VICENTE DE CARVALHO
   Vicente Augusto de Carvalho (Santos, 5 de abril de 1866 — Santos, 22 de abril de1924) foi um advogado, jornalista, político, abolicionista, fazendeiro, deputado,magistrado, poeta e contista brasileiro.Era filho do major Higino José Botelho de Carvalho e de Augusta Carolina Bueno, descendente de Amador Bueno, o Anunciado. Formou-se em 8 de novembro de 1886, com 20 anos, da Faculdade de Direito de São Paulo, no curso de Ciências Jurídicas e Sociais (sendo que para matricular-se teve de obter licença especial da Assembléia Geral do Império, por não ter a idade mínima para cursar a cátedra de direito). Quando deputado, foi membro da comissão de redação da Constituição do Estado de São Paulo e secretário de Interior, tendo abandonado a política logo após.N Foi fazendeiro em Franca, entre 1896 e 1901, quando retornou a Santos e lá se estabeleceu como advogado.Transferiu-se em 1907 para São Paulo, tendo sido nomeado juiz de direito no ano seguinte e, a partir de 1914, ministro do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Como jornalista, colaborou em vários jornais, como O Estado de São Paulo e A Tribuna. Em 1889, fundou o Diário da Manhã, em Santos e, em 1905, O Jornal. Serviu como redator das revistas Ideia e República. Tendo publicado verso, estreou na prosa numa polêmica com o poeta Dias da Rocha.Em 1885 publicou seu primeiro livro Ardentias. Três anos depois veio Relicário (1888). Quando voltou a Santos, fervia o movimento abolicionista. Em 1902 publicou o Rosa, rosa de amor.A obra que marcou sua carreira poética, Poemas e Canções, foi primeiro publicada em 1908 com prefácio de seu amigo Euclides da Cunha. Teve dezessete edições.Casou-se em 1888 com Ermelinda Ferreira de Mesquita (Biloca), em Santos, com quem teve quinze filhos. Curiosidades
Os jardins da orla de Santos se devem em parte a Vicente de Carvalho. Em 1921 escreveu, junto a Américo Martins dos Santos e Benedito Montenegro, uma Carta Aberta ao Presidente da República contra apropriações ilegais das áreas em frente à praia.A poetisa santista Maria José Aranha de Rezende (Santos, 02/10/1911 - Santos, 17/06/1999) foi sua sobrinha-neta e pertenceu àAcademia Santista de Letras.
Além de um distrito da cidade do Guarujá, um bairro e uma estação do metrô na cidade do Rio de Janeiro, ruas em Santos, emSão Bernardo do Campo, em Santo André, em Porto Alegre e em Curitiba possuem seu nome.
Muitos de seus poemas foram traduzidos para o italiano por Giusepina Stefani
Obras
 Ardentias 1885
 Relicário 1888
 Rosa, rosa de amor 1902
 Poemas e canções 1908
 Versos da mocidade 1909
 Verso e prosa, incluindo o conto "Selvagem" 1909
 Páginas soltas 1911
 A voz dos sinos 1916
 Luisinha, contos 1924
Academia Brasileira de Letras
Foi o segundo ocupante da cadeira 29, que tem por patrono Martins Pena. Eleito em 1 de maio de 1909, na sucessão de Artur de Azevedo, foi recebido por carta na sessão de 7 de maio de 1910.

Vicente de Carvalho – Wikipédia, a enciclopédia livre

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ANÁLISE DE “A FLOR E A FONTE” DE VICENTE DE CARVALHO.
     O Parnasianismo foi uma escola literária que surgiu em meados do século XIX na frança, se desenvolveu na Europa chegando ao Brasil na segunda metade do século XIX e teve força até o movimento modernista. Essa corrente literária foi uma forte oposição ao Romantismo, pois repudiava a subjetividade, a liberdade das rima, enfim, era contra as características do Romantismo representando, portanto, a valorização da ciência e do positivismo.
    No entanto, por enquanto, nos prenderemos ao lindo poema de Vicente de Carvalho  “A flor e a fonte”:
"Deixa-me, fonte!" Dizia
A flor, tonta de terror.
E a fonte, sonora e fria
Cantava, levando a flor.

"Deixa-me, deixa-me, fonte!
"Dizia a flor a chorar:
"Eu fui nascida no monte...
"Não me leves para o mar."

E a fonte, rápida e fria,
Com um sussurro zombador,
Por sobre a areia corria,
Corria levando a flor.

"Ai, balanços do meu galho,
"Balanços do berço meu;
"Ai, claras gotas de orvalho
"Caídas do azul do céu!..."

Chorava a flor, e gemia,
Branca, branca de terror.
E a fonte, sonora e fria,
Rolava, levando a flor.

"Adeus, sombra das ramadas,
"Cantigas do rouxinol;
"Ai, festa das madrugadas,
"Doçuras do pôr-do-sol;

"Carícias das brisas leves
"Que abrem rasgões de luar...
"Fonte, fonte, não me leves,
"Não me leves para o mar!"

*As correntezas da vida
E os restos do meu amor
Resvalam numa descida
Como a da fonte e da flor.
        ( Vicente de Carvalho )
    Nesse maravilhoso poema percebemos o uso de rimas ricas ou raras. Algumas são: dizia/fria, chorar/mar, fria/corria e gemia/fria. Ricas ou raras porque elas fazem parte de diferentes classes gramaticais (sujeito/verbo ou vice versa) que os escritores parnasianos  buscavam, a qualquer custo, para uma perfeição exterior dos poemas, características marcantes do Parnasianismo.
 Outra característica do Parnasianismo é a ruptura da sintagmática do verso (enjambements).   Podemos notar um exemplo disso logo na primeira estrofe do poema:
"Deixa-me, fonte!" Dizia
A flor, tonta de terror.
E a fonte, sonora e fria,
Cantava, levando a flor."
   O uso dessa ruptura é usado com forma de promover a rima Perfeita (já citada) tão importante para os poetas parnasianos.
   Além disso, podemos perceber no poema que não há a subjetividade do autor embora ele esteja descrevendo um acontecimento que nos causa uma certa tristeza, porem o autor, em nenhum momento, mostra seus sentimentos, apenas descreve os acontecimentos. Temos então mais duas características do Parnasianismo: poesia descritiva e ausência de emoção. Além disso, percebemos clareza e lógica na poesia (outra característica da corrente) o que dar prazer em ler. Enfim, leitores a poesia é linda!


Análise de “A flor ea fonte” de Vicente de Carvalho.

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ANÁLISE DO POEMA “VELHO TEMA”
Só a leve esperança em toda a vida,
Disfarça a pena de viver, mais nada,
Nem é mais a existência, resumida,
Que uma grande esperança malograda.

O eterno sonho da alma desterrada,
Sonho que a traz ansiosa e embevecida,
É uma hora feliz, sempre adiada,
E que não chega nunca em toda a vida.

Essa felicidade que supomos,
Árvore milagrosa que sonhamos,
Toda arreada de dourados pomos,

Existe, sim, mas nós não a alcançamos,
Por que está sempre apenas onde a pomos,
E nunca a pomos onde nós estamos.
ANÁLISE
Localização do Texto
   A poesia 'Velho Tema' é uma das mais conhecidas da obra de Vicente de Carvalho, poeta e político, nascido em Santos (1886 - 1924)
   Como bem mostram suas obras, foi um burilador do verso tal como prega a sua escola - o Parnasianismo.
   De uma sensibilidade muito profunda penetrava com agudeza no mundo interior do homem e daí procurava exprimir os anseios incontidos da alma humana. Mas tudo isso sem decorrer a devaneios e com apuro de forma, de acordo com os moldes de sua escola, esses sentimentos subiam à tona com objetividade e realismo, "às claras", como ele mesmo preconizava "Velho Tema" pertence a obra Poemas e Canções" publicada em 1908.
Determinação da ideia central ou tema
"A insatisfação da alma humana."
Obs.: Para que o tema seja reduzido a apenas um pensamento é interessante que se faça, anteriormente, um resumo do texto.
Determinação da estrutura
a) análise rítmica, estrófica e métrica:
   O poema em questão compõe-se de duas estrofes de quatro versos e duas estrofes de três versos. Trata-se, portanto, de um soneto.
   Versos de dez sílabas (decassílabo), próprios do soneto clássico.
   As rimas são alternadas, quanto à sua disposição, isto é, o primeiro verso rima com o terceiro e o segundo, com o quarto verso.
   São rimas ricas as formadas com palavras de categorias gramáticais diferentes, exemplo, resumida com vida. Há outras, formadas com palavras da mesma categoria, sonhamos com alcançamos, que não podem ser consideradas pobres em vista da precisão com que foram usadas.
Observa-se a beleza e o feliz emprego das rimas pomos (frutos) com pomos (verbo pôr).
b) Apartados ou segmentos:
1°) apartado: primeira estrofe (frustração)
2°) apartado: segunda estrofe (ilusão, esperança)
3°) apartado: as duas últimas estrofes (desejo insatisfeito)
Análise da forma
a) Estudo do vocabulário em relação às ideias:
"leve esperança" - fragilidade.
"disfarça" - engana.
"a pena de viver" - a desgraça de viver, indica o pessimismo, frustração.
"mais nada" - somente essa esperança justifica o viver.
"nem é mais" - ideia de exclusividade, pessimismo.
"esperança malograda" - que não se alcança, frustrada.
"alma desterrada" - alma condenada, destinada à fatalidade.
"embevecia" - absorta, obcecada por um sonho.
"hora feliz, sempre adiada" - idéia de inclusão, de sonho que nunca será concretizado.
"nunca" - confirma a ideia anterior.
"sempre - nunca" - ideias opostas que reforçam a ideia de tempo, de destino implacável.
"felicidade que supomos" - a ideia de suposição, quer dizer que ela não existe, é apenas uma ilusão.
"árvore milagrosa que sonhamos toda arreada de dourados pomos" - essa metáfora é de uma imaginação fertilíssima pois indica como a alma humana concebe a felicidade - uma árvore milagrosa carregada de frutos dourados que simboliza a abundância, a riqueza.
"milagrosa" - significa a duração infinita desse bem.
"dourados" - dá a ideia de riqueza.
"arreada" - carregada e adornada.
"existe, sim" - dá ideia de confirmação, não há dúvida de sua existência.
"está sempre apenas, onde a pomos" - quer dizer que nós mesmos construímos a felicidade.
"e nunca a pomos onde nós estamos" - significa que a alma humana "é uma eterna insatisfeita" pois que não se contenta com o que está a seu alcance, busca sempre um alvo inatingível.
No plano religioso, a felicidade suprema é Deus e a alma só descansará quando encontrá-Lo.
b) Figuras:
Metáfora:
"Árvore milagrosa toda arreada de dourados pomos."
Comparação:
"Nem é mais a existência resumida, que uma grande esperança malograda."
Símbolos:
"dourados pomos."
Sinédoque:
"O eterno sonho da alma desterrada."
c) Relação título contexto:
   Título e contexto estão intimamente relacionados, pois que tema é mais do que a felicidade, ou melhor, do que a procura da felicidade? Como diz Vicente de Carvalho, esse é um "Velho Tema".
É a mola propulsora que impulsiona todas as ações do mundo.
Conclusão:
a) Mensagem:
    Com esse poema, Vicente de Carvalho nos envia uma profunda mensagem - nós mesmos construímos a nossa felicidade e para que a encontremos (basta) devemos construí-la dentro das nossas propriedades pois se a colocamos em terreno alheio nunca teremos direito a ela.
b) Impressão pessoal:
    O que nos toca profundamente é esse tema de âmbito universal, tão velho e ao mesmo tempo tão novo. É assunto que todos conhecem e ao mesmo tempo desconhecem, e quando vem à tona através das palavras buriladas do poeta, todos dizem - isso é verdade, mas, possivelmente, continuem procurando a felicidade onde ela não está.
   Vicente de Carvalho traduz bem a Escola literária a que pertence - o Parnasianismo, aliás, o Parnasianismo brasileiro que além do esmero da forma conservou a sensibilidade, o sentimentalismo, características inatas do povo brasileiro.
Extraído da Nova Biblioteca Prática da Língua Portuguesa - Editora AGE
POSTADO POR R. SANT'ANNA  

