Não tive filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado de nossa miséria.
A vida sem luta é um mar morto no centro do organismo universal.
Botas...as botas apertadas são uma das maiores venturas da terra, porque,
fazendo doer os pés, dão azo ao prazer de as descalçar.
Cada qual sabe amar a seu modo; o modo, pouco importa; o essencial é que
saiba amar.
Creia em si, mas não duvide sempre dos outros.
Deus, para a felicidade do homem, inventou a fé e o amor. O Diabo,
invejoso, fez o homem confundir fé com religião e amor com casamento.
Lágrimas não são argumentos.
Não é amigo aquele que alardeia a amizade: é traficante; a amizade
sente-se, não se diz.
Não levante a espada sobre a cabeça de quem te pediu perdão.
Não se ama duas vezes a mesma mulher.
O acaso... é um Deus e um diabo ao mesmo tempo.
O dinheiro não traz felicidade — para quem não sabe o que fazer com ele.
Suporta-se com paciência a cólica dos outros.
Está morto: podemos elogiá-lo à vontade.
Pensamentos valem e vivem pela observação exata ou nova, pela reflexão
aguda ou profunda; não menos querem a originalidade, a simplicidade e a graça
do dizer.
A melhor definição de amor não vale um beijo de moça namorada.
A vida é cheia de obrigações que a gente cumpre por mais vontade que tenha
de as infringir deslavadamente.
A mentira é muita vezes tão involuntária como a respiração.
A moral é uma, os pecados são diferentes.
Esquecer é uma necessidade. A vida é uma lousa, em que o destino, para
escrever um novo caso, precisa de apagar o caso escrito.
Eu sinto a nostalgia da imoralidade.
Eu não sou homem que recuse elogios. Amo-os; eles fazem bem à alma e até ao
corpo. As melhores digestões da minha vida são as dos jantares em que sou
brindado.
Não te irrites se te pagarem mal um benefício; antes cair das nuvens que de
um terceiro andar.
Há coisas que melhor se dizem calando.
Para as rosas, escreveu alguém, o jardineiro é eterno.
Machado de Assis -
Pensador - pensador.uol.com.br
RESUMO DE ALGUMAS OBRAS DE MACHADO
DE ASSIS
A CARTOMANTE
A cartomante é a
historia de Vilela, Camilo e Rita envolvidos em um triângulo amoroso. A
historia começa numa Sexta-feira de novembro de 1869 com um dialogo entre
Camilo e Rita. Camilo nega-se veementemente a acreditar na cartomante e sempre
desaconselha Rita de maneira jocosa.
A cartomante está
caracterizada neste conto como uma charlatã, destas que falam tudo o que serve
para todo mundo. É um personagem sinistro, que apesar não ter nem o seu nome
revelado (característica machadiana), destaca-se como um personagem que
ludibria os personagens principais.
Rita crê que a
cartomante pode resolver todos os seus problemas e angústias. Camilo já no fim
do conto, quando está prestes a ter desmascarado seu caso com Rita, no ápice de
seu desespero, recorre a esta mesma cartomante, que por sua vez o ilude da
mesma forma como ilude todos os seus clientes, inclusive Rita.
A mulher usa de
frases de efeito e metáforas a fim de parecer sábia e dona do destino de
Camilo, este que sai de lá confiante em suas palavras e ao chegar no
apartamento de Vilela encontra Rita morta e é morto a queima roupa pelo amigo
de infância, que já está sabendo da traição da esposa e o esperava de arma em
punho.
A MÃO E A LUVA
Narra a história de
Guiomar, moça altiva e segura de si, que procura, com frieza e calculismo,
realizar o ambicioso plano de ascender socialmente, compensando a sua modesta
origem. Três homens pretendem a mão de Guiomar: Estevão , Jorge e Luis Alves. O
primeiro sincero, porém simplório; o segundo indolente e superficial. Luis
Alves, ambicioso e sagaz, acaba sendo o eleito, pois personificava as
qualidades que se sintonizavam com o espírito de Guiomar, que, ao escolhê-lo,
faz, segundo suas próprias palavras, " a fria eleição do espírito ".
