se
inspirava em figuras exóticas. Caravanas eram organizadas para se conhecer
cidades brasileiras mais remotas. Foram buscas que trouxeram inúmeros
resultados, mas dois deles chamam nossa atenção: o cuidado que se passou a ter
com as cidades históricas de Minas Gerais e a pesquisa, encampada por Mario de
Andrade, sobre a riqueza de nosso folclore. Justamente nessa atmosfera de
inquietação intelectual é que Manuel Bandeira escrevia seus textos para
diversas publicações.
Como
disse anteriormente, a amplitude do olhar de Bandeira causa espanto. Uma breve
lista dos assuntos tratados pelo poeta, ao longo de um arco que vai dos anos
finais dos anos 20 até meados dos anos 40, pode dar vaga ideia do monumental
trabalho: cotidiano do Rio de Janeiro; livros recém-publicados; exposições de
artistas plásticos consagrados e de artistas pouco conhecidos; patrimônio
artístico de cidades como Rio de Janeiro, Recife, Olinda, Salvador, Ouro Preto
e São Paulo; perfis de autores que despontavam no cenário cultural; crônicas
líricas; cena do samba do Rio de Janeiro; literatura de vanguarda (Proust e
Joyce, por exemplo). Esse olhar que por si só não descansa já seria matéria
digna de menção. Mas estamos diante de um de nossos grandes intelectuais, e
isso fica evidente na articulação entre essas linhas tão díspares na aparência.
Díspares no primeiro olhar, díspares se encararmos a cultura como um espaço
repleto de divisões incomunicáveis. Aquela ingenuidade de acreditar que erudito
e popular não se tocam. O exemplo de Bandeira é o da honestidade intelectual:
uma composição de samba recebe a mesma atenção que um poema de Verlaine. Claro
que aqui poderíamos estar diante de um relativismo perigoso, de uma postura que
não tem coragem de julgar. Não é o caso de Bandeira, que respeita e julga, sem
perder a ternura e sem perder o verbo afiado. Não nos enganemos: por detrás de
poeta tido por bonachão, há o sarrista impagável.
Símbolo dessa vertente notável da produção de Bandeira é o livro Crônicas da Província do Brasil, antologia de crônicas rigorosamente escolhidas pelo próprio autor, publicada em 1936. Impossível escapar da data. Os anos 30 foram ricos em publicações que buscavam interpretar o Brasil. Fiquemos nas mais célebres: Casa Grande e Senzala (Gilberto Freyre), Raízes do Brasil (Sérgio Buarque de Holanda) e Formação do Brasil Contemporâneo (Caio Prado Júnior). Qualquer curso decente de história do Brasil há de levantar essa trinca que serviu de base para nos conhecermos melhor. Ouso aqui transformar o trio em quarteto. Crônicas da Província do Brasil, livro escrito em tom menor, merece figurar na lista de obra fundamental para compreendermos o Brasil. Na notável antologia de Bandeira encontramos estudos profundos sobre a obra de Aleijadinho, a cidade de Salvador, Recife, compositores de samba, escritores que surgiam (Carlos Drummond de Andrade, Augusto Frederico Schmidt), arquitetura brasileira, Chaplin, literatura best-seller, fala brasileira etc.. Há quem diga que tal vastidão de interesses é resultado das contingências que assolam os que colaboram com a imprensa. Aquela velha história de tratar de tudo, ainda que superficialmente. Basta ler o texto Bahia para que a impressão se desfaça. Crônicas da Província do Brasil é exercício de rigor, de lucidez, de escritor que sabe selecionar - tarefas das mais árduas - a partir de sua própria obra. Rigor parecido encontraremos no trabalho de Carlos Drummond de Andrade ao selecionar seus poemas para a notável Antologia poética.
Símbolo dessa vertente notável da produção de Bandeira é o livro Crônicas da Província do Brasil, antologia de crônicas rigorosamente escolhidas pelo próprio autor, publicada em 1936. Impossível escapar da data. Os anos 30 foram ricos em publicações que buscavam interpretar o Brasil. Fiquemos nas mais célebres: Casa Grande e Senzala (Gilberto Freyre), Raízes do Brasil (Sérgio Buarque de Holanda) e Formação do Brasil Contemporâneo (Caio Prado Júnior). Qualquer curso decente de história do Brasil há de levantar essa trinca que serviu de base para nos conhecermos melhor. Ouso aqui transformar o trio em quarteto. Crônicas da Província do Brasil, livro escrito em tom menor, merece figurar na lista de obra fundamental para compreendermos o Brasil. Na notável antologia de Bandeira encontramos estudos profundos sobre a obra de Aleijadinho, a cidade de Salvador, Recife, compositores de samba, escritores que surgiam (Carlos Drummond de Andrade, Augusto Frederico Schmidt), arquitetura brasileira, Chaplin, literatura best-seller, fala brasileira etc.. Há quem diga que tal vastidão de interesses é resultado das contingências que assolam os que colaboram com a imprensa. Aquela velha história de tratar de tudo, ainda que superficialmente. Basta ler o texto Bahia para que a impressão se desfaça. Crônicas da Província do Brasil é exercício de rigor, de lucidez, de escritor que sabe selecionar - tarefas das mais árduas - a partir de sua própria obra. Rigor parecido encontraremos no trabalho de Carlos Drummond de Andrade ao selecionar seus poemas para a notável Antologia poética.