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QUESTÕES SOBRE A OBRA DE VICENTE DE CARVALHO
Instrução: As questões de números 25 a 28 tomam porbase um soneto do livro Poemas e Canções, do parnasiana no brasileiro Vicente de Carvalho (1866-1924) e um poema de Cancioneiro, do modernista português Fernando Pessoa (1888-1935).
Velho Tema – 1
Só a leve esperança, em toda a vida,
Disfarça a pena de viver, mais nada;
Nem é mais a existência, resumida,
Que uma grande esperança malograda.

O eterno sonho da alma desterrada,
Sonho que a traz ansiosa e embevecida,
É uma hora feliz, sempre adiada
E que não chega nunca em toda a vida.

Essa felicidade que supomos,
Árvore milagrosa, que sonhamos
Toda arreada de dourados pomos,

Existe, sim: mas nós não a alcançamos
Porque está sempre apenas onde a pomos
E nunca a pomos onde nós estamos.
       (Vicente de Carvalho. Poemas e Canções. 5 ed. São Paulo:
         Monteiro Lobato & C. – Editores, 1923.)
     Cancioneiro, 150
Não sei se é sonho, se realidade,
Se uma mistura de sonho e vida,
Aquela terra de suavidade
Que na ilha extrema do sul se olvida.
É a que ansiamos. Ali, ali
A vida é jovem e o amor sorri.
Talvez palmares inexistentes,
Áleas longínquas sem poder ser,
Sombra ou sossego deem aos crentes
De que essa terra se pode ter.
Felizes, nós? Ah, talvez, talvez,
Naquela terra, daquela vez.
Mas já sonhada se desvirtua,
Só de pensá-la cansou pensar,
Sob os palmares, à luz da lua,
Sente-se o frio de haver luar.
Ah, nessa terra também, também
O mal não cessa, não dura o bem.
Não é com ilhas do fim do mundo,
Nem com palmares de sonho ou não,
Que cura a alma seu mal profundo,
Que o bem nos entra no coração.
É em nós que é tudo. É ali, ali,
Que a vida é jovem e o amor sorri.
        (Fernando Pessoa. Obra poética. Rio de Janeiro:
          Aguilar Editora, 1965.)
25.Os poemas de Vicente de Carvalho e Fernando Pessoa focalizam o tema da busca da felicidade pelo ser humano e se servem de antigas alegorias para simbolizar o que seria essa felicidade que todo homem procura em sua vida, embora nem sempre a encontre. Identifique essas alegorias em cada poema.
Resolução: No célebre soneto de Vicente de Carvalho, a metáfora, desenvolvida em alegoria, da “felicidade que supomos” é a imagem da “árvore... toda arreada de dourados pomos”. Nas sextilhas de Fernando Pessoavcomparece outra das “antigas alegorias” da felicidadenbuscada: a ilha distante – “a ilha extrema do sul” onde a “vida é jovem e o amor sorri”.
    
26. A felicidade existe? – Como encontrar a felicidade? Estabeleça um paralelo entre as respostas que cada um dos poemas apresenta a estas duas questões.
Resolução: Conforme o poema de Vicente de Carvalho, a “árvore milagrosa”, que representa o nosso ideal de felicidade, “existe, sim”, e parece estar a nosso dispor, no sentido de ser disposta por nós. Nós, porém, sempre a dispomos para além do nosso alcance, sempre a colocamosmlá, não aqui – e esta, segundo se depreende do poema, é uma contingência inelutável da vida, pois “sempre” agimos assim e “nunca” de outra forma. Portanto, a conclusão autorizada pelo poema de Vicente de Carvalho é algo paradoxal: a felicidade existe, mas é nosso destino nunca a alcançar.
No poema de Fernando Pessoa, a “ilha extrema ... a que ansiamos”, a ilha em que situamos a nossa felicidade, é toda irrealidade e idealização. O alento que pode dar aos que a idealizam (os “crentes”) é puramente conjectural (“talvez”, palavra três vezes repetida na segunda estrofe). A resposta que este poema oferece à pergunta proposta é que a felicidade não existe tal como (ou onde) a idealizamos: “Não é com ilhas do fim do mundo, / Nem com palmares de sonho ou não, / Que cura a alma seu mal profundo.” Nãoobstante, a felicidade pode existir, desde que não seja buscada  lá nas ilhas distantes, mas no espaço de interioridade que o poema designa como “coração”: “É em nós que é tudo. É ali, ali, / Que a vida é jovem e o amor sorri.”
É comum aos dois poemas a negação do  lá como espaço da felicidade. Esta, segundo ambos, só pode estar aqui. Por isso, para o poema de Vicente de Carvalho, nós não a temos; por isso também, conforme o poema de Fernando Pessoa, não é impossível que a tenhamos.
    
27.Ah, nessa terra também, também / O mal não cessa, não dura o bem. A capacidade de significar muito com um discurso reduzido, que é uma das características permanentes da poesia, pode fazer com que, por vezes, uma ou duas palavras recuperem todo um conteúdo não necessariamente expresso no poema. Com base nesta observação, descreva e explique o conteúdo referenciado na terceira estrofe do poema de Fernando Pessoa apenas pela palavra também.
Resolução: A repetição de também implica, com uma ênfase paradoxalmente desalentada, que numa “terra” como em outra – isto é, na vida como a vivemos e na vida como a idealizamos – “o mal não cessa, não dura o bem”. Portanto, o “conteúdo referenciado” pela palavra também é uma concepção pessimista da existência resumida nesse verso.

28. Os dois poemas se identificam por empregar mais de uma vez a palavra sonho com significado equivalente. O que querem dizer ambos os eus-líricos com essa palavra no contexto dos poemas?
Resolução: Vicente de Carvalho e Fernando Pessoa dão a sonho o sentido de ideal de felicidade, anseio por uma existência  que não se realiza, a “hora feliz, sempre adiada / E que não chega nunca em toda a vida”, para o primeiro poeta e, para o segundo, “aquela terra de suavidade” que “já sonhada se desvirtua”, de tal forma que “só de pensá-la cansou pensar”.
www.curso-objetivo.br/vestibular/.../UNESP_2011_2fase_1dia.pdf

