JOSÉ LINS DO
REGO
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José Lins do Rego Cavalcanti nasceu em 1901,
no engenho Corredor, município de Pilar, Estado da Paraíba, e faleceu no Rio
de Janeiro, em 1957. Pertencia a uma família tradicional, ligada ao
patriarcalismo rural e à economia açucareira do Nordeste.
Estreou na literatura, em 1932, com Menino de Engenho, seguido pelos
romances Doidinho, Bangüe, Moleque
Ricardo, Usina e Fogo Morto -
série que ele mesmo chamou de “ciclo da cana-de-açúcar".
Ao “ciclo da seca e do cangaço"
pertencem Pedra Bonita e Cangaceiros, romances impregnados do
peculiar misticismo do Nordeste.
Autor regionalista par excelência, José Lins
do Rego sempre manteve uma profunda relação com sua terra de origem, mas sem
jamais perder a atitude crítica que Gilberto Freire imprimiu ao regionalismo modernista
do Nordeste. Por isso mesmo sua obra é um dos maiores depoimentos humanos que
se tem na literatura regional brasileira e, ao mesmo tempo, um depoimento
social, ao narrar a ascensão e o declínio dos engenhos e toda a sorte de
consequências que sofreram a região e sem habitantes.
Outras obras: Pureza, Riacho Doce, Água mãe, Eurídice, o biográfico Meus verdes anos.
FOGO MORTO:Esta obra focaliza o progresso e a
decadência de um engenho de açúcar na Paraíba, no século passado. É
considerado a obra-prima de José Lins
do Rego. O relato é dividido em três partes, cada qual correspondenmte a um
personagem:
. Mestre Zé Amaro: artesão, homem
amargo e sofrido, vendo a prepotência dos senhores rurais, a loucura mansa da
filha. É apontado pelo povo como lobisomem. Engaja-se como informante de um
grupo de cangaceiros, o que o faz encontrar uma saída social e pessoal para
suas angústias.
. Coronel Lula de Holanda: É o típico
proprietário de engenho em decadência, vivendo da memória das grandezas do
passado, preso na casa-grande em ruínas, já meio maluco, recusando-se a
compreender a extensão da sua miséria.
. Capitão Vitorino: Nas duas
primeiras partes é um personagem grotesco, de quem todos zombam. Mas no
último segmento do romance adquire uma grande dignidade, tem a força moral
dos que acreditam na justiça e na liberdade. Luta contra tudo o que lhe
parece opressão ou corrupção, a partir de seus princípios liberais.
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Perfil
da obra e trajetória literária
O mundo rural do Nordeste, com as fazendas,
as senzalas e os engenhos, serviu de inspiração para a obra do autor, que
publicou seu primeiro livro - Menino de engenho - em 1932.
Em 1926 decidiu deixar para trás o trabalho
como promotor público no interior de Minas Gerais e transferiu-se para Maceió,
Alagoas. Lá conviveu com um grupo de escritores muito especial: Graciliano
Ramos (o autor de Vidas Secas), Rachel de Queiroz (a jovem cearense, que já
publicara o romance O Quinze), o poeta Jorge de Lima, Aurélio Buarque de
Holanda (o mestre do dicionário), que se tornariam seus amigos para sempre.
Convivendo neste ambiente tão criativo, escreveu os romances Doidinho (1933) e
Bangue (1934). Daí em diante a obra de Zélins, como era chamado, não conheceu
interrupções: publicou romances, um volume de memórias, livros de viagem, de
conferências e de crônicas. E Histórias da Velha Totônia, seu único livro para
o público infanto-juvenil, lançado em 1936.
Em 1935 mudou-se para o Rio de Janeiro.
Seus livros são adaptados para o cinema e traduzidos na Alemanha, França,
Inglaterra, Espanha, foi eleito para a Academia Brasileira de Letras.
Em 1957 José Lins morreu. Encontra-se
sepultado no Cemitério de São João Batista no Rio de Janeiro. A obra de José
Lins do Rego é publicada pela editora José Olympio.