O Manuel
Bandeira intérprete do Brasil precisa ser redescoberto. Vários de seus artigos
merecem aparecer nos cursos regulares de literatura e história do Brasil.
Crônicas da Província do Brasil é livro fundamental. Tentei dizer isso tudo nas
linhas acima. E é hora de o leitor perguntar: e o Manuel Bandeira lírico, não
aparece? Minha resposta: não aparece com tanta frequência, mas quando aparece,
encontramos algumas das crônicas mais belas de nossa literatura. Exemplo disso
é a crônica Os que marcam rendez-vous com a morte.
O Brasil se torna mais humano depois da leitura de Manuel Bandeira.
Nelson Fonseca Neto é colunista do jornal Cruzeiro do Sul e escreve neste espaço às quintas-feiras. nelsonfonsecanetoletraviva@gmail.com
O Brasil se torna mais humano depois da leitura de Manuel Bandeira.
Nelson Fonseca Neto é colunista do jornal Cruzeiro do Sul e escreve neste espaço às quintas-feiras. nelsonfonsecanetoletraviva@gmail.com
Andersom Pires da Silva - Catarina Xavier Gonçalves Martins
Resumo:
O presente artigo apresenta reflexões de como a infância é vista na poesia de Manuel Bandeira e os recursos que o poeta utiliza para representar a produção poética e agradar o público infantil. Analisamos a maneira como a infância é relacionada e mediada na poética modernista de Manuel Bandeira e como a palavra e a memória são matérias-primas que o poeta utiliza para a construção de seus poemas. Ainda destacamos esse gênero literário ilustrado e a importância da poesia e da música no desenvolvimento da lingüística e a contribuição na formação de leitores na escola contemporânea.
O presente artigo apresenta reflexões de como a infância é vista na poesia de Manuel Bandeira e os recursos que o poeta utiliza para representar a produção poética e agradar o público infantil. Analisamos a maneira como a infância é relacionada e mediada na poética modernista de Manuel Bandeira e como a palavra e a memória são matérias-primas que o poeta utiliza para a construção de seus poemas. Ainda destacamos esse gênero literário ilustrado e a importância da poesia e da música no desenvolvimento da lingüística e a contribuição na formação de leitores na escola contemporânea.
Palavra chave: infância, poesia,
música,Manuel Bandeira.
Introdução:
Introdução:
Neste texto pretendemos
refletir como a infância é vista na poesia de Manuel Bandeira, os recursos que
o poeta utiliza para representar à produção poética e a premente necessidade de
valorizar a poesia feita para pequenos. Acreditamos que a criança, através da
poesia, transforma a palavra em brinquedo e o sonho em realidade. Tudo isso de
maneira natural, estimulando o gosto e o prazer pelo ato de ler.
Manuel Bandeira nasceu em Recife, em 1886, e faleceu no Rio de Janeiro, em 1968. Foi professor, poeta, cronista, crítico e historiador literário. Trata-se de um grande poeta modernista, escreveu seus poemas com qualidade estética. Soube conduzir-se à criança com a palavra poética, concedendo-lhe tratamento mágico.
Manuel Bandeira nasceu em Recife, em 1886, e faleceu no Rio de Janeiro, em 1968. Foi professor, poeta, cronista, crítico e historiador literário. Trata-se de um grande poeta modernista, escreveu seus poemas com qualidade estética. Soube conduzir-se à criança com a palavra poética, concedendo-lhe tratamento mágico.
O poeta, ao escrever seus
poemas, lembra a sua infância, pois em diversos momentos fala de sua vida para
o público infantil. Bandeira tornou-se capaz de nos convencer de todos nossos
devaneios e das crianças e merece ser lembrado de acordo com os pressupostos de
Alfredo Bosi:
Resposta ao ingrato presente
é, na poesia mítica, ressacralização da memória mais profunda da comunidade. E
quando a mitologia de base tradicional falha, ou de algum modo já não entra
nesse projeto de recusa, é sempre possível sondar e remexer as camadas da
psique individual. A poesia trabalhará, então, a linguagem da infância
recalcada, a metáfora do desejo, o texto do inconsciente, a grafia do sonho:
[...] A poesia recompõe cada vez mais arduamente o universo mágico que os novos
tempos renegam. ( BOSI,1977,p.150).
A infância revela ao poeta um mundo encantado, carregado de alegria, inspirador que recupera um tempo perdido. Esse mundo infantil nos lembra a própria infância do poeta, que viveu sua meninice em Recife.