FRANCISCA JÚLIA DA SILVA
   Francisca Júlia da Silva Munster (Xiririca, 31 de agosto de 1871 - São Paulo, 1 de novembro de 1920) foi uma poetisa brasileira.
   Colaborou no Correio Paulistano e no Diário Popular, que lhe abriu as portas para trabalhar em O Álbum, de Artur Azevedo, e A Semana, de Valentim Magalhães, no Rio de Janeiro. Foi lá que lhe ocorreu um fato bastante curioso: ninguém acreditava que aqueles versos fossem de mulher e o crítico literário João Ribeiro, acreditando que Raimundo Correia usava um nome falso, passou a "atacá-lo" sob o pseudônimo de Maria Azevedo. No entanto a verdade foi esclarecida após carta de Júlio César da Silva enviada a Max Fleiuss.
   A partir daí João Ribeiro empenha-se para que o seu primeiro livro seja publicado e, em 1895, Mármores sai pela editora Horácio Belfort Sabino. Já a essa altura era Francisca Júlia considerada grande poetisa nos círculos literários. Olavo Bilac louvou-lhe o culto da forma, a língua, remoçada "por um banho maravilhoso de novidade e frescura", sua arte calma e consoladora. Sua consagração se refletiu nas inúmeras revistas que começaram a estampar-lhe o retrato.
   Em 1899 publica o Livro da Infância destinado às escolas públicas do estado. Sua intenção era começar no Brasil algum tipo de literatura destinada às crianças, algo que até então praticamente não existia. O livro trazia pequenos contos e versos "simples na forma, fluentes na narrativa e escritos no melhor e mais puro vernáculo", conforme acentuou Júlio César da Silva ao prefaciar o livro.
   A experiência de Francisca Júlia com os versos infantis transferiu-se, em parte, para a sua terceira obra Esfinges, publicada em 1903. A grosso modo Esfinges é uma edição ampliada de Mármores, onde excluiu 07 composições e acrescentou 20 novas, sendo 14 inéditas.
   Em 1904, no primeiro dia do ano, Francisca Júlia é proclamada membro efetivo do Comitê Central Brasileiro da Societá Internazionale Elleno-Latina, de Roma.
 Em Cabreúva
   Embora vivendo um momento de consagração como grande poetisa até aquele instante, contudo, por razões nunca esclarecidas, Francisca Júlia abandona a vida pública em São Paulo e parte para Cabreúva, em 1906, onde sua mãe exercia o magistério. Passa a dedicar-se aos serviços domésticos e torna-se professora particular das crianças da região, dando aulas de piano, inclusive, a Erotides de Campos, que mais tarde viria a se tornar um famoso compositor paulista.
   Foi quando conheceu um farmacêutico recém-formado da capital que lá estava de visita aos parentes. Apaixonam-se e fazem planos para o casamento. No entanto, devido a sua fama de doido na cidade, os mais íntimos se opõem ao matrimônio. Recebendo a recusa da poetisa, o jovem parte de Cabreúva com o intuito de voltar, o que não acontece: acaba se casando no Rio e todas as cartas de amor são devolvidas, chocantemente, numa caixa de sapatos.
   A poetisa, então, decide voltar para São Paulo e aguarda a possibilidade de transferência da mãe para partir com ela, o que aconteceu em outubro de 1908, quando é removida para a escola de Lajeado. Ainda em Cabreúva, recusa o convite para participar da Academia Paulista de Letras por não querer ingressar sem o irmão. No mesmo ano faz a sua primeira conferência no salão do edifício da Câmara Municipal, em Itu, sobre o tema "A Feitiçaria Sob o Ponto de Vista Científico".
Casamento e fim
   Casa-se, em 1909, com Filadelfo Edmundo Munster (1865-1920), telegrafista da Estrada de Ferro Central do Brasil. Foi padrinho de seu casamento o poeta e amigo Vicente de Carvalho. Nessa época já estava compenetrada em pensamentos místicos. Isola-se e vive para o lar, recebendo visitas esporádicas de jornalistas que publicam ainda poesias suas. Em 1912 sai seu último livro, Alma Infantil, em parceria com o irmão Júlio César da Silva, que alcança notável repercussão nas escolas do Estado quando grande parte da edição é adquirida pelo Secretário do Interior, na época, Altino Arantes.
    Passa a explorar temas como a caridade, a fé, vida após a morte, reencarnação e ideologias orientais diversas (budismo). Descobre, em 1916, a doença do marido (tuberculose) e mergulha numa depressão profunda, diz ter visões, que está para morrer e tem alucinações provenientes da intoxicação do ácido úrico. Com o passar dos anos a situação se agrava, suas poesias - as poucas que ainda escreve - retratam a vontade de uma mulher que almeja a paz espiritual fora do plano terrestre. Diz, em entrevista a Correia Junior, que sua "vida encurta-se hora a hora". Mesmo assim volta a escrever para A Cigarra e promete um livro de poesias chamado Versos Áureos.
   Em 1920, Filadelfo, desenganado pelos médicos, vem a falecer no dia 31 de outubro. Horas depois do cortejo, no dia seguinte, Francisca Júlia vai para o quarto repousar e suicida-se ao ingerir excessiva dose de narcóticos, vindo a falecer na manhã de 1 de novembro de 1920.
Obras
1895 - Mármores
1899 - Livro da Infância
1903 - Esfinges
1908 - A Feitiçaria Sob o Ponto de Vista Científico (discurso)
1912 - Alma Infantil (com Júlio César da Silva)
1921 - Esfinges - 2º ed. (ampliada)
1962 - Poesias (organizadas por Péricles Eugênio da Silva Ramos)
Estilo literário
   Francisca Júlia, segundo o historiador João Pacheco, desde cedo mostrou ortodoxamente timbres parnasianos, mas com influencia do modernismo, que deixou o poeta Olavo Bilac a inveja de ourives. Sua poesia traz a mais estrita impessoalidade, revelando-se puramente objetiva nas peças que mais célebres ficaram - "Dança de Centauras" e "Os Argonautas", principalmente - em que não palpita nenhum estilo interior, mas em que se modela e se fixa o relevo, a cor, o movimento das formas externas. Em certos momentos, manifesta um raro poder de sonoridade e vigor à língua, imprimindo aos versos uma estrutura que não se apoiava na emoção, mas na própria força e rigor da expressão.
   Todavia apresentava uma tendência ao simbolismo já muito antiga, conforme é vista na poesia "De Joelhos", de 1894, cujo pendor pelo gosto nefelibata refletiu-se em admiráveis efeitos de luz, som e movimento. Tais efeitos repercutiram após a publicação de "Esfinges", em 1903, até o fim da vida, nos anos em que sofrera com a doença do esposo.
   Seu simbolismo, segundo Péricles Eugênio, foi uma das manifestações da moralização de sua arte, que adquiriu um caráter místico e filosófico cada vez mais pronunciado. Pode-se dizer que sua poesia evoluiu de plástica a filosófica, guardando sempre a mesma tranquilidade superior de expressão e revelando o mesmo domínio interior da alma.
Homenagem
   Foi homenageada com o nome de uma importante rua no alto do bairro de Santana, na cidade de São Paulo. Curiosamente outros autores simbolistas foram homenageados também com ruas do Alto de Santana, existindo os cruzamentos Rua Francisca Júlia x Rua Alphonsus de Guimaraens e Rua Francisca Júlia x Rua Paulo Gonçalves.
    Em 1933 o Senado aprovou a implantação da estátua "Musa Impassível" sobre o seu túmulo no Cemitério do Araçá, esculpida em granito carrara por Victor Brecheret. Em dezembro de 2006, após 15 anos de acordo entre a Prefeitura e o Estado para o translado, a estátua foi removida para a Pinacoteca de São Paulo, onde passou por um delicado processo de restauração antes de ser liberada para exposição pública

Francisca Júlia da Silva – Wikipédia, a enciclopédia livre
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FRANCISCA JÚLIA, A "MUSA IMPASSÍVEL"
Roberto Fortes
   Muito pouco se escreveu sobre o maior vulto feminino do parnasianismo brasileiro. Num universo inteiramente dominado por poetas do chamado sexo forte, Francisca Júlia provou que mulher também sabia fazer poesia de qualidade. Como poucos, criou versos perfeitos e em nada ficou a dever à chamada "trindade parnasiana" (Olavo Bilac, Raimundo Correa e Alberto de Oliveira, que foram seus admiradores e principais incentivadores).
   Desde a infância, Francisca Júlia já demonstrava pendor para a poesia. O ambiente familiar a isso contribuía: o pai, Miguel Luso da Silva, era advogado provisionado, amigo particular dos livros; a mãe, Cecília Isabel da Silva, professora na escola de Xiririca (hoje Eldorado, no Vale do Ribeira, Estado de São Paulo). Foi nessa aprazível cidade às margens do Rio Ribeira de Iguape que, a 31 de agosto de 1871, nasceu a poetisa Francisca Júlia da Silva. O ano de seu nascimento é um tanto contraditório: alguns citam 1874, outros 1875. De acordo com o irmão de Francisca, o também escritor Júlio César da Silva, a quem devemos dar crédito, o ano correto é mesmo 1871.
   Transferindo-se com os pais para São Paulo, Francisca Júlia logo passou a colaborar com os jornais mais importantes da época. Sua estréia deu-se no jornal O Estado de S. Paulo, onde publicou seus primeiros sonetos. A partir de então, começou a colaborar assiduamente para o Correio Paulistano e Diário Popular. Colaborou também para jornais do Rio de Janeiro, com destaque para as revistas O Álbum, de Arthur Azevedo, e, especialmente, A Semana.
   Em 1895, apareceria seu primeiro livro, Mármores, reunindo sonetos publicados n'A Semana de 1893 até aquele ano, custeado pelo editor Horácio Belfort Sabino. Prefaciado por João Ribeiro, o livro causou sensação nas rodas culturais de São Paulo e Rio de Janeiro. Olavo Bilac, numa crônica emocionada, destacou: "Em Francisca Júlia supreendeu-me o respeito da língua portuguesa, — não que ela transporte para a sua estrofe brasileira a dura construção clássica: mas a língua doce de Camões, trabalhada pela pena dessa meridional, — que traz para a arte escrita todas as suas delicadezas de mulher, toda a sua faceirice de moça, nada perde da sua pureza fidalga de linhas. O português de Francisca Júlia é o mesmo antigo português, remoçado por um banho maravilhoso de novidade e frescura."
   A Semana era uma das revistas mais conceituadas que então se editava na Capital Federal. Dirigida por Valentim Magalhães, tinha como redatores ilustres escritores da época: João Ribeiro, Araripe Júnior e Lúcio de Mendonça. A estréia de Francisca Júlia na revista provocou grande alvoroço: os redatores não acreditavam que uma mulher pudesse escrever versos tão perfeitos. Não foi sem razão que João Ribeiro exclamou: "Isto não é verso de mulher! Deve ser uma brincadeira do Raimundo Correa!..."
   Encantado com esse talento literário que emergia, João Ribeiro prefaciaria o livro Mármores. Ombreando-a à trindade parnasiana, Ribeiro escreveu: "Nem aqui, nem no sul nem no norte, onde agora floresce uma escola literária, encontro um nome que se possa opor ao de Francisca Júlia. Todos lhe são positivamente inferiores no estro, na composição e fatura do verso, nenhum possui em tal grau o talento de reproduzir as belezas clássicas com essa fria severidade de forma e de epítetos que Heredia e Leconde deram o exemplo na literatura francesa."
   João Ribeiro espargiu mais elogios, recordando a estréia da poetisa n´A Semana: "A sua poesia enérgica, vibrante, trazia a veemência de sonoridades estranhas, nunca ouvidas, uma música nova que as cítaras banais do nosso Olimpo nos haviam desacostumado."
   Tanto confete lançado em torno de sua estréia literária parece não ter subido a cabeça da jovem e já consagrada poetisa, então com 24 anos. Ao contrário, cada vez mais incentivada por amigos de peso, dedica-se integralmente à atividade poética, traduzindo para o português versos do poeta alemão Heine.
   Apesar de parnasiana na forma, Francisca Júlia também teve alguma passagem pelo simbolismo, introduzido no Brasil nessa última década do Século XIX.
   Em 1899, juntamente com o irmão Júlio César, escreve o Livro da Infância, obra didática logo adotada pelo Governo de São Paulo em escolas do primeiro grau. Seu segundo e último livro de poesias, Esfinges, porém, só apareceria em 1903, novamente prefaciado pelo amigo e admirador João Ribeiro, sendo editado pela firma Bentley Júnior & Cia.
   A exemplo de Mármores, seu novo livro foi igualmente aplaudido pela crítica. Aristeu Seixas não poupou elogios: "Nenhuma pena manejada por mão feminina, seja qual for o período que remontemos, jamais esculpiu, em nossa língua, versos que atinjam a perfeição sem par e a beleza estonteante dos concebidos pelo raro gênio da peregrina artista."
   Outros poetas famosos não deixaram de manifestar, em crônicas emocionadas, vibrantes elogios à mais nova produção literária de Francisca Júlia, entre eles, Vicente de Carvalho e Coelho Neto.
   Em 1909, a poetisa contrai matrimônio com Filadelfo Edmundo Munster, telegrafista da Estrada de Ferro Central do Brasil. A bela cerimônia, que teve Vicente de Carvalho como padrinho, realizou-se na capela de Lajeado, Capital (SP). Nessa ocasião, foi convidada (e gentilmente recusou) a fazer parte da Academia Paulista de Letras, então em vias de ser fundada. A partir desse ano, decide deixar a poesia de lado e se dedicar apenas ao esposo e ao lar.
   Alguns anos mais tarde, outra vez em colaboração com o irmão Júlio César, produz seu último trabalho literário, Alma Infantil, editado em 1912 pela Livraria Magalhães.
   Na segunda década do século, Francisca Júlia já era uma poetisa há muito consagrada. Aos 46 anos recebe talvez a maior homenagem que lhe prestaram em vida, quando um grupo de admiradores organizou em 1917 uma sessão literária e ofereceu seu busto à Academia Brasileira de Letras. Era a consagração da talentosa artífice de versos, da "Musa Impassível", como ficou conhecida.
   Acometido de tuberculose, após demorado tratamento, Filadelfo Munster faleceu em 31 de outubro de 1920. A perda do companheiro tão querido foi arrasadora para a sensível poetisa, cuja emoção não pode conter, em nada demonstrando ser a autora daqueles versos frios, impassíveis. Confessou aos amigos que sua vida não tinha mais sentido sem a companhia do marido e deixou claro que "jamais poria o véu de viúva" (seria uma indicação de suicídio?). Retirou-se para repousar em seu quarto e ingeriu excessiva dose de narcóticos. No dia seguinte, ao abraçar o caixão onde jazia o corpo inerte do esposo, num último e emocionado adeus, Francisca Júlia falecia aos 49 anos. Seu corpo foi enterrado no Cemitério do Araçá, em São Paulo, ao meio-dia de 2 de novembro.
   Foi apresentada proposta, pelo deputado estadual Freitas Vale, para se erigir uma mausoléu em memória à poetisa, que seria construído no governo de Washington Luiz. Sobre essa escultura, as palavras de Menotti del Picchia dizem tudo: "A estátua que se ergue hoje no cemitério do Araça, a Musa Impassível, é um mármore criado pelo cinzel triunfal de Victor Brecheret. Na augusta expressão dos seus olhos, do seu busto ereto, da suas mãos rítmicas, há toda a grandeza e a beleza daquela musa impassível da formidável parnasiana que concebeu e realizou a —Danças das Centauras —. O estatuário é bem digno da poetisa."
   A despeito da importância incontestável de sua obra, Francisca Júlia ainda não ocupa o lugar que lhe é devido no cenário da poesia brasileira, talvez por "esquecimento" dos estudiosos da literatura brasileira e dos críticos literários em geral. Nos livros didáticos adotados nas escolas secundárias e nas universidades, pouco ou nada se encontra sobre a poetisa e sua obra. É uma falta de respeito à sua memória e uma dívida a ser resgatada com a literatura de língua portuguesa.