O fragmento que transcrevemos ilustra o caráter do casal GUIOMAR/LUIS ALVES e
oferece a justificativa do título: " Um mês depois de casados, como eles
estivessem a conversar do que conversam os recém-casados, que é de si mesmos ,
e a relembrar a curta campanha do namoro.
Guiomar confessou ao
marido que naquela ocasião lhe conhecera todo o poder de sua vontade. - Vi que
você era homem resoluto, disse a moça a Luis Alves, que assentado, a escutava.
- Resoluto e ambicioso, ampliou Luiz Alves sorrindo: você deve ter percebido
que sou uma e outra cousa. - A ambição não é defeito. - Pelo contrário, é
virtude; eu sinto que a tenho, e que hei de fazê-la vingar. Não me fio só na
mocidade e na força moral: fio-me também em você, que há de ser para mim uma
força nova. - Oh! Sim! Exclamou Guiomar. E com um modo gracioso continuou: -
Mas que me dá você em paga? Um lugar na câmara? Uma pasta de ministro? - O
lustre do meu nome, respondeu ela. Guiomar, que estava de pé defronte dele, com
as mãos presas nas suas, deixou-se cair lentamente sobre os joelhos do marido ,
e as duas ambições trocaram o ósculo fraternal. Ajustavam-se ambas, como se
aquela luva tivesse sido feita para aquela mão.
HELENA
A história de uma
moça que, de uma forma inesperada, sobe na escala social: morre o Conselheiro
Vale e, no seu testamento, consta que Helena, moça internada num colégio de
Botafogo, é sua filha, cujo segredo o conselheiro o mantivera até a morte.
Helena passa a viver com Úrsula, irmã do conselheiro, Estácio, agora
meio-irmão, Dr. Camargo, amigo de Vale e médico da família, e Eugênia, filha do
Dr. Camargo.
Helena em face de
seu temperamento expansivo e comunicativo, conquista a afeição de D. Úrsula e
de Estácio. Mendonça, amigo de Estácio, apaixona-se pela moça. Helena passa a
ser objeto de afeição do próprio irmão, que, no entanto, está noivo de Eugênia.
O padre Melchior, guia espiritual da família, suspeita dos freqüentes encontros
entre Helena e Salvador.
O mistério é
esclarecido: Salvador é o pai de Helena, que fora arrebatada pelo conselheiro,-
encarregando-se de sua educação. Helena, profundamente chocada com o estado de
coisas, mesmo com a possibilidade de poder casar com Estácio, não agüenta a
emoção, adoece e morre.
HISTÓRIAS SEM DATA
A Igreja do Diabo (publicado no livro Histórias sem Data) é uma nova idéia do diabo:
fundar uma Igreja e organizar seu rebanho, tal qual Deus. Após comunicar Deus
de seu futuro ato, vai à Terra e funda com muito sucesso uma Igreja que
idolatra os defeitos humanos. Mas aos poucos os homens vão secretamente
exercitando virtudes, Furioso, o Diabo vai falar com Deus, que lhe aponta que
aquilo faz parte da eterna contradição humana. Anedota Pecuniária (publicado no
livro Histórias sem Data) é uma pequena crítica a ganância. Nela um homem
"vende" suas sobrinhas aos homens que as amam por causa de sua
fascinação com o dinheiro.
Capítulo dos Chapéus (publicado no livro Histórias sem Data) é um conto onde aparece a
frivolidade e ostentação da época de Machado. Mariana, após pedir ao marido que
troque o seu simples chapéu, testemunha a sociedade (na famosa rua do Ouvidor)
e acaba pedindo que ele permaneça com seu chapéu. Fulano (publicado no livro
Histórias sem Data) Beltrão é um homem que vai aos poucos se tornando mais um
homem público que privado após receber elogios públicos e acaba deixando seu
dinheiro para a posteridade e não a família. Galeria Póstuma (publicado no
livro Histórias sem Data) é uma crítica a hipocrisia, onde o sobrinho de um
falecido recente lê em seu diário as verdadeiras opiniões do tio sobre aqueles
que o cercavam em vida, incluindo o rapaz.