A infância revela ao poeta um mundo encantado, carregado de alegria, inspirador que recupera um tempo perdido. Esse mundo infantil nos lembra a própria infância do poeta, que viveu sua meninice em Recife.
A poesia infantil brasileira
se iniciou no século XIX e expandiu-se nos primeiros anos do século XX. Entre
os brasileiros que nessa época escreveram poesia para crianças, podemos
exemplificar Olavo Bilac. Os versos instrutivos que compunha suas poesias,
considerados "edificantes", no sentido de contribuir para formar
cidadãos de bons sentimentos, comprometidos com a tarefa educativa da escola.
Para as crianças, porém, Bilac usava uma linguagem simples tirando a imaginação
da criança. Como exemplo o poema "A Casa", no qual o poeta valoriza a
família e o lar como sagrados.
Vê como as aves tem, debaixo d? asa,
Vê como as aves tem, debaixo d? asa,
O filho implume, no calor do ninho!...
Deves amar, criança, a tua casa!
Ama o calor do maternal carinho!
Dentro da casa em que nasceste és tudo...
Como tudo é feliz, no fim do dia,
Quando voltas das aulas e do estudo!
Volta, quando tu voltas, a
alegria!
Aqui deves entrar como num templo, [...]
A poesia de Bilac mostra,
através dos versos, a importância da família e o amor que os filhos devem
sentir por seus familiares. Na época, quando o poeta escreveu essa poesia,
tinha como função ensinar valores cívicos e morais às crianças. A criança era
vista como "adulto em miniatura", tirando sua capacidade de imaginar.
Nos últimos anos, com os estudos do historiador francês Philippe Áries(1981), ficou evidenciado a natureza histórica e social da criança ao articular a infância, história e sociedade, fundamentando assim uma posição contrária à "miniaturização da criança".
Nos últimos anos, com os estudos do historiador francês Philippe Áries(1981), ficou evidenciado a natureza histórica e social da criança ao articular a infância, história e sociedade, fundamentando assim uma posição contrária à "miniaturização da criança".
Dessa forma, a valorização da
infância e a difusão do conceito moderno, acentuam o caráter diferenciado dela,
na sua dependência e fragilidade, o que assegura a necessidade de proteção. A
idEia de infância moderna foi universalizada. Além disto, a escola através da
poesia, pode provar sua utilidade quando se tornar o espaço para a criança
refletir sobre sua condição pessoal. E também, ao longo desse mesmo século,
cresceu o esforço pelo conhecimento da infância em várias áreas do
conhecimento. Outros poetas modernos e contemporâneos surgiram, a poesia
infantil conquistou espaço e seus leitores.
A poesia destaca o papel que a imaginação desempenha na vida da criança, as diversas possibilidades de representação do real e os modos próprios de estar no mundo e de interagir com ele. Sem dúvida, o contexto histórico-social em que foram produzidas as poesias de Manuel Bandeira é influenciado tanto pelo conceito de infância vigente da época, quanto pelo olhar do poeta modernista.
A poesia destaca o papel que a imaginação desempenha na vida da criança, as diversas possibilidades de representação do real e os modos próprios de estar no mundo e de interagir com ele. Sem dúvida, o contexto histórico-social em que foram produzidas as poesias de Manuel Bandeira é influenciado tanto pelo conceito de infância vigente da época, quanto pelo olhar do poeta modernista.
Manuel Bandeira já havia
notado, desde muito cedo, que em suas memórias da infância estavam os elementos
necessários para lançá-lo a uma criação mais ousada e renovadora em que a
construção dos versos se dá a partir dos elementos mais simples e familiares. O
poeta se utilizava com frequência das suas lembranças da infância para escrever
seus poemas. Ele invocava as cenas e as personagens que estruturavam sua vida
no passado a partir das lembranças da infância. É com auxílio desse tempo que
ele chega ao presente e até mesmo ao futuro de sua obra, uma vez que tal
processo estabelece o devir da poética de Bandeira.
Podemos notar a infância na
poética bandeiriana, assim como a poesia encarna um poder transformador, como
se possuísse um poder mágico de mudar o mundo. O mundo infantil, com sua magia,
adquire esse poder de transformar a realidade em sonho, através do lúdico e do
encanto que é transformado em poemas. O poeta vê a infância como um tempo bom
em que à imaginação e as brincadeiras lúdicas sobrepõem-se ao mundo adulto
rígido, racional e com várias nuanças de problemas existenciais, afetivos,
amorosos, etc. Podemos exemplificar com o poema "Porquinho da Índia":
Quando eu tinha seis anos
Ganhei um porquinho da índia.
Que dor de coração me dava
Porque o bichinho só queria estar debaixo do
Fogão!
Levava ele pra sala
Pra os lugares mais bonitos mais limpinhos
Ele não gostava:
Queria era estar debaixo do fogão.
Não fazia caso nenhum das minhas ternurinhas...