ESTUDO DE "MUSA IMPASSÍVEL" - ESTRATÉGIAS LINGUÍSTICAS
Musa! um gesto sequer de dor ou de sincero
Luto jamais te afeie o cândido semblante!
Diante de Jó, conserva o mesmo orgulho; e diante
De um morto, o mesmo olhar e sobrecenho austero.

Em teus olhos não quero a lágrima; não quero
Em tua boca o suave e idílico descante.
Celebra ora um fantasma anguiforme de Dante,
Ora o vulto marcial de um guerreiro de Homero.

Dá-me o hemistíquio d'ouro, a imagem atrativa;
A rima, cujo som, de uma harmonia crebra,
Cante aos ouvidos d'alma; a estrofe limpa e viva;

Versos que lembrem, com seus bárbaros ruídos,
Ora o áspero rumor de um calhau que se quebra,
Ora o surdo rumor de mármores partidos.
   Primeiro é necessário esclarecer o termo “Musa”: remete a uma das nove divindades da mitologia clássica grega e latina, filhas de Zeus e Mnemósine (deusa da memória), que protegiam as letras, as artes liberais e as ciências.
   A presença da musa no poema indica sempre a alusão à inspiração dos poetas, daquele ser pretensamente exterior, que dominaria a criação poética. Claro que esse é apenas um efeito literário.
   No soneto citado, ao descrever todas as características de “sua” musa, ao desejá-la impassível, ou seja, imune às paixões e aos outros sentimentos daí advindos, o sujeito lírico fala de si mesmo, de sua maneira de pensar e agir diante do fato poético: contenção da emoção, absoluto domínio de si diante da criação, um trabalho incessante na busca da perfeição textual, tentativa de se evitar o subjetivismo, isto é, a marca forte de seu eu, o que era uma busca incessante do Parnasianismo. Enfim, sufocamento da inspiração pura e simples em proveito do trabalho intelectual. A própria assunção dessa personagem mitológica, que remete à inspiração, é um paradoxo, portanto.
   Mas, à luz da Teoria do discurso, vemos que, como todos os outros poetas do parnasianismo, Francisca Júlia esteve longe dessa impassibilidade. Dominique Maingueneau em seu Termos-chave da análise do discurso (1.ª reimpressão, Belo Horizonte: UFMG, 2000), no verbete “subjetividade” diz que “é praticamente impossível encontrar um texto que não deixe aflorar a presença do sujeito falante”. Saliente-se que, no caso, ele se refere a qualquer texto, não só ao poético. Começa-se a descobrir que o eu não aparece apenas explicitamente no texto, nos pronomes de primeira pessoa, nos adjetivos que traduzem seus estados de alma, no sentimentalismo, como faziam, por exemplo, os românticos.
    Maingueneau vai estudar “as marcas” dessa subjetividade, quer dizer, desse eu que, sem querer, acaba se revelando. Por exemplo: se num texto aparece a expressão “casa grande”, temos aí uma propriedade de um objeto. Mas se encontramos “casa magnífica”, temos, mais do que uma propriedade do objeto, mas um julgamento de valor, uma reação emocional do enunciador, que podia estar pretendendo fazer uma descrição objetiva e contida. Sem querer, há a clara presença desse eu.
   O estudioso faz uma análise teórico minuciosa, mas aqui citarei apenas o que são as “tomadas de posição” do sujeito lírico do soneto em questão, mostrando que ele não é desapaixonado nem impassível. Parecendo falar de um elemento exterior a si, a criação literária, e exortando à contenção emocional, o que esse ser enunciador faz é jogar-se inteiramente em suas escolhas linguísticas. Aliás, a própria noção de “escolha” – preferência, predileção – já está a assinalar a presença de um eu arbitrário. Ao empregar determinado verbo ou adjetivo, o sujeito enunciativo mostra inteiramente suas preferências ou avaliações sobre o que fala.
   Ele nega qualquer gesto de dor ou lágrima para seu eu, que ele nomeia como musa, tentando evitar o sentimentalismo. Mas ao empregar o verbo “afeie” para semblante, em lugar, por exemplo, de “modifique”, a emoção já guiou sua opção.
   Prosseguindo, esse enunciador deseja uma série de procedimentos poéticos que “cante aos ouvidos d’alma”. Bem, a escolha de todos esses elementos, desde o próprio verbo cantar, é de uma subjetividade extrema. Imaginar-se ouvidos d’alma não tem nada de objetivo ou impassível. Observemos as expressões adjetivas de “sincero luto”, “cândido semblante”, “sobrecenho austero”, que, somadas à atribuição “d’ouro” para hemistíquio – metade de um verso – são pessoais, são afetivas e, nesse caso, completamente emocionais.
   A última estrofe termina por completar o derramamento sentimental naqueles “bárbaros ruídos”. Se o enunciador poderia escolher o adjetivo sinônimo “rude”, que já seria avaliativo, e portanto subjetivo, imagine-se a opção por “bárbaros”, que, além de ter o mesmo significado, ainda agrega uma séria de dados culturais e históricos (aconselho a consulta a um bom dicionário e a leitura de todo o verbete).
   A estrofe, a partir daí, se fecha em duas construções que podem ser vistas, no mínimo, como duas comparações para “versos”: “áspero rumor de um calhau que se quebra” e “surdo rumor de mármores partidos”. Na primeira, o leitor se depara com uma sinestesia, que é a construção de uma expressão que apela a dois sentidos diferentes: “áspero” remete ao tato e “rumor” à audição.
Ora, utilizar figuras de linguagem é abrir mão da linguagem objetiva de um discurso que se quer impassível, em prol da via poética, que é polissêmica e aponta vários caminhos, não só para o leitor, como para o próprio sujeito enunciador. Quem fala através da linguagem figurada quer tudo, menos fugir à emoção.