Singular Ocorrência (publicado no livro Histórias sem data) é o relato de um homem a um
amigo sobre o caso extraconjugal de outro amigo. Ele conta que esse amigo e a
amante eram apaixonados (ela abandonou a difícil vida fácil por ele) e que,
numa única vez, o traiu. E foi este caso que gerou um grande turbilhão
emocional que quase acabou no rompimento e suicídio dela, mas eles por fim se
reconciliam e vivem felizes até que ele muda de província e morre antes de
voltar.
Último Capítulo
(publicado no livro Histórias sem data) é o bilhete de um suicida. Azarado a
vida toda (ele literalmente caiu de costas e quebrou o nariz), sua vida foi
povoada de desgraças. Quando estava inventariando os bens da esposa morta,
achou cartas de amor de seu sócio. Decidiu matar-se e deixar em seu testamento
a cláusula que deveriam ser comprados sapatos e distribuídos, já que vira um
pobre coitado (mais que ele) feliz a contemplar seus calçados.
IAIÁ GARCIA
Iaiá era filha de
Luís Garcia, viúvo e funcionário público, que nela concentrava todos os seus
afetos. Quando a história principia, ele está com quarenta e um anos, e Iaiá
com onze anos estuda em colégio interno e, nos fins de semana, é a fonte de
toda a alegria do pai, em cuja casa reina a solidão. Luís Garcia tem uma amiga,
também viúva, Valéria Gomes, mãe de Jorge. Jorge está apaixonado pela filha de
um ex-empregado de seu falecido pai, Estela, que vive na mesma casa.
Para afastá-lo de
Estela, por não julgar digna de sua posição social, a mãe força-o a alistar-se
como voluntário para lutar na guerra do Paraguai. Mas Jorge não esquece a sua
amada e tem um verdadeiro choque ao saber que ela se casara com Luís Garcia,
que isso foi levado, entre outras razões, pelas boas relações entre Estela e
sua filha Iaiá. A partir daí, a história evolui ao longo do tempo, com o
regresso de Jorge, sua mãe já morta, a influência do novo amigo que fizera no
Paraguai, encontros e desencontros, risos e lágrimas, até a morte de Luís
Garcia. E Jorge acaba-se por se casra com Iaiá.
CONTOS
A Cartomante:
Narra a história de Camilo, Vilela e Rita. Os dois primeiros eram melhores
amigos; a segunda era esposa do segundo e amante do primeiro. Quando Camilo
começa receber denúncias anônimas, diminui a freqüência das visitas ao amigo.
Preocupada, Rita visita uma cartomante, fato que faz Camilo rir. Quando Vilela
chama Camilo a sua casa ele vai preocupado, e passa antes na cartomante
pensando que não tem nada a perder. Ela lhe assegura que nada vai dar errado e
ele chega despreocupado a casa de Vilela, onde encontra Rita morta. Vilela
então o mata. A Causa Secreta Fala de dois homens que, após um salvar a vida do
outro e passar-se algum tempo, tornam-se sócios. Mas pouco a pouco um deles vai
demonstrando tendências sádicas, torturando animais, fato que atordoa a esposa.
Quando ela morre, Fortunato, o sádico, presencia o amigo beijar a testa da
mulher e derreter-se em choro, saboreando o momento de dor do amigo que lhe
traía. A Igreja do Diabo É uma nova idéia do diabo: fundar uma Igreja e
organizar seu rebanho, tal qual Deus. Após comunicar Deus de seu futuro ato,
vai à Terra e funda com muito sucesso uma Igreja que idolatra os defeitos
humanos. Mas aos poucos os homens vão secretamente exercitando virtudes,
Furioso, o Diabo vai falar com Deus, que lhe aponta que aquilo faz parte da
eterna contradição humana. Anedota Pecuniária É uma pequena crítica a ganância.