_O meu porquinho da índia foi minha primeira namorada.
O poeta nos traz de volta a
infância, destaca a pureza, a inocência de uma criança que dedica todo o seu
afeto a um animal de estimação. É escrito com jeito de criança, porém o poeta
cria um ambiente mais emotivo, com palavras no diminutivo, para atingir a
infância. O toque de humor fica por conta do verso final, espécie de conclusão
em que introduz a fala do eu lírico. O passado é visível nos versos.
A infância se contrapõe, aos
poucos, às privações de uma vivência transitoriamente marcada pela fraqueza física
e pela contradição de ampliar o presente além das rigorosas normas que a doença
constituía. A confiança e a perfeição com que o poeta narra os acontecimentos
da sua infância sugerem, conteúdo da memória, de maneira natural. O seu
discurso é lançado ao leitor, mas ele mal consegue perceber o caráter
construtivo das lembranças. Desse modo, o relato da infância de Bandeira revela
uma edição de acontecimentos bibliográficos que busca mostrar as implicações
destes para o desenvolvimento de sua poesia.
Segundo Nelly Novaes, Manuel
Bandeira rompe com os esquemas tradicionais e sua linguagem torna-se lúdica,
irreverente e fragmentada. Ele desperta no leitor um efeito novo, pois utiliza
a repetição como recurso. Para que o poema fique significativo, explora a sonoridade
o ritmo das palavras soltas. Por isso, os poemas modernos agradam os ouvidos
das crianças. Podemos exemplificar com fragmentos do poema Trem de ferro:
Café com pão
Café com pão
Café com pão
Café com pão
Virge Maria que foi isso maquinista?
Agora assim
Café com pão
Agora assim
Voa,fumaça[...]
O poema apresenta canto e ritmo jocoso, e se desenvolve em torno de uma necessidade básica da criança, combinada a uma situação de prazer que é a viagem. É também um diálogo entre o poeta e o leitor/ouvinte. (NOVAES, 2000, p.237).
Procuramos entender a infância e as crianças na sociedade contemporânea, de modo a compreender a delicada complexidade e a dimensão criadora das ações infantis. Encontramos interessantes contribuições na obra do filosofo alemão Walter Benjamin (2002). Conhecer a infância e as crianças favorece ao homem ser sujeito crítico da história que ele produz. Para o autor,"a criança mistura-se com as personagens de maneira muito mais íntima do que o adulto. O desenrolar e as palavras trocadas atingem-na com força infável, e quando se levanta está envolta pela nevasca que soprava da leitura".Ainda segundo o autor, "é possível fazer da criança um ser natural, ele faz uma crítica a concepção equivocada que os adultos mantinham da criança, considerando-a incompleta e incapaz".(BENJAMIN, 2002, p.57).
O poema apresenta canto e ritmo jocoso, e se desenvolve em torno de uma necessidade básica da criança, combinada a uma situação de prazer que é a viagem. É também um diálogo entre o poeta e o leitor/ouvinte. (NOVAES, 2000, p.237).
Procuramos entender a infância e as crianças na sociedade contemporânea, de modo a compreender a delicada complexidade e a dimensão criadora das ações infantis. Encontramos interessantes contribuições na obra do filosofo alemão Walter Benjamin (2002). Conhecer a infância e as crianças favorece ao homem ser sujeito crítico da história que ele produz. Para o autor,"a criança mistura-se com as personagens de maneira muito mais íntima do que o adulto. O desenrolar e as palavras trocadas atingem-na com força infável, e quando se levanta está envolta pela nevasca que soprava da leitura".Ainda segundo o autor, "é possível fazer da criança um ser natural, ele faz uma crítica a concepção equivocada que os adultos mantinham da criança, considerando-a incompleta e incapaz".(BENJAMIN, 2002, p.57).
Acreditamos que a criança vê
seu universo projetado sendo capaz de tratar a palavra como um brinquedo, logo
ela cria um universo de sonho e realidade, de maneira muito mais natural do que
o adulto. Walter Benjamin sublinha a diferença entre a imaginação infantil e o
conceito que o adulto faz do universo lúdico da criança.
Como podemos observar em Benjamin a imaginação da criança por si só já é fantasiosa. Bandeira ao escrever "Porquinho da Índia," pensa a fantasia na criança. A poesia devido a sua estrutura formal, pode ser instrumento de comunicação rápida com a infância. Benjamin faz uma critica a infantilização da criança como:
Como podemos observar em Benjamin a imaginação da criança por si só já é fantasiosa. Bandeira ao escrever "Porquinho da Índia," pensa a fantasia na criança. A poesia devido a sua estrutura formal, pode ser instrumento de comunicação rápida com a infância. Benjamin faz uma critica a infantilização da criança como:
Não devemos traduzir o mundo
para as crianças, e lhe entregar tudo pronto, porque, segundo ele, as crianças,
são capazes de sozinhas relaborarem e elaborarem significados para o que está
em sua volta. Constroem seu mundo de coisas, a partir dos materiais e resíduos
espalhados pelo mundo. Nesses detritos, elas reconhecem o rosto que o mundo das
coisas assume para elas, e só para elas. A criança aceita perfeitamente coisas
sérias, mesmos as mais abstratas e pesadas ,desde que sejam honestas
espontâneas.(BENJAMIN,2002,p.237)
E é justamente com Benjamin que podemos exemplificar que a as crianças são seres capazes. Elas constroem a partir de resíduos ou sobras, pois é na poesia, que a infância estabelece novas relações e combinações. Com as crianças, é possível mudar o rumo das coisas ou mesmo o conceito que se tinha(ou se tem) de infância.