Francisca Júlia, a "Musa Impassível" - Roberto Fortes
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estratégias linguísticas - Literatura em vida 2
Francisca Júlia - Dominique Maingueneau - Análise do Discurso ...
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FRANCISCA JULIA E A INSERÇÃO DA MULHER NO CAMPO LITERÁRIO: UM INTERMÉDIO ENTRE O PARNASIANISMO E O SIMBOLISMO
Silvio Profirio da Silva
Aline Adriana da Silva
Edna Carla Lima da Silva
Salete Paiva da Silva
RESUMO: Durante muito tempo, a produção literária foi algo restrito ao universo masculino. Assim, a mulher tinha sua voz silenciada. Contudo, nesse campo, marcado pela presença masculina, eclode a atuação da mulher. Este trabalho objetiva abordar os subsídios de Francisca Julia para a inserção da mulher no âmbito da composiçãodo texto literário. Pretende-se, também: a) abordar suas características temático-estilísticas como um intermédio entre o Parnasianismo e o Simbolismo; b)
a condição de esquecimento a que foi alçada essa autora.
Palavras-chave: inserção; mulher; escrita; dualidade; esquecimento.
INTRODUÇÃO
   Durante muito tempo, a produção literária foi algo restrito ao universo masculino. Com isso, a mulher tinha sua voz silenciada em um cenário caracterizado, exclusivamente, pela supremacia masculina. Em geral, os únicos papeis e funções sociais atribuídos à mulher, ainda que letrada, eram o de esposa, de mãe e de doméstica do lar, submetendo-se, assim, à preponderância masculina. O que reflete as condições sociais e históricas nas quais se encontravam as mulheres nesse período. Contudo, em um campo marcado, predominantemente, pela presença masculina, eclode a atuação da mulher no âmbito da escrita, mais especifi camente, na composição do texto literário.
   Esse é o contexto no qual surge a produção literária de Francisca Julia da Silva.
   À luz das contribuições teóricas de Andrade (1987), Bosi (1984), Côelho et al. (2008), Coelho (2010), Leandro e Joanilho (2006), Moisés (1969), Ramos (2011), Romero (1943), Veríssimo (1915), entre outros, este trabalho tem por objetivo abordar os subsídios de Francisca Julia da Silva para a inserção da figura feminina na composição do texto literário e, por conseguinte, no âmbito literário.     Decorrente deste, pretende-se:
• Abordar características temático-estilísticas de sua obra em uma perspectiva de intermédio entre a Escola Parnasiana e a Simbolista;
• Refl etir acerca do fato de essa autora não ser abordada pela maior parte dos Livros Didáticos de Literatura. Ou, então, ser retratada como autor minoritário, na medida em que a abordagem do seu legado cultural limita-se a pequenoscomentários e a tópicos na parte do capítulos que menciona Outros Autores da Escola Parnasiana.
A INSERÇÃO DA FIGURA FEMININA NO ÂMBITO LITERÁRIO E A ALTERAÇÃO NO PAPEL SOCIAL DA MULHER
  Da preponderância masculina ao espaço da figura feminina na escrita literária.
   Esse percurso reflete o movimento, ou melhor, o salto na evolução da trajetória da função social da mulher, mesmo que inicial. Sabe-se que, durante muito tempo, a escrita literária foi algo dominado, predominantemente, pela figura masculina. Em face dos ideais/ da ideologia de uma época, a mulher tinha sua voz silenciada e, por conseguinte, tinha sua participação, no âmbito literário, extinta. Tal situação não só evidencia as condições sócio-históricas da mulher nessa época, mas, em especial, demonstra os critérios não-linguísticos que estabeleciam os padrões de normalidade no ramo da escrita. A mulher, desse modo, tinha sua voz e participação erradicadas do universo literário em virtude de aspectos que transcendem o âmbito linguístico, inserindo, assim, as questões de gênero na composição literária.
   Em contraposição a essa postura de segregação social da mulher, eclode outra de inclusão, embora mínima nessa época. Eclode, dessa maneira, a obra da autora Francisca Julia da Silva, um dos primeiros nomes femininos inclusos no ramo da escrita literária. Apesar de seu quantitativo de obras ser considerado pequeno, seu legado consegue dar conta de refletir não só sua contribuição para a evolução da trajetória literária e cultural do Brasil, mas também faz um convite à reflexão  das condições a que estava submetida a mulher nessa época, em decorrência da conjuntura social que alçava a figura feminina à condição de objeto de submissão.
   Diante dessa perspectiva, a obra de Francisca Julia traz uma reflexão acerca da inserção e da participação da mulher no contexto da escrita literária.
   Coelho (2010) ressalta o fato de essa autora, em sua eclosão na produção literária, foi desacreditada em virtude de sua condição feminina. Para isso, Coelho (2010) cita Constantino (1941, p. 2) que afirma que o surgimento de uma mulher no campo literário ocasionou muita polêmica. Motivo este que fez com que muitos acreditassem que um autor estaria se utilizando de um pseudônimo, Francisca Julia, para difundir seus textos. O que está em sintonia com Coêlho et al. (2008, p.5), que diz que “o estético da forma e chegou a ser atribuído a vários outros poetas até
que se descobrisse que Francisca Julia não se tratava de um pseudônimo”. Nessa direção, percebe-se que a mulher era desacreditada, ou seja, a figura feminina não teria capacidade de compor um texto literário de tamanha magnitude.
   Francisca Júlia assustava os líderes do intelectualismo brasileiro [...]. Como admitir, pois, a audácia da mulher que criava obras primas, conquistando, por isso mesmo, o título de maior expressão no parnasianismo? Combateram-na em vão.
   O bom senso reagiu. Vergonha, pretender anular os méritos de quem, na arte da forma, ombreava com Raimundo, com Alberto e com Bilac. [...] (CONSTANTINO, 1941, p. 2 apud COELHO 2010, p. 9).
   Tinha-se, assim, uma produção literária que preconizava uma predominância masculina nesse âmbito, o que, por sua vez, excluía a inserção da mulher na construção/ produção literária. É nesse sentido que, Francisca Julia da Silva, enquanto uma das primeiras autoras [nomes femininos brasileiros] inclusos na escrita literária, põe em xeque essa perspectiva, tradicionalmente, excludente e de segregação a que era submetida a mulher. O que, por sua vez, abre espaço para a mulher nesse âmbito, ainda que mínimo inicialmente.
FRANCISCA JULIA: A DUALIDADE ENTRE O PARNASIANISMO E O SIMBOLISMO
   Sabe-se que os pressupostos teóricos das mais diversas correntes literárias refletem-se na escrita do autor durante o decorrer da composição do texto literário.
   Dentro dessa perspectiva, seus textos reproduzem os ideais das vertentes nas quais estão inclusos, expressando-os tematicamente e estilisticamente na superfície do texto. Atrelado a isso, durante muito tempo, acreditou-se que, na composição do texto literário, o autor se utiliza dos pressupostos teóricos e das características temático-estilísticas de uma escola apenas.
   Com base nessa visão, a articulação, ou melhor, a junção de aspectos de vertentes literárias distintas não ocorre e, acima de tudo, não se materializa nos signos expostos na superfície textual. Porém, ao longo da trajetória histórico-social da Literatura Brasileira, alguns autores põem em xeque essa perspectiva, mostrando a junção de aspectos e fatores de escolas que, em geral, são mostradas como opostas pode ocorrer. Um exemplo que ilustra/ reflete essa nova perspectiva de composição do texto literário é Francisca Julia da Silva que comunga de traços estilísticos e temáticos das Escolas Parnasiana e Simbolista. Partindo desse pressuposto, optou-se, inicialmente, por apresentar uma síntese das característica de cada uma dessas escola e, após isso, perceber como elas se refl etem/materializam nas escritas de Francisca Julia da Silva.
   O Parnasianismo se volta para a Impessoalidade, isto é, a neutralidade do autor em face da realidade, não interferindo, assim, no tratamento dados aos fatos.
   Dentro dessa perspectiva, o autor do texto literário deve lançar mão da neutralidade diante da realidade, em detrimento dos seus sentimentos. Nessa ótica, essa escola se contrapõe ao subjetivismo proveniente do Romantismo. Esse aspecto reflete um fato comum a maior parte das escolas literárias, isto é, o fato de se opor veemente à escola anterior, buscando, assim, ideais de fundamentação em vertentes anteriores a que se opõe. Outra característica temática do texto Parnasiano diz respeito à supervalorização do esteticismo [estética] e uma intensa busca pela perfeição, centrando-se, preponderantemente, na forma. Esta, por sua vez, pode ser definida como a maneira como o texto se estrutura e se organiza na superfície textual, ou seja, os fatores internos do texto literário. Nessa perspectiva, os autores dessa corrente literária voltam sua atenção e seu olhar para a construção estrutural do texto literário, voltando-se, predominantemente, para a busca intensa pela perfeição formal. Norteados por essa perspectiva, eles “instauram o materialismo da forma, o artesanato do verso. A palavra é trabalhada como matéria-prima que deve ser lapidada, burilada e cinzelada” (ANDRADE, 1987, p. 108).
   Ao preconizar versos presos a estruturas formais e objetivas, que não davam vazão ao sentimento, à emoção e, sobretudo, ao engajamento social, que “negavam” ardentemente. Por essas razões essa poesia é vista como uma poesia objetiva, impessoal e contida. (ALARINI, 2009, p. 957).
   Desataca-se, ainda, a perspectiva que esses autores adotam de utilizar, no enfoque dado ao texto, as descrições de cenas e, sobretudo, de objetos, tais como, quadros, obras arquitetônicas, vasos etc.. Tinha-se, desse modo, uma “poesia descritiva, plástica e visual” (ANDRADE, 1987, p. 108), que concedia primazia ao cromatismo [a forma como ela joga com as cores] e, sobretudo, no que tange às cenas que retratam aspectos e fatores concernentes à natureza, conforme ressalta Andrade (1987).
   Conforme dito anteriormente, uma peculiaridade comum a maior parte das correntes e escolas literárias refere-se ao ato de se opor ao estilo anterior, por intermédio de seus pressupostos, características e tratamentos dado ao texto. Além disso, ao realizar esse ato, tais escolas buscam suas bases de fundamentação em correntes literárias anteriores às que se contrapõem. Dentro desse contexto, o Simbolismo se volta para o subjetivismo desprezado pelos Parnasianos, valorizando, assim, o “eu” e, acima de tudo, aderindo à ideologia da Vertente Romântica combatida com grande empenho pelos Parnasianos]. Dito de outra forma, em virtude da oposição ao Romantismo, a Vertente Parnasiana adere a alguns dos ideais e aos pressupostos do Arcadismo, que preconizava a escrita do texto literário tendo como base de fundamentação modelos pré-estabelecidos, isto é, um objeto de arte normativo, especificando, assim, como deveria ocorrer a composição de cada gênero. Daí provém a questão da constante busca pela perfeição formal a que se dedicavam veemente os Parnasianos. Os Românticos, na busca pela originalidade e pela construção de uma nova forma de escrita [objetivo de criar algo novo], põem em xeque essas normas, contrapondo-se, assim, ao Arcadismo. Daí advém um dos fatores causadores do embate entre a Escola Romântica e a Simbolista, ou seja, o fato de recorrer a outros modelos e perspectivas  postos anteriormente anteriores.
  Ainda no tocante ao Simbolismo, essa escola literária valoriza os aspectos interiores do homem, isto é, sua essência. Nesse contexto, é comum nessas obras a abordagem de aspectos relativos ao corpo, ao espírito e à alma, o que reflete uma perspectiva de cunho/ teor psicológico. Desataca-se, ainda, o fato de os autores dessa escola lançarem mão de uma linguagem musical, ou melhor, uma linguagem que articula os signos expostos na superfície textual à musicalidade. Para tanto, o autor se utiliza de diversas estratégias e recursos linguísticos, tais como, a aliteração e a assonância, transcendendo, assim, a limitação às rimas e, sobretudo, à forma, valorizando, assim, os aspectos sonoros da linguagem escrita.
  Contudo, há autores que possuem características de duas escolas literárias contemporâneas entre si, articulando, assim, seus pressupostos que, até então, se contrapunham. Um exemplo que pode ilustrar essa questão é Francisca Julia que lança mão, em seus textos, de características temático-estilísticas tanto do Parnasianismocomo do Simbolismo, refl etindo, assim, um intermédio entre essas duas vertentes literárias. O que está em consonância com Coêlho et al. (2008, p. 5), que diz que “a obra de Francisca Julia da Silva Munster (1874-1920) situa-se no período de convívio entre o Parnasianismo e o Simbolismo”.
ENTRE O PARNASIANISMO E O SIMBOLISMO: OS ASPECTOS TEMÁTICO-ESTILÍSTICOS E OS TRAÇOS DA DUALIDADE
   Francisca Julia é considerada por muitos teóricos o adepto mais fi el da Escola Parnasiana pelo fato de seguir os ideais e pressupostos dessa escola, sobretudo, no que concerne à impassibilidade. Em outras palavras, a neutralidade do autor diante da realidade circundante, o que possibilita a não inclusão, a não participação e o distanciamento do autor no tratamento dado aos fatos. Nessa ótica, o tratamento dado à realidade se dá sem a interferência dos aspectos interiores do autor. Em
função disso e em virtude do soneto "Musa Impassível”, essa autora recebeu o título de “A musa Impassível”.
   A obra de Francisca Julia da Silva Munster (1874-1920) situa-se no período de convívio entre o Parnasianismo e o Simbolismo. Seu primeiro livro intitulado Mármores vem a público em 1895 e é recebido com entusiasmo pelos literatos da época. Tendo sua poética alcançado o mais alto grau de perfeição formal – ideal supremo da escola parnasiana. (COÊLHO et al., 2008, p. 5).
   Outro aspecto comum nas obras de Francisca Julia [aspecto proveniente da estética parnasiana] refere-se ao descritivismo, fazendo com que o leitor, durante a leitura do texto literário, realize um movimento que remete às imagens mentais e visuais retratadas pelos signos distribuídos ao longo do texto. O que vai ao encontro de Coêlho et al. (2008, p. 8), que diz que “a autora utiliza as palavras com uma maestria hipnotizante que evidencia o poder de encantar e sugestionar o leitor por meio dacriação de imagens e pensamentos pela “simples” descrição das cenas retratadas no
poema”. Mas, destaca-se, sobretudo, a busca incessante pela forma. Dito de outramaneira, a forma como o texto literário se confi gura e se apresenta na superfícietextual. Assim, a autora, em função dos pressupostos do Estilo Parnasiano, volta seu olhar para a construção estrutural do texto literário. Por essa razão, seus versos são considerados por muitos como perfeitos [os mais perfeitos da Língua Portuguesa].
   São exemplos de autores que ilustram esse reconhecimento à composição literária dessa autora,  
 CARACTERISTICAS TEMÁTICO-ESTILÍSTICAS DO PARNASIANISMO
   Consoante Andrade (1987, p. 108), “o Parnasianismo é a negação da poesia sentimental e confessional dos românticos”. Com isso, essa escola literária volta-se, predominantemente, para a impassibilidade [a não inclusão do autor, dos seus aspectos emocionais e internos na abordagem da realidade] e, sobretudo, para a erradicação/ extinção do lirismo. Essa nova perspectiva pode ser percebida no texto abaixo, por meio do qual a autora consegue refl etir perfeitamente os ideais e
pressupostos parnasianos. Para realizar tal faceta, ela focaliza veemente a questão da impassibilidade, a partir da erradicação do lirismo, do envolvimento do autor na abordagem/no tratamento dados aos fato e do descritivismo [a maneira impressionante como ela trabalha as cores e, simultaneamente, descreve os aspectos da natureza, remetendo o leitor aos fatores visuais. Percebe-se, ainda, traços da Mitologia Grega.
MUSA IMPASSÍVEL II
Ó Musa, cujo olhar de pedra, que não chora,
Gela o sorriso ao lábio e as lágrimas estanca!
Dá-me que eu vá contigo, em liberdade franca,
Por esse grande espaço onde o Impassível mora.