Nela um homem "vende" suas sobrinhas aos homens que as amam por causa
de sua fascinação com o dinheiro.
A Sereníssima República :É uma crítica ao processo eleitoral, feito como um
discurso de um cônego que afirma ter achado uma espécie de aranha que fala e
criado uma sociedade delas, uma república chamada Sereníssima República. Ele
escolhe como sistema de eleição um baseado no da República de Veneza, onde
retirava-se bolas de um saco com o nome dos eleitos. Este sistema vai sendo
fraudado pelas aranhas, corrigindo-se, adaptando-se e variando-se diversas
vezes e de diversos modos, eternamente corrupto. Capítulo dos Chapéus É um
conto onde aparece a frivolidade e ostentação da época de Machado. Mariana,
após pedir ao marido que troque o seu simples chapéu, testemunha a sociedade
(na famosa rua do Ouvidor) e acaba pedindo que ele permaneça com seu chapéu. D.
Paula Conta sobre um casal que realiza uma separação temporária por ciúmes, com
fundos, do marido. O caso é mediado pela tia da esposa, Dona Paula, que quando
descobre quem é o outro, fica abalada. É o filho do homem com quem teve caso
análogo, fato que deixa seus sentimentos bem abalados em relação ao caso.
Fulano Beltrão é um homem que vai aos poucos se tornando mais um homem público
que privado após receber elogios públicos e acaba deixando seu dinheiro para a
posteridade e não a família. O Espelho Conta sobre um homem falando de sua
opinião sobre a alma humana num grupo de amigos que realizam discussões
metafísicas. Ele descreve uma situação de sua juventude onde, após ter sido
engrandecido pelo recém-conquistado posto de alferes, encontra-se sozinho.
Solitário, passa a ter medo até a que um dia veste-se com seu uniforme de
alferes e encara o espelho, encontrando assim o outro lado de sua alma (sua
opinião é que temos duas almas, uma externa que nos vigia e a nossa que vigia o
exterior). Isso retira-o da solidão. Portanto, este conto envidencia o conflito
entre a essência (a alma interior) e a aparência (alma exterior).
Teoria do Medalhão: É um pai aconselhando um filho no dia de seus 21 anos. Ele lhe diz
que um futuro lhe espera, que pode ter várias carreiras diferentes, mas que
devia ter uma de resguardo, preferencialmente a de medalhão. Para isto devia
ter pouquíssimo conhecimento, originalidade, ironia, gosto ou qualquer idéia
própria. E nisso disserta sobre a necessidade do filho de sempre manter-se
neutro, usar e abusar de palavras sem sentido, conhecer pouco, ter vocabulário
limitado, etc. Ao final, é uma bela ironia machadiana sobre como encontram-se
os valores da sociedade de sua época.
O Enfermeiro:
Conta sobre um homem que, a beira da morte, conta um caso de seu passado. Ele
foi em 1860 ser enfermeiro de um velho e mau coronel, que acaba esganando
alguns dias antes de partir por não mais o suportar. Quando abre-se o
testamento ele é declarado herdeiro universal e distribui lentamente o dinheiro
em esmolas. Enquanto isto se passa, vai lentamente se convencendo de sua
inocência, apoiado pela sociedade que odiava o velho e suas ações que considera
redentoras.
Pai Contra Mãe: Cândido Neves, caçador de escravos fujões. Não o é
por opção, apenas o é porque não agüenta qualquer outro emprego. Casa e passa a
adquirir dívidas, com clientela cada vez menor; quando engravida a mulher, as
dívidas aumentam. Depois de despejados vão morar em um quarto emprestado e o
menino nasce. Após ceder às pressões da tia da esposa, Candinho vai por a
criança na Roda dos enjeitados. Mas no caminho captura uma escrava, recebendo
uma gorda recompensa, mantendo assim a criança. Mas a escrava estava grávida, e
provavelmente abortou com os castigos recebidos, ficando a vida do filho de
Candinho em troca da de outra.