Despojamento
O
estilo de José Lins é inteiramente despojado e sem atitudes ou artifícios
literários. Ele próprio via a si mesmo como um escritor instintivo e
espontâneo, chegando a apontar que suas fontes da arte narrativa estavam nas
ruas: "Quando imagino nos meus romances tomo sempre como modo de
orientação o dizer as coisas como elas surgem na memória, com os jeitos e as
maneiras simples dos cegos poetas." Apesar desta simplicidade linguística
com que escreve, ele descreve com muita técnica os estados psicológicos de seus
personagens ,seguindo, assim, uma linha inaugurada por Proust. Além disso, ele
tem um domínio da tradição literária e consegue fazer uma crítica dos hábitos
em um estilo que lembra Thomas Hardy.
Fortuna crítica e legado
Durante seu tempo de vida, José Lins foi
lido e criticado por todos os grandes intelectuais do país. Mesmo o seu livro
de estreia, Menino de Engenho, foi assim descrito por João Ribeiro, um dos mais
importantes críticos literários da época:
"Bem examinadas as coisas, este livro
pungente é de uma realidade profunda. Nada há nele que não seja o espelho do
que se passa na sociedade rural e na das cidades do Norte e do Sul do Brasil. É
de todo o Brasil e um pouco de todo o mundo." — José Ribeiro.[13]
Menino
de Engenho é amplamente considerado pela crítica como o pioneiro de uma
"obra que se revelou de importância fundamental na história do moderno
romance brasileiro". O colega Gilberto Freyre afirmou que José Lins havia
iniciado, de fato, um "novo romance em língua portuguesa" e provocado
no Nordeste a poesia modernista-tradicionalista que Jorge de Lima havia inaugurado
com "O Mundo do Menino Impossível" e "Essa Nega Fulô".
Alfredo Bosi, por sua vez, encontrou na obra de José Lins a mais alta expressão
literária, poética e recordativa da transição do engenho para a usina na região
canavieira da Paraíba e de Pernambuco. Wilson Martins não ficou satisfeito com Fogo Morto em seu História da
Inteligência Brasileira, e afirmou que o "o livro passa de simples
reelaboração do Ciclo da Cana-de-Açúcar, sem nada lhe acrescentar e até
tirando-lhe alguma coisa." Bosi considerou, no entanto, Fogo Morto a
verdadeira "superação" do ciclo da cana-de-açúcar.
Antonio Candido destacou a análise das
personagens de Fogo Morto: "O que torna esse romance ímpar entre os
publicados em 1943 é a qualidade humana dos personagens criados: aqui, os
problemas se fundem nas pessoas e só têm sentido enquanto elementos do drama
que elas vivem." Massaud Moisés pôs este romance entre os livros dos anos
30, muito embora ele tenha sido lançado em 1943, pela razão da obra ser uma
expressão "acabada do espírito do projeto estético e ideológico
regionalista característico daquela década." Luciana Stegagno Picchio
afirmou que graças à José Lins "o regionalismo tornou-se um ato pessoal,
um instrumento de realização literária." Sérgio Milliet afirmou que José
Lins fez uma grande obra ao "oferecer-nos uma imagem muito nítida do
Nordeste dos últimos engenhos, evoluindo lentamente entre crises políticas e
lutas domésticas, modorrento sob o sol das secas." Carpeaux escreveu que
todo o universo da casa-grande, da senzala, dos senhores de engenho e etc. não
"existirão nunca mais a não ser nos romances de José Lins do Rego."
Análise
Mário de
Andrade escreveu que Fogo Morto era
um "dado psicológico único". A criação literária de José Lins do
Rego, como ele próprio afirma, foi baseada, fundamentalmente, nas histórias de
trancoso, contadas pela velha Totônia e pela leitura de Os doze pares da França, de Carlos Magno, que ele leu aos doze
anos, ainda no internato de Itabaiana, tendo recebido, também, influências de
Victor Hugo, Proust, Hardy, Stendhal e os que ele chamava de "os grandes
russos da minha vida: Tolstói, Tchecov e Dostoievski". Entre os nacionais,
ele cita Raul Pompeia, Machado de Assis, Gilberto Freyre e Olívio Montene-gro.Participou
do movimento regionalista de 33 organizado por Gilberto Freyre no Recife .
A obra de Zé
Lins caracteriza-se, particularmente, pelo extraordinário poder de descri-ção.
Reproduz no texto a linguagem do eito, da bagaceira, do nordestino, tornando-o
no mais legítimo representante da literatura regional nordestina.