Leva-me longe, ó Musa impassível e branca!
Longe, acima do mundo, imensidade em fora,
Onde, chamas lançando ao cortejo da aurora,
O áureo plaustro do sol nas nuvens solavanca.

Transporta-me, de vez, numa ascensão ardente,
À deliciosa paz dos Olímpicos-Lares,
Onde os deuses pagãos vivem eternamente,

E onde, num longo olhar, eu possa ver contigo,
Passarem, através das brumas seculares,
Os Poetas e os Heróis do grande mundo antigo
          Ainda tendo como base de fundamentação teórica os pressupostos de Andrade (1987, p. 108), diz-se que “O Parnasianismo foi a recuperação dos ideais classicismo: representou um retorno aos temas e formas da poesia Greco-romana”. Por esse motivo, é comum nas obras dessa escola o espaço dado às figuras da Mitologia Grega, conforme ocorre no texto abaixo:
DANÇA DE CENTAURAS
Patas dianteiras no ar, bocas livres dos freios,
Nuas, em grita, em ludo, entrecruzando as lanças,
Ei-las, garbosas vêm, na evolução das danças
Rudes, pompeando à luz a brancura dos seios.

A noite escuta, fulge o luar, gemem as franças;
Mil centauras a rir, em lutas e torneios,
Galopam livres, vão e vêm, os peitos cheios
De ar, o cabelo solto ao léu das auras mansas.

Empalidece o luar, a noite cai, madruga...
A dança hípica pára e logo atroa o espaço
O galope infernal das centauras em fuga:

É que, longe, ao clarão do luar que empalidece,
Enorme, aceso o olhar, bravo, do heróico braço
Pendente a clava argiva, Hércules aparece...
    Nessa ótica, percebe-se, nesse texto, traços da presença de aspectos mitológicos e históricos, o que vai ao encontro dos pressupostos da Escola Parnasiana [por conseguinte, dos modelos arca distas]. Nos textos dessa escola, são típicas a abordagem de figuras mitológicas. O que está em consonância com Christo (2005), que afirma que, de acordo com a escola literária a que pertenceu – o Parnasianismo, Francisca Julia não só valoriza concepções clássicas tradicionais referentes à forma (metro, rima e ritmo), como também, resgata os temas mitológicos, uma vez que faz uma descrição nítida da imagem das centauras: ora as descreve ferozes e guerreiras ora esbeltas, atraentes e livres, enfatizando a dualidade representada por este ser mítico.
     Em Os Argonautas, percebe-se a abordagem de aspectos externos, em detrimentode fatores  internos. Para tanto, a autora, em seus versos, lança mão de falas que articulam cor, aspectos terrestres [relevo] e movimento. Tal postura evidencia não só a questão da impassibilidade [a não inclusão e não envolvimento do autor no tratamento dados aos fatos e à realidade], como também reflete a tendência dos parnasianos de descrever cenas, lançando mão da descrição por meio de aspectos sensoriais e visuais. Dito de outra forma, o jogo de palavras que a autora se utiliza faz com que o leitor, durante o ato da leitura, o remeta às imagens descritas, valorizando, assim, a visão e a sensação.
OS ARGONAUTAS
Mar fora, ei-los que vão, cheios de ardor insano;
Os astros e o luar — amigas sentinelas —
Lançam bênçãos de cima às largas caravelas
Que rasgam fortemente a vastidão do oceano.

Ei-los que vão buscar noutras paragens belas
Infi ndos cabedais de algum tesouro arcano...
E o vento austral que passa, em cóleras, ufano,
Faz palpitar o bojo às retesadas velas.

Novos céus querem ver, mirífi cas belezas,
Querem também possuir tesouros e riquezas
Como essas naus, que têm galhardetes e mastros...