Em lugar de manipular conceitos (como antes), a poesia explorava as virtualidades da matéria verbal: a sonoridade e o ritmo das palavras soltas. Dessa maneira, em geral, os breves poemas agradam os ouvidos infantis.
E é justamente com Benjamin que podemos exemplificar que a as crianças são seres capazes. Elas constroem a partir de resíduos ou sobras, pois é na poesia, que a infância estabelece novas relações e combinações. Com as crianças, é possível mudar o rumo das coisas ou mesmo o conceito que se tinha(ou se tem) de infância.
Em lugar de manipular conceitos (como antes), a poesia explorava as virtualidades da matéria verbal: a sonoridade e o ritmo das palavras soltas. Dessa maneira, em geral, os breves poemas agradam os ouvidos infantis.
Os pressupostos de Benjamin
nos levaram a realizar um trabalho com poesias, tendo como objetivo levantar, a
partir da leitura das poesias de Manuel Bandeira, os recursos de que se valem o
poeta para promover a produção poética e a criança. Os poemas foram retirados
do volume Meus primeiros versos: Berimbau e outros poemas.
Segundo Nelly Novaes (2000),"um projeto que contempla a poesia, deve ter claro a concepção de infância e enxergar a literatura e a música como um fenômeno da linguagem", estabelecer relações entre literatura, história e cultura entender a leitura como um diálogo entre leitor e o texto e ver a escola como espaço de cultura.
Acreditamos no poder da poesia e da música de despertarem na criança o gosto pela leitura através da fantasia, da emoção do som e imagem que elas produzem.
Segundo Nelly Novaes (2000),"um projeto que contempla a poesia, deve ter claro a concepção de infância e enxergar a literatura e a música como um fenômeno da linguagem", estabelecer relações entre literatura, história e cultura entender a leitura como um diálogo entre leitor e o texto e ver a escola como espaço de cultura.
Acreditamos no poder da poesia e da música de despertarem na criança o gosto pela leitura através da fantasia, da emoção do som e imagem que elas produzem.
A criança e a
poesia:
Na poesia de Bandeira, há o
toque lúdico, o humor, o ritmo musical envolvente, o lirismo e clareza de
linguagem. O poeta construiu poemas que evocam a infância, envolvendo
brincadeiras de rua, associando a música às situações divertidas do cotidiano.
Esta articulação da poesia com ritmo musical também é uma maneira que ele
utilizou para recordar e valorizar o folclore e a linguagem coloquial.
Sabemos que as crianças da
atualidade, com os avanços tecnológicos e a rapidez da informação, convivem com
diferentes imagens no cotidiano através dos diversos gêneros textuais, que
circulam na sociedade. No entanto, elas necessitam da visualização de imagens
para despertar sua atenção. A poesia, tão sensível e sutil que torna-se difícil
penetrar nesse universo infantil, ditado pela mídia, pela velocidade e pelo
barulho desse mundo contemporâneo. Torna-se uma competição injusta, se levarmos
em consideração que para ler poesia, os alunos precisam estar tranquilos e
concentrados em um ambiente adequado. Como conseguir atenção das crianças, onde
a imagem e o barulho são tudo na atualidade?
Uma alternativa para incentivar leitura de poemas, nas crianças, já há muito tempo usado pelo mercado editorial, é o apelo visual do livro, uma harmonia entre texto, ilustração e o projeto gráfico. Outra opção muito interessante que a criançada gosta é a musica; podemos exemplificar com o DVD da Adriana Partimpim. A imagem não rouba a cena da poesia, pelo contrário, enriquece o texto e desperta o interesse e gosto da criança pelo ato de ler e ouvir. E ainda, baseado nos pressupostos de Walter Benjamin:
A criança redige dentro da imagem. Por isso, ela não se limita a descrever imagens: ela as escreve e rabisca [...]. Essas imagens são mais eficazes que quaisquer outras na tarefa de iniciar a criança na linguagem e na escrita. No reino das imagens coloridas, ela sonha seus sonhos até o fim. (BENJAMIN, 2008,p.242).