A Menino de Engenho, seguiram-se Doidinho, 1933; Banguê, 1934; Moleque
Ricardo, 1935; Usina, 1936; Fogo Morto, 1943, fechando, com este, o
Ciclo-da Cana-de-Açúcar. Em 1937 publicou Pedra
Bonita e, em 1953, Cangaceiros que formaram o Ciclo do Cangaço. Outras
publicações: Pureza; Riacho doce; Água
mãe (prêmio da Fundação Felipe de Oliveira); Eurídice (Prêmio Fábio Prado);
Meus verdes anos (memórias); Histórias da velha Totônia; Gordos e magros;
Poesia e vida; Homens, seres e coisas; A casa e o homem; Presença do Nordeste
na literatura brasileira; O vulcão e a fonte, (1958, póstuma). Conferências:
Pedro Américo; Conferência no Prata; Discurso de posse na Academia Brasileira
de Letras. Viagem: Bota de sete léguas. Em colaboração com Raquel de Queiroz e
Graciliano Ramos Brandão entre o mar e o amor.
Academia
Paraibana de Letras
É patrono da cadeira 39 da Academia Paraibana de Letras,
que tem como fundador Coriolano de Medeiros. Atualmente ocupada por Sérgio de
Castro Pinto.
Academia
Brasileira de Letras
Foi eleito membro da Academia Brasileira de Letras em 15
de setembro de 1955, para a cadeira 25.
Obras
Romances
Menino de engenho (1932) Doidinho (1933) Bangüê (1934)
O Moleque Ricardo (1935) Usina (1936) Pureza (1937)
Pedra bonita (1938) Riacho doce (1939) Água-mãe (1941)
Fogo morto (1943) Eurídice (1947) Cangaceiros (1953)
Histórias da velha Totonha (1936) Meus Verdes Anos (memórias)
(1956)
Coletânea de Crônicas Gordos e magros (1942).
Poesia e vida (1945). Homens, seres e coisas (1952).
A casa e o homem (1954). Presença do Nordeste na literatura
brasileira (1957).
O vulcão e a fonte (1958). Dias idos e vividos - antologia (1981
Ligeiros Traços: escritos de juventude (2007).
Flamengo é puro amor: 111 crônicas escolhidas (2008).
https://pt.wikipedia.org/wiki/José_Lins_do_Rego
"Fogo morto" - Análise da obra de José Lins do Rego
Obra-prima de José Lins do Rego, esse romance regionalista mostra o declínio dos engenhos de cana-de-açúcar nordestinos e traça amplo perfil das figuras decadentes que giravam em torno dessa atividade econômica.
Aparência e realidade
"Fogo Morto" é um romance de José Lins do Rego surgido no
segundo período do modernismo, a fase regionalista. O período inicial do
movimento havia sido marcado pela busca da identidade brasileira, num caminho
trilhado, principalmente, pelo trabalho com a forma: a exploração da sintaxe e
do vocabulário falado e utilizado no país.
Nas obras da fase regionalista, os autores focam essa mesma busca por meio do trabalho com o universo temático das regiões mais atrasadas do Brasil, sobretudo o interior do Norte e do Nordeste e, em menor escala, a Região Sul do país. Publicado em 1943, "Fogo Morto" é considerado a obra-prima de José Lins do Rego e ocupa lugar de destaque nesse período literário, ao lado de livros igualmente importantes como "Vidas Secas", de Graciliano Ramos, e "O Tempo e o Vento", de Erico Verissimo.
Os méritos do romance, que o alçaram a uma posição respeitável no interior da fase regionalista, devem-se a seu processo de criação. Os três primeiros livros do autor – "Menino de Engenho" (1932), "Doidinho" (1933) e "Bangüê" (1934) – iniciam o ciclo da cana-de-açúcar, no qual José Lins do Rego explorou essencialmente a sociedade que se formava nas proximidades do engenho em razão de sua existência.
Quando publicou "Usina" (1936), no qual é narrado o declínio do engenho de cana-de-açúcar, o autor revelou que a obra encerrava o ciclo citado. Filho temporão desse período, Fogo Morto foi publicado sete anos depois e sintetiza o universo temático dos livros anteriores, além de demonstrar um grau de maturidade estilística e de consciência estrutural que não havia nos demais.