Ateiam-lhes a febre essas minas supostas...
E, olhos fi tos no vácuo, imploram, de mãos postas,
A áurea bênção dos céus e a proteção dos astros...
CARACTERISTICAS TEMÁTICO-ESTILÍSTICAS DO SIMBOLISMO
   Todavia, tal autora não se restringe ao Parnasianismo, articulando, assim, característicastemático-literárias da Parnasianismo e do Simbolismo simultaneamente.
   Isto é, a autora em tela lança mão de uma dualidade, pertencendo a uma corrente literária [Parnasianismo], mas também compartilha de pressupostos temáticos e estilísticos de ou vertente que, até então, se contrapunham. Na visão de Coêlho et al. (2008), o Simbolismo possui uma relação de articulação com o Romantismo, na medida em que ambas se voltam para a subjetividade e para o sentir. Contudo, o subjetivismo da Corrente Simbolista não está diretamente ligado aos aspectos emocionais, mas ao subconsciente. O que é reforçado por Moisés (1969, p. 32 apud Côelho, 2008, p. 3), que diz que “na verdade, o Simbolismo apenas prolongou e
enriqueceu a herança romântica que a intelectualidade realista pretendeu postergar.”
   Surge, agora, uma perspectiva pautada na junção de fatores que articula linguagem e pensamento, mais especificamente, a linguagem enquanto recurso de expressão dos aspectos relativos à mente humana. O que está em sintonia com Côelho et al. (2008, p. 4), “busca-se uma linguagem capaz de expressar estados psicológicos mais profundos”.
   Lançaram-se no encalço de uma nova linguagem fundamentada numa gramática psicológica, numa sintaxe psicológica, e num léxico adequado à expressão das novidades estéticas, pela recorrência a neologismos, inesperadas combinações vocabulares, emprego de arcaísmos e ainda de recursos gráficos de vária ordem (uso das maiúsculas, das cores na impressão de poemas ou de partes de livros, do y em lugar do i, etc.). (MOISÉS, 1969, p. 35 apud CÔELHO, 2008, p. 5).
   Partindo desse pressuposto, percebe-se que o Simbolismo ocasiona uma mudança de paradigma, isto é, uma mudança de postura, uma vez que deixa de focar, predominantemente, na forma e prima pela questões psicológicas e existenciais. Para isso, os Simbolista lançam mão de diversas estratégias linguísticas, que englobam desde o jogo de palavras até o uso de signos linguísticos que remetem a pensamentos e a cenas. Ainda sob o respaldo das contribuições teóricas de Côelho et al. (2008), essa corrente, em alguns casos, se utiliza de um vocabulário abstrato, o que reduz a signifi cação literal de uma determinada palavra em um dado contexto e, por conseguinte, remete o leitor a aspectos visuais e sensoriais imprecisos (CÔELHO et al., 2008). Em outras palavras, uma linguagem que nem sempre fala de forma clara, mas que leva o leitor a pensar e a refl etir acerca do que é dito. Contudo, essa adesão aos pressupostos do Simbolismo não se limita às questões referentes à estilística da composição do texto literário, mas também abrange à questão temática. Diante dessa perspectiva, será comum nas obras [que se voltam para a tendência Simbolista] de Francisca Julia a abordagem de temáticas, como: Aspectos internos e mentais da espécie humana,
Alma, Corpo [sobretudo o confronto e dicotomia entre esses dois últimos fatores], Moral [aspectos moralizantes], morte, sonoridade etc.., conforme sinaliza Andrade (1987). Algumas dessas características podem ser percebidas/ vistas no texto abaixo:
À SANTA TEREZA
Reza de manso... Toda de roxo,
A vista no teto presa,
Como que imita a tristeza
Daquele círio tremulo e frouxo...
E assim, mostrando todo o desgosto
Que sobre sua alma pesa,
Ela reza, reza, reza,
As mãos erguidas, pálido o rosto...
O rosto pálido, as mãos erguidas,
O olhar choroso e profundo...
Parece estar no Outro-Mundo
De outros mistérios e de outras vidas.
Implora a Cristo, seu Casto Esposo,
Numa prece ou num transporte,
O termo fi nal da Morte,
Para descanso, para repouso...
[...]
Reza de manso, reza de manso,
Implorando ao Casto Esposo
A morte, para repouso,
Para sossego, para descanso
D'alma e do corpo que se consomem,
Num desânimo profundo,
Ante as misérias do Mundo,
Ante as misérias tão baixas do Homem !
Quanta tristeza, quanto desgosto,
Mostra na alma aberta e franca,
Quando fica, branca, branca,
As mãos erguidas, pálido o rosto...
O rosto pálido, as mãos erguidas,
O olhar choroso e profundo,
Parece estar no Outro-Mundo
De outros mistérios e de outras vidas...
   Nesse texto, percebe-se que a autora volta-se para uma perspectiva de cunho/teor místico e sobrenatural [vida após a morte]. Com base nesse enfoque dado ao texto literário, ela retrata a crise de existência e a reflexão humana diante da morte [mais especificamente, a “impotência diante da morte” (CÔELHO et al., 2008, p. 6), os estados mentais e os sentimentos que permeiam o consciente humano neste momento que é a passagem para o outro mundo [como é o caso da tristeza e do desgosto], a oposição entre o corpo e a alma. Diante dessa acepção, percebe-se uma
forte perspectiva psicológica. Para realizar tal faceta, ela lança mão de uma linguagem mque articula os signos e o pensamento, com o propósito de remeter à cena exposta no corpo do texto [aspectos e sensações visuais]. Com isso, “Francisca Julia supera a descrição objetiva parnasiana da morte, já que a delineia pelo viés do irracional, do simbólico e do subconsciente humano” (COÊLHO et al., 2008, p. 8). Todavia, não se pode deixar de destacar que, em diversos casos, a autora lança mão de jogos de palavra a fim de levar o leitor a refletir acerca do que é dito. Isto é, nem sempre sua linguagem é clara e direta, o que leva o leitor a compreender/ perceber de imediato aquilo que é expresso em seu dizer.
  Um outro aspecto que não poderia deixar de ser destacado neste texto diz respeito ao fato de essa autora ter produzido uma obra voltada para o público infantil, o Livro da Infância [contos e versos] e Alma Infantil. A primeira obra foi adotada pelo Governo do Estado de São Paulo para ser utilizada no universo escolar. No entanto, ambas conseguem obter grande destaque nas escolas do Estado de São Paulo. O que reflete os subsídios dessa autora para a produção literária voltada para público infantil, ou também, Literatura Infantil. Aspecto este que não era muito comum na época.
   Diante dos aspectos expostos até o presente momento, percebe-se que Francisca Julia se volta para a Versatilidade. Essa é a palavra que pode definir, ilustrar e refletir o conjunto de obras dessa autora. Ela articula duas formas distintas de escrita e de composição do texto literário. A primeira que se volta uma perspectiva formal, que tem como objetivo alcançar a perfeição estrutural, a partir da rigidez da forma, do distanciamento do autor no tratamento dado à realidade, da contenção dos aspectos emocionais e da ênfase na linguagem culta [tradicional]. A segunda, por sua vez, se volta para uma perspectiva oposta à anterior que não se prende, exclusivamente, à forma, mas é construída por meio de aspectos subjetivos, evidenciando, assim, um forte viés psicológico. Todos esses elemento refletem a aproximação essas escolas literária antagônicas e, sobretudo, a dualidade na escrita da autora em tela, tanto do ponto de vista temático, quanto estilístico.
   Nessa conjectura, percebe-se que Francisca Julia trabalha em uma perspectiva de junção de fatores, o que pode demonstrar o fato que as escolas, em geral, tentam romper com aspectos provenientes/ oriundos de vertentes literárias a elas, mas não conseguem romper totalmente. Isso pode ser percebido na escrita dessa autora, na medida em que estando fi liada/ vinculada à corrente Parnasiana [que se opunha veemente ao Romantismo], ela adere a alguns aspectos da vertente Romântica.
FRANCISCA JULIA E O ESQUECIMENTO: ECOS DO MODERNISMO
    Diante do estudo das contribuições da autora em questão [ainda que seu quantitativo de obras seja pequeno], surge uma indagação. Por qual motivo uma autora tão elogiada [em alguns casos, por autores que compõem a literatura canônicada escola parnasiana, conforme trechos das falas proferidas pelos autores abaixo], chegando até a receber homenagens póstumas, não é abordada na maior parte dos Livros Didáticos de Literatura, como também é objeto de estudo e investigação
de uma pequena quantidade pesquisadores? Essa afi rmativa surge a partir de uma pesquisa realizada em sites de busca, tais como, Google, Alta Vista etc..
   Nesses sites, em geral, consta um grande quantitativo de poemas da autora em tela. Contudo, há uma pequena diversidade de produções acadêmicas que voltamseu olhar para essa autora tão aclamada em sua época. Dito de outra maneira, há uma pequena diversidade de obras que se voltam a abordar sua história cronológica.
    Porém, poucas se dedicam a um estudo aprofundado acerca de sua produção temático-estilístico e, acima de tudo, acerca da perspectiva de esquecimento a que foi alçada tal autora [objeto de estudo deste tópico]. Com isso, deixa-se de lado uma grande diversidade de autores e, sobretudo, elementos extremamente relevantes da história sócio-cultural da literatura.
   Em Francisca Júlia supreendeu-me o respeito da língua portuguesa, — não que ela transporte para a sua estrofe brasileira a dura construção clássica: mas a língua doce de Camões, trabalhada pela pena dessa meridional, — que traz para a arte escrita todas as suas delicadezas de mulher, toda a sua faceirice de moça, nada perde da sua pureza fidalga de linhas. O português de Francisca Júlia é o mesmo antigo português, remoçado por um banho maravilhoso de novidade
e frescura. (Olavo Bilac).
   Nem aqui, nem no sul nem no norte, onde agora floresce uma escola literária, encontro um nome que se possa opor ao de Francisca Júlia. Todos lhe são positivamente inferiores no estro, na composição e fatura do verso, nenhum possui em tal grau o talento de reproduzir as belezas clássicas com essa fria severidade de forma e de epítetos que Heredia e Leconde deram o exemplo na literatura francesa. (João Ribeiro).
   Nenhuma pena manejada por mão feminina, seja qual for o período que remontemos, jamais esculpiu, em nossa língua, versos que atinjam a perfeição sem par e a beleza estonteante dos concebidos pelo raro gênio da peregrina artista. (Aristeu Seixas).
   Leandro e Joanilho (2006) abordam, em uma perspectiva geral, o fato de inúmeros autores prestigiados intelectualmente, em sua época, mas que, após sua morte foram alçados ao ostracismo. Os estudos literários, em geral, têm como foco os grandes autores das escolas literárias [representantes mais célebres, eminentes e renomados], deixando de lado, autores concebidos como minoritários. É nessecontexto que surgem dois grupos que se contrapõem. No dizer Leandro Joanilho (2006, p. 1084), “foram classifi cados em grupos distintos: os que permaneceramimortalizados por suas obras, e os que “despontaram para o anonimato”, ou, “autores-poetas” que foram esquecidos e não entraram para os cânones literários”.
   Partindo desse pressuposto, a produção literária brasileira poderia ser classifi cada em duas vertentes. A primeira engloba os autores eternizados, sendo, assim, imortalizados em face de suas produções. A segunda abrange os que foram alçados à condição minoritária e, em virtude disso, foram conduzidos à condição de esquecidos nas páginas da trajetória histórico-social da Literatura Brasileira (LEANDRO; JOANILHO, 2006).