Uma alternativa para incentivar leitura de poemas, nas crianças, já há muito tempo usado pelo mercado editorial, é o apelo visual do livro, uma harmonia entre texto, ilustração e o projeto gráfico. Outra opção muito interessante que a criançada gosta é a musica; podemos exemplificar com o DVD da Adriana Partimpim. A imagem não rouba a cena da poesia, pelo contrário, enriquece o texto e desperta o interesse e gosto da criança pelo ato de ler e ouvir. E ainda, baseado nos pressupostos de Walter Benjamin:
A criança redige dentro da imagem. Por isso, ela não se limita a descrever imagens: ela as escreve e rabisca [...]. Essas imagens são mais eficazes que quaisquer outras na tarefa de iniciar a criança na linguagem e na escrita. No reino das imagens coloridas, ela sonha seus sonhos até o fim. (BENJAMIN, 2008,p.242).
Ao realizarmos trabalho com
música da Adriana Partimpim, quanto o de poemas ilustrados de Bandeira, foram
de grande valia para a turma, pois de acordo com Benjamin, "A ilustração
faz a fantasia infantil mergulhar, sonhadoramente, em si mesma". Essas
imagens estimulam na criança a leitura, penetrando nas ilustrações, ela redige
dentro da imagem e do som. (BENJAMIN, p.239).
Manuel Bandeira constrói sua
obra, tal como Benjamin (2008) identifica a forma com que as crianças fazem
história, ou seja, a partir da história de cada um, elas constroem seu mundo de
coisas, a partir dos materiais e resíduos espalhados pelo mundo. "Nesses
detritos, as crianças identificam o rosto das coisas e assume para elas".
Bandeira elege para matéria de poesia a pobreza, os objetos, a sua doença e
tudo que relembra sua infância com a família em Recife.
Adriana Calcanhoto, conhecida
pelas crianças como Adriana Partimpim, desde a infância adotou a música na sua
trajetória existencial. Suas canções agradam tanto as crianças quanto os
adultos, trazendo um repertório diversificado da música popular brasileira. A
cantora, sabendo que a música faz parte da vida infantil desde muito cedo, como
as cantigas de ninar, os brinquedos sonoros, poesias e todo tipo de jogo
musical, compôs DVDs envolvendo poesia de poetas brasileiros, inclusive o poema
"Os sapos" de Manoel Bandeira. Esses momentos de troca e comunicação
sonoro-musicais favorecem o desenvolvimento afetivo e social da criança.
O trabalho com música e poesia
na escola é essencial para que os alunos entrarem em contato com a própria
música, de modo prazeroso e interessante. Serve para garantir os estudos linguísticos
e o seu sucesso, não podendo deixar de lado a capacidade de aprimorar a
expressão musical das crianças, além de colaborar com a humanização dos
indivíduos, tornando-os mais sensíveis, criativos e reflexivos. Alicia Maria
Almeida Loureiro afirma que:
Significa que é fundamental o
papel da escola no estudo da cultura musical, pois nela, como terrenos de
mediação, poderão ocorrer as trocas de experiências pessoais, intuitivas e
diferenciadas. Daí a necessidade de não perdermos de vista as práticas musicais
que respondem os movimentos sociais e culturais que vão além dos muros da
escola mas que refletem, mais cedo ou mais tarde, no interior da sala de aula.
(LOUREIRO,2010,p121).
Considerando as ideias de Loureiro, a música exerce papel importante na escola, pois é justificada pelo desenvolvimento do ser humano, por meio da conscientização da interdependência entre o corpo e a mente, entre a razão e a sensibilidade, entre a ciência e estética. (Loureiro, 2010, p.142) Com isso, percebe-se que a música não pode estar dissociada das práticas cotidianas dos alunos, uma vez que as atividades musicais que envolvem o canto, a poesia, o movimento e a improvisação, já fazem parte do ambiente das crianças, no meio familiar ou fora dele.
Considerando as ideias de Loureiro, a música exerce papel importante na escola, pois é justificada pelo desenvolvimento do ser humano, por meio da conscientização da interdependência entre o corpo e a mente, entre a razão e a sensibilidade, entre a ciência e estética. (Loureiro, 2010, p.142) Com isso, percebe-se que a música não pode estar dissociada das práticas cotidianas dos alunos, uma vez que as atividades musicais que envolvem o canto, a poesia, o movimento e a improvisação, já fazem parte do ambiente das crianças, no meio familiar ou fora dele.
A música e poesias rítmicas
devem ter lugar em destaque na educação lingüística, pois ajudam no
desenvolvimento da leitura e também na parte afetiva e social. Podemos pensar
na música como instrumento poderoso na educação, não só na lingüística, pois
através do seu uso estimulamos uma área do cérebro não desenvolvida entre
outras linguagens oral e escrita. Além disso, a música melhora a capacidade de
concentração e potencializa a memória.