Nas obras da fase regionalista, os autores focam essa mesma busca por meio do trabalho com o universo temático das regiões mais atrasadas do Brasil, sobretudo o interior do Norte e do Nordeste e, em menor escala, a Região Sul do país. Publicado em 1943, "Fogo Morto" é considerado a obra-prima de José Lins do Rego e ocupa lugar de destaque nesse período literário, ao lado de livros igualmente importantes como "Vidas Secas", de Graciliano Ramos, e "O Tempo e o Vento", de Erico Verissimo.
Os méritos do romance, que o alçaram a uma posição respeitável no interior da fase regionalista, devem-se a seu processo de criação. Os três primeiros livros do autor – "Menino de Engenho" (1932), "Doidinho" (1933) e "Bangüê" (1934) – iniciam o ciclo da cana-de-açúcar, no qual José Lins do Rego explorou essencialmente a sociedade que se formava nas proximidades do engenho em razão de sua existência.
Quando publicou "Usina" (1936), no qual é narrado o declínio do engenho de cana-de-açúcar, o autor revelou que a obra encerrava o ciclo citado. Filho temporão desse período, Fogo Morto foi publicado sete anos depois e sintetiza o universo temático dos livros anteriores, além de demonstrar um grau de maturidade estilística e de consciência estrutural que não havia nos demais.
"Fogo Morto" é narrado em terceira pessoa e é dividido em três
partes, que trazem em seus títulos o nome dos três personagens principais: “O
mestre José Amaro”, “O Engenho de Seu Lula” e “O Capitão Vitorino”. Esses
personagens representam, no plano psicológico e moral, a situação em que, no
nível socioeconômico, estão os engenhos de cana-de-açúcar, com a decadência
dessa cultura no processo histórico brasileiro.
Eram chamados de “engenho de fogo morto” aqueles engenhos que paravam de produzir o açúcar, riqueza da época. O espaço decrépito de um universo que perdeu a importância econômica anterior passa a agregar a seu redor personagens decadentes, que, no entanto, carregam ainda o orgulho e a empáfia patriarcal de outros tempos. Essa disparidade entre a aparência que os personagens ostentam e a realidade em que vivem norteia todo o romance.
Eram chamados de “engenho de fogo morto” aqueles engenhos que paravam de produzir o açúcar, riqueza da época. O espaço decrépito de um universo que perdeu a importância econômica anterior passa a agregar a seu redor personagens decadentes, que, no entanto, carregam ainda o orgulho e a empáfia patriarcal de outros tempos. Essa disparidade entre a aparência que os personagens ostentam e a realidade em que vivem norteia todo o romance.
No seguinte trecho, fica bem exemplificado o comportamento quixotesco do
Capitão Vitorino:
“À tarde o mestre escutava o canário da biqueira abrindo o bico nos estalos. Tudo era mansidão em redor de si. O sol brando, o vento calmo, e as folhas da pitombeira bulindo com a brisa. O negro Passarinho roncava. Foi então que apareceu, na égua velha, no passo manso, o capitão Vitorino Carneiro da Cunha (...). - Pois seu mestre - foi falando Vitorino -, os cabras não podem com o velho. O Quinca Napoleão pensava que eu tinha medo de careta e mandou me agredir. O cabra que abriu lata comigo tinha vindo do sertão com fama de valente. Mas com estas mãos que o compadre está vendo, dei com o bicho no chão. Ainda acertei uma tapona na cara. Vitorino Carneiro da Cunha acode a todo chamado. Estão muito enganados comigo. O doutor Samuel abriu processo. Eu disse a ele: ‘Seu doutor, não precisa nada disto. Um homem do meu calibre não precisa da lei para se impor.’ O diabo é que ele quer. O Quinca Napoleão já mandou aquele cachorro do Manuel Ferreira de Serrinha falar comigo para abrir mão do processo. Eu disse a Manuel Ferreira: ‘Conheci o seu pai, seu Manuel Ferreira, era homem de palavra: dizia a todo o mundo que não pagava a ninguém e nunca pagou conta mesmo.’ Ele quis falar grosso comigo. Mas comigo é ali na direita. Fui logo botando para fora tudo o que sentia.”
Após ter apanhado, sem condições de reagir, o capitão gaba-se de ter revidado com sucesso contra o oponente. A situação patética de Vitorino faz dele o personagem mais interessante do livro, que, como foi dito, apresenta um universo de decadência humana e material.