   As antologias literárias brasileiras e os livros didático-literários em sua maioria se propõem a estudar apenas períodos de “glamour” da Literatura, dos quais poetas como Álvares de Azevedo, Rui Barbosa e Machado de Assis fazem parte, ou seja, excluem uma boa parcela de produção literária, deixando historicamente um grande vazio, como se, entre Álvares de Azevedo e Machado de Assis, por exemplo, fosse um período infértil, com ausência de produções literárias.
   Por esse motivo criou-se uma distância entre esse período de “glamour” e o período de esquecimento. Os grandes autoresdestacaram-se no cenário paulista e ganharam o país, outros,
ficaram restritos aos saraus e com encontros em casarões da época. (LEANDRO; JOANILHO, 2006, p. 1086).
   Em virtude de gozarem de maior prestigio social nas escolas literária em que se enquadram, diversos autores foram eternizados nas paginas literárias brasileiras.
   Por outro lado, outros foram alçados ao esquecimento. Isso, em termos de pesquisas acadêmicas e de manuais didáticos escolares. Em muitos casos, os Livros Didáticos de Literatura se voltam para a abordagem dos autores canônicos, em detrimento de uma gama de outros autores que contribuíram substancialmente para a evolução histórico-social da Literatura Brasileira. Dentre esses autores, está Francisca Julia.
   Uma autora que fora aclamada, reconhecida, inclusive, por autores como compõem a tríade canônica do Parnasianismo, isto é, que compunham os escritores mais prestigiados dessa escola literária.
   Um dos poucos autores que se debruça sobre a temática da produção literária de Francisca Julia, Ramos (2011) atribui esse esquecimento aos pressupostos trazidos pelo Modernismo. Para esse autor, os ideais veiculados pela Semana de 1922 que não só põem em xeque diversos pressupostos da corrente Parnasiana, mas também estimula o desinteresse por parte da crítica literária e, sobretudo, estimula o desinteresse dos autores de manuais didáticos na abordagem de diversos aspectos relativos à vertente parnasiana. O que, por sua vez, extingue a abordagem da construção social da produção literária brasileira, como, por exemplo, a trajetória da autora em foco. Nessa ótica, essa postura não surge do nada, mas se dá em função dos pressupostos da escola moderna, conforme as palavras proferidas por Ramos (2011, p. 1),
   Uma das maiores responsabilidades pelo esquecimento de tão perfeita e importante obra como a de Francisca Júlia é o que, ousadamente e correndo o risco de ser grosseiro, eu chamaria de: "O ai dos vencidos". Com a revolução da semana de 1922, patenteia o movimento modernista em constituir-se como novo cânone literário brasileiro. Estética de reação, o modernismo, extremamente panfletário, vitorioso reformulou ou erradicou diversos dos paradigmas que o parnasianismo estabelecera ou perpetuara. Tal fato, a meu ver, originou dois problemas para os estudos literários: a) a crítica literária pouco se dedica ao tema; fazendo-o, revela (quase sempre) pouca profundidade em suas análises; b) em decorrência, os autores de livros didáticos reproduzem o desinteresse acadêmico e o preconceito modernista, gerando um público discente que olha para o Parnasianismo já conformado pelo discurso dos modernistas. Estabelece-se aí um círculo vicioso em que parte importante da trajetória literária brasileira é legada ao esquecimento. Esquecimento danoso, porque compromete a amplitude reflexiva sobre o processo literário nacional e deixam nas sombras figuras como Francisca Júlia.
   Diante dessa perspectiva, Ramos (2011) atribui à escola Moderna grande parte desse esquecimento que permeia a produção de Francisca Julia. Eclodia, assim, um “espírito de rompimento com as fórmulas do passado” (FARACO; MOURA, 1983, p. 63). Ao aderir aos ideais das tendências dos anos 20, que preconizavam o redimensionamento/ reestruturação das ideias e, em especial, das artes [uma “ruptura com a arte tradicional” (FARACO; MOURA, 1983, p. 63)], muitos autores deixam se lado as produções da vertente parnasiana. Pretendia-se, assim, voltar o olhar literário para o Brasil, na medida em que, em diversas produções brasileiras, ocorria uma estética “copiada” de produções internacionais, sobretudo, as francesas. Nessa dimensão, ocorre uma quebra de paradigmas, ou também, uma mudança de perspectiva na produção literária, atentando e refletindo acercada realidade brasileira.
   Para atender ao seu desejo de modernizar o Brasil, os artistas rompem com as formas de expressão já gastas, não só produzindo obras com novas técnicas, como também atacando abertamente os artistas do passado, sobretudo, os parnasianos. (FARACO; MOURA, 1983, p. 63).
  Partindo dessa acepção, ávidos por novas propostas de condução da produção e composição do texto literário, os adeptos dessa nova corrente rompem com os paradigmas e pressupostos postos anteriormente por outras escolas literárias. Tal postura pode ser evidenciada, acima de tudo, no que concerne à Vertente Parnasiana.
   Um dos aspectos mais focalizados nessas críticas que eram tecidas por essas novas tendências literárias diz respeito à utilização da linguagem durante o decorrer da composição do texto literário. Em alguns casos propondo a refacção e a reescrita de textos de escolas anteriores, conforme ressaltam Faraco e Moura (1983).
   Não se deve imaginar que havia tendências homogêneas: vários pontos de vista por vezes entraram em choque. Mas  havia um consenso: todos eram contra a tradição; todos propunham    uma nova linguagem para expressar a realidade brasileira. Uma linguagem que fosse nossa e, ao mesmo tempo, universal. (FARACO; MOURA, 1983, p. 64).
   Sendo assim, percebe-se que esses novos postulados literários da década de 20 se contrapunham, principalmente, à linguagem culta [canônica e sacralizada] que era estabelecida por pressupostos postos anteriormente. Ou seja, “uma língua que, até certo ponto, sufocava a expressão genuína dos escritores brasileiros” (FARACO; MOURA, 1983, p. 65). Com isso, pretendia-se alcançar “uma língua livre, que permitisse a aproximação maior entre o português literário e a fala coloquial brasileira”
(FARACO; MOURA, 1983, p. 65). Surge, assim, uma alteração de paradigmas e mudança de perspectiva na composição do texto literário. É nesse cenário que se dá a oposição ao Parnasianismo e, consequentemente, à produção dos autores adeptos dessa corrente literária. Dito de outra maneira, em face de grande parte da obra de Francisca Julia compor essa tradição proveniente da escola parnasiana a que se contrapunham os adeptos do Modernismo, sua produção é atingida por esse preconceito, o que, conseguintemente, contribui, de certa forma, para o esquecimento das contribuições dessa autora (RAMOS, 2011).
METODOLOGIA
    Conforme mencionado anteriormente, este texto tem como objetivo transcender a perspectiva que norteia a maior parte das obras publicadas sobre Francisca Julia, nas quais ocorre uma tradicional ênfase dada à história cronológica dessa autora. Em consequência disso, deixa-se de lado não só a reflexão acerca das características temático-estilísticas e literárias de sua obra , mas, sobretudo, esquece-se de abordar o motivo pelo qual ela foi alçada à condição de capítulo esquecido nos Livros Didáticos de Literatura. Chegando, muitas vezes, a não ser aborda ou, então, sua abordagem restringe-se a pequenos comentários na parte do capítulos que menciona Outros Autores da Escola Parnasiana. O que, por conseguinte, elenca à Francisca Julia o papel de autor minoritário, já que apresenta-se primeiramente os autores canônicos da vertente parnasiana e, em seguida, os Outros Autores. Categoria na qual ela está inserida
   Para tanto, foi realizado, primeiramente, explanação das características temático-estilísticas e composicionais de ambas as escolas. Em seguida, a abordagem dos aspectos relativos ao tema e às características estruturais dos textos dessa autora.
   E, após isso, a análise de alguns poemas da autora em foco, a fim de identificar/perceber os reflexos oriundos dessas duas vertentes literárias. Por último, o trabalho focou na questão do esquecimento dessa autora renomada, em sua época, mas que foi alçada à condição de página esquecida na história da Literatura Brasileira. O que, por sua vez, contribuiu de forma significativa para que esta fosse arredada/ erradicada dos estudos literários e, por conseguinte, dos Livros Didáticos de Literatura e da metodologia de ensino dessa disciplina [na maior parte das vezes].
CONSIDERAÇÕES FINAIS
    Longe de ser mais um relato acerca da historia cronológica da vida de Francisca Julia da Silva, este texto objetivou ir além disso. Em função disso, focou naversatilidade, ou melhor, na perspectiva de junção de fatores adotada por essa autora, desconstruindo, assim, a visão de que duas escolas literárias trabalham sempre contrapondo-se. O que evidencia o fato de as vertentes literárias, apesar de se opor a alguns pressupostos das escolas anteriores, há articulam autores que articulam
características concernentes à temática e ao estilo. Não se pode deixar de sinalizar que a composição do texto literário muda em relação às correntes literárias. No entanto, essas mudanças e alterações que ocorrem na escrita literária não podem ser encaradas e percebidas como melhora, mas como evolução. Primou-se, assim, pela abordagem da reflexão acerca das contribuições dessa autora em face da evolução da trajetória histórico-social da literatura brasileira.
   Sendo assim, percebe-se, diante dos estudos realizados e dos aspectos abordados neste trabalhos, que é inegável a contribuição da produção literária de Francisca Julia para a evolução da trajetória histórico-social da Literatura Brasileira.
   Isso não só do ponto de vista temático-estilístico, mas, sobretudo, do ponto do vista na alteração da função e do papel social da mulher no que tange à composição do texto literário. A obra de Francisca Julia representa um salto nas condições sócio-históricas da mulher, na medida em que ocorre uma quebra de paradigmas na função social da mulher, ainda que incipiente. Mas que se intensifi cou, continuamente, ao longo dos anos. Em outras palavras, a obra dessa autora reflete a
contribuição feminina no campo literário, o que propicia a inserção da mulher no âmbito literário.
   Apesar de ter caído no esquecimento em função de diversos fatores, assim como outros autores e autoras, é de fundamental importância que seu legado cultural seja estudado e, acima de tudo, divulgado. A partir desse ato, é possível contemplar  as mais diversas formas que o homem [espécie masculina e, em especial, a feminina] agem na construção social da Literatura no Brasil. Nesse sentido, não se pode apagar dos postulados literários brasileiros as relevantes contribuições dessa autora, alçando, assim, seu legado cultural e literário a um capítulo esquecido da Literatuyra Brasileira.

FRANCISCA JULIA E A INSERÇÃO DA MULHER NO CAMPO ...
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