O trabalho com músicas e poesias conhecidas das crianças traz um bom resultado no desenvolvimento da aprendizagem como um todo. Ao ler e ouvir, os aprendizes precisam chegar até a palavra, pois descobrir o que está escrito na música e na poesia, não implica simplesmente em trabalhar os sons, mas as palavras. Ainda de acordo com Nelly Novaes:
Poesia é também imagem e som. As palavras são signos que expressam emoções, sensações, ideias... através de imagens ( símbolos, metáforas, alegorias...) e de sonoridade(rimas, ritmos...). É esse jogo de palavras, o principal fator da atração que as crianças tem pela poesia, transformando em canto ( as cantigas de ninar, cantigas de roda...). Ou pela poesia ouvida ou lida em voz alta, que lhes provoque emoções, sensações, impressões, numa interação lúdica e gratificante. (NOVAES, 2002, p.222)
A palavra é a matéria-prima de que dispõe o poeta Manuel Bandeira para realizar seu trabalho e também Adriana Partimpim, para compor suas músicas se utiliza da palavra. Já as crianças utilizam as palavras para recriar e produzir cultura através de sua realidade.
A poesia é apenas um dos usos entre todas as possibilidades da língua e talvez, o mais criativo. Ela pode ser pictórica, plástica, dramática, musical, afetiva, moral e lúdica etc... Deveria ser um dos argumentos para que a escola passasse a ver a poesia não como "perda de tempo", mas como uma das maneiras de derrubar certos preconceitos em relação ao gênero literário, pois as primeiras brincadeiras são feitas de rimas e trocadilhos.
Em meio a essa crise da vida contemporânea, como professora de projeto de literatura, fomos buscar na poesia de Manuel Bandeira, suporte para a realização de um trabalho com poemas, com as turmas de quarto e quinto anos do Ensino Fundamental de uma escola municipal em Juiz de Fora, Minas Gerais. O brincar com as palavras leva a descobertas incríveis, por isso realizamos um trabalho com algumas poesias de Manuel Bandeira e especialmente o poema: "Na rua do sabão".
Este poema se aproxima do cotidiano e da rotina das crianças de periferias, suas brincadeiras de rua, caracteriza o ambiente onde elas crescem e também lembra meninos soltando pipas, uma atividade muito comum na infância. As cantigas folclóricas compõem uma característica tipicamente ligada às crianças e Manuel Bandeira retrata bem isso no poema: "Na rua do sabão".
O trabalho com músicas e poesias conhecidas das crianças traz um bom resultado no desenvolvimento da aprendizagem como um todo. Ao ler e ouvir, os aprendizes precisam chegar até a palavra, pois descobrir o que está escrito na música e na poesia, não implica simplesmente em trabalhar os sons, mas as palavras. Ainda de acordo com Nelly Novaes:
Poesia é também imagem e som. As palavras são signos que expressam emoções, sensações, ideias... através de imagens ( símbolos, metáforas, alegorias...) e de sonoridade(rimas, ritmos...). É esse jogo de palavras, o principal fator da atração que as crianças tem pela poesia, transformando em canto ( as cantigas de ninar, cantigas de roda...). Ou pela poesia ouvida ou lida em voz alta, que lhes provoque emoções, sensações, impressões, numa interação lúdica e gratificante. (NOVAES, 2002, p.222)
A palavra é a matéria-prima de que dispõe o poeta Manuel Bandeira para realizar seu trabalho e também Adriana Partimpim, para compor suas músicas se utiliza da palavra. Já as crianças utilizam as palavras para recriar e produzir cultura através de sua realidade.
A poesia é apenas um dos usos entre todas as possibilidades da língua e talvez, o mais criativo. Ela pode ser pictórica, plástica, dramática, musical, afetiva, moral e lúdica etc... Deveria ser um dos argumentos para que a escola passasse a ver a poesia não como "perda de tempo", mas como uma das maneiras de derrubar certos preconceitos em relação ao gênero literário, pois as primeiras brincadeiras são feitas de rimas e trocadilhos.
Em meio a essa crise da vida contemporânea, como professora de projeto de literatura, fomos buscar na poesia de Manuel Bandeira, suporte para a realização de um trabalho com poemas, com as turmas de quarto e quinto anos do Ensino Fundamental de uma escola municipal em Juiz de Fora, Minas Gerais. O brincar com as palavras leva a descobertas incríveis, por isso realizamos um trabalho com algumas poesias de Manuel Bandeira e especialmente o poema: "Na rua do sabão".
Este poema se aproxima do cotidiano e da rotina das crianças de periferias, suas brincadeiras de rua, caracteriza o ambiente onde elas crescem e também lembra meninos soltando pipas, uma atividade muito comum na infância. As cantigas folclóricas compõem uma característica tipicamente ligada às crianças e Manuel Bandeira retrata bem isso no poema: "Na rua do sabão".
Cai cai balão
Cai cai balão
Na Rua do Sabão!
O que custou arranjar aquele balãozinho de papel!
Quem fez foi o filho da lavadeira.
Um que trabalha na composição do jornal e tosse muito.
Comprou o papel de seda, cortou-o com amor, compôs os
[gomos oblongos...