Comentário do professor
“À tarde o mestre escutava o canário da biqueira abrindo o bico nos estalos. Tudo era mansidão em redor de si. O sol brando, o vento calmo, e as folhas da pitombeira bulindo com a brisa. O negro Passarinho roncava. Foi então que apareceu, na égua velha, no passo manso, o capitão Vitorino Carneiro da Cunha (...). - Pois seu mestre - foi falando Vitorino -, os cabras não podem com o velho. O Quinca Napoleão pensava que eu tinha medo de careta e mandou me agredir. O cabra que abriu lata comigo tinha vindo do sertão com fama de valente. Mas com estas mãos que o compadre está vendo, dei com o bicho no chão. Ainda acertei uma tapona na cara. Vitorino Carneiro da Cunha acode a todo chamado. Estão muito enganados comigo. O doutor Samuel abriu processo. Eu disse a ele: ‘Seu doutor, não precisa nada disto. Um homem do meu calibre não precisa da lei para se impor.’ O diabo é que ele quer. O Quinca Napoleão já mandou aquele cachorro do Manuel Ferreira de Serrinha falar comigo para abrir mão do processo. Eu disse a Manuel Ferreira: ‘Conheci o seu pai, seu Manuel Ferreira, era homem de palavra: dizia a todo o mundo que não pagava a ninguém e nunca pagou conta mesmo.’ Ele quis falar grosso comigo. Mas comigo é ali na direita. Fui logo botando para fora tudo o que sentia.”
Após ter apanhado, sem condições de reagir, o capitão gaba-se de ter revidado com sucesso contra o oponente. A situação patética de Vitorino faz dele o personagem mais interessante do livro, que, como foi dito, apresenta um universo de decadência humana e material.
Comentário do professor
“Fogo morto” é um drama humano organizado em três partes, daí a
caracterização de estrutura triangular. Cada uma delas traz no título o nome da
personagem central, nesta ordem: O mestre José Amaro, seleiro orgulhoso e
revoltado; O engenho do “seu” Lula, senhor de engenho, decadente; O capitão
Vitorino, “Papa-Rabo”, tipo quixotesco, defensor de fracos e oprimidos.
Cada uma das partes é dominada por uma personagem, a quem o narrador
deixa falar, ou deixa mostrar-se, expressando a sua visão de mundo. Essa
técnica é conhecida como onisciência multisseletiva, que permite revelar o
mundo a partir do ponto de vista da personagem. A ação de Fogo morto se
desenrola no Engenho Santa Fé, de Lula de Holanda Chacon, personagem que
protagoniza a segunda parte do livro, como já dissemos. Na primeira parte, José
Amaro é um velho seleiro, vivendo de favor nas terras do engenho Santa Fé,
desde a época de seu pai.
Ao lado da mulher, Sinhá Velha, e de Marta, filha solteira e louca, o
mestre Amaro (amargo) é um homem orgulhoso, machista e revoltado contra a ordem
opressiva instituída pelos hábitos patriarcais. Na segunda parte, o narrador
interrompe o relato dos fatos presentes e faz uma retrospectiva, localizando a
ação do romance por volta do ano de 1848, quando chega à região o capitão Tomás
Cabral de Melo, que ergue o engenho Santa Fé, casa-se com Dona Mariquinha e tem
duas filhas. Uma delas, Amélia, casa-se com Lula de Holanda Chacon, primo do
capitão. Ao morrer o capitão, o coronel Lula torna-se senhor de tudo. Na
terceira parte, a ação gira em torno do capitão Vitorino, personagem que tenta
defender o engenho, mas é agredido por cangaceiros e também por policiais.
Vitorino é uma espécie de Quixote nordestino que alimenta esperanças na justiça
e em uma virada política para os liberais.
Vale lembrar que as personagens centrais de cada parte de “Fogo morto”
são tipos de um tempo em que as coisas giravam em torno dos senhores de terra
e, portanto, de uma sociedade patriarcalista e violenta. Podem ser assimiladas
como “fantasmas” perdidos numa outra ordem social, marcada pelo advento da
tecnologia das usinas que substituem a mão de obra dos engenhos da cana de açúcar.
Por essa razão, “fogo morto” é uma expressão regionalista cujo significado é
engenho desativado, abandonado. Outro componente importante é a linguagem
regional do interior da Paraíba, muito bem articulada por José Lins do Rego,
que insere palavras utilizadas pelas próprias personagens em suas conversações
cotidianas.
Marcílio Bittencourt Gomes
Jr. - Professor da Oficina do Estudante - Campinas
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