Missa do Galo:Fala de uma singular conversa entre uma senhora de 30
anos e um jovem 17, que tinha que manter-se acordado para acordar o amigo para
irem à missa do galo. Eles conversam, ele apieda-se dela (o marido traía e ela
resignava-se), admira-a e distrai-se. Por fim o amigo lhe chama, já que já
havia passado da meia-noite e ele nunca mais tem outra conversa profunda com
ela.
MEMORIAL DE AIRES
Memorial de Aires, última obra de Machado de Assis, foi publicada em 1908,
mesmo ano da morte do escritor. Como Memórias Póstumas de Brás Cubas, esta obra
não tem propriamente um enredo: estrutura-se em forma de um diário escrito pelo
Conselheiro Aires (personagem que já aparecera em Esaú o Jacó), onde o narrador
relata, miudamente, sua vida de diplomata aposentado no Rio de Janeiro de 1888
e 1889. Sucedem-se, nas anotações do conselheiro, episódios envolvendo pessoas
de suas relações, leituras do seu tempo de diplomata e reflexões quanto aos
acontecimentos políticos. Destaca-se, dando uma certa unidade aos vários
fragmentos de que o livro é composto, a história de Tristão e Fidélia.
Fidélia, viúva moça e bonita, é grande amiga do casal Aguiar, uma espécie
de filha postiça de D. Carmo. Tristão, afilhado do mesmo casal, viajara para a
Europa, em menino, com os pais.
Visitando, agora, o Rio de Janeiro, dá muita alegria aos velhos padrinhos.
Tristão e Fidélia acabam por apaixonar-se e, depois de casados, seguem para a
Europa, deixando a saudade e a solidão como companheiros dos velhos Aguiar e D.
Carmo.
Memorial de Aires é apontado como o romance mais projetivo da personalidade
e da vida de Machado de Assis.
Escrito após a morte de Carolina, revela uma visão melancólica da velhice,
da solidão e do mundo. D. Carmo, esposa do velho Aguiar, seria a projeção da
própria esposa de Machado, já falecida. A ironia e o sarcasmo dos livros
anteriores são substituídos por um tom compassivo e melancólico, as personagens
são simples e bondosas, muito distantes dos paranóicos e psicóticos dos
romances anteriores. Alguns vêem no Memorial de Aires uma obra de retrocesso a
concepções romantizadas do mundo; outros tomam o romance como o testamento
literário e humano de Machado de Assis.
QUINCAS BORBA
A História gira em torno da vida de Rubião, amigo e enfermeiro particular
do filósofo Quincas Borba (maruja em "MP de BC"-1881). Quincas Borba
vivia em Barbacena e era muito rico, e ao morrer deixa ao amigo toda a sua
fortuna herdada de seu último parente.Trocando a pacata vida provinciana pela
agitação da corte, Rubião muda-se para o Rio de Janeiro, após a morte de seu
amigo, causado por infecção pulmonar.
Leva consigo o cão, também chamado de Quincas Borba, que pertencera ao
filósofo e do qual deveria cuidar sob a pena de perder a herança.Durante a
viagem de trem para o Rio de Janeiro, Rubião conhece o casal Sofia e Palha, que
logo percebem estar diante de um rico e engenuo provinciano.Atraído pela
amabilidade do casal e, sobretudo, pela beleza de Sofia, Rubião passa
freqüentar a casa deles, confiando cegamente no novo amigo.
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ANÁLISE
DE ALGUMAS OBRAS DE MACHADO DE ASSIS
MEMÓRIAS
PÓSTUMAS DE BRÁS CUBAS
Ao criar um narrador que resolve contar
sua vida depois de morto, Machado de Assis muda radicalmente o panorama da
literatura brasileira, além de expor de forma irônica os privilégios da elite
da época
Publicado em 