Depois ajustou o morrão de pez ao bocal de arame.
Ei-lo agora que ? pequena coisa tocante na
escuridão do céu.
Levou tempo para cair fôlego.
Bambeava, tremia todo e mudava de cor.
A molecada da Rua do Sabão
Gritava com maldade:
Cai cai balão!
Subitamente, porém, entesou, enfunou-se
[e arrancou das mãos que o tenteavam.
E foi subindo...
para longe...
serenamente....
Como se o enchesse o soprinho tísico do [ José.
Cai cai balão!
A molecada salteou-o com atiradeiras
assobios
apuros
pedradas.
Cai cai balão!
apuros
pedradas.
Cai cai balão!
Um senhor advertiu que os balões são proibidos pelas
[posturas municipais]
Ele foi subindo...
muito serenamente...
Para muito longe...
Não caiu na Rua do Sabão.
Caiu muito longe... Caiu no mar ? nas águas puras
[do mar alto.
Este poema é muito importante
por representar um progresso no estilo poético de Manuel Bandeira devido à
linguagem coloquial e o uso do verso livre. O início deste poema dá-se pela
conhecidíssima cantiga popular que incentiva o leitor a cantá-la imitando-lhe a
uma criança.
A utilização desse refrão
popular na primeira estrofe, faz com que o leitor, conhecedor da canção, inicie
a leitura do poema cantando alegremente como uma criança. Mas este sentimento
de alegria da abertura não se prolonga nos versos seguintes. E o poeta mostra
verdadeiramente o que vai tratar em seu poema: a triste situação de um menino
pobre e doente. Desse modo, a alegria inicial não passa de uma falsa imagem.
Esta colagem do refrão, feita por Bandeira, além de transportar a musicalidade da canção popular para seu poema recria o linguajar popular, recurso estético próprio do modernismo, trazendo para ele (o poema) uma linguagem próxima ao dia a dia.
A segunda estrofe mostra a fase de construção do balão por um menino pobre (filho de uma lavadeira) e doente (que tosse muito), uma representação da criança que pode ser comparada à do próprio poeta, também doente. Após o esforço empreendido pela criança doente ("Levou tempo para criar fôlego. / Bambeava, tremia todo e mudava de cor."), o balão sobe e alcança o céu escuro, representando uma espécie de vitória do menino que mesmo doente ("com seu soprinho tísico") alcança o inacessível céu. De forma mágica e lúdica, superando toda maldade das crianças da "Rua do Sabão" que gritavam para que o balão caísse e que também o apedrejavam, juntamente com a lei de proibição municipal ao balonismo ? neste momento representado pela figura de um homem e seu mundo puramente racional sem capacidade imaginativa ? o balão alcança o céu.
Conclusão:
Concluímos que na poética bandeiriana, a infância é usada pelo poeta como uma forma de recordar o seu passado relembrando os bons tempos de infância com sua família, bem como as brincadeiras de rua, as cantigas do folclore brasileiro, o que representam traço de brasilidade, algo comum aos poetas do Modernismo.
Esta colagem do refrão, feita por Bandeira, além de transportar a musicalidade da canção popular para seu poema recria o linguajar popular, recurso estético próprio do modernismo, trazendo para ele (o poema) uma linguagem próxima ao dia a dia.
A segunda estrofe mostra a fase de construção do balão por um menino pobre (filho de uma lavadeira) e doente (que tosse muito), uma representação da criança que pode ser comparada à do próprio poeta, também doente. Após o esforço empreendido pela criança doente ("Levou tempo para criar fôlego. / Bambeava, tremia todo e mudava de cor."), o balão sobe e alcança o céu escuro, representando uma espécie de vitória do menino que mesmo doente ("com seu soprinho tísico") alcança o inacessível céu. De forma mágica e lúdica, superando toda maldade das crianças da "Rua do Sabão" que gritavam para que o balão caísse e que também o apedrejavam, juntamente com a lei de proibição municipal ao balonismo ? neste momento representado pela figura de um homem e seu mundo puramente racional sem capacidade imaginativa ? o balão alcança o céu.
Conclusão:
Concluímos que na poética bandeiriana, a infância é usada pelo poeta como uma forma de recordar o seu passado relembrando os bons tempos de infância com sua família, bem como as brincadeiras de rua, as cantigas do folclore brasileiro, o que representam traço de brasilidade, algo comum aos poetas do Modernismo.
Nas poesias de Bandeira,
observamos um diálogo entre imagem e texto, garantindo a qualidade pictórica
das obras, sem perder a riqueza do texto poético. Apesar da linguagem coloquial
dos poemas de Bandeira, percebemos o envolvimento e entusiasmo dos alunos com o
trabalho realizado.
O trabalho com poesia e
música na escola, ajuda os aprendizes aperfeiçoarem o vocabulário, a leitura, a
linguagem oral, entrem em contato com a cultura e atinjam o universo da
infância. Estimulando desde cedo a consciência crítica do leitor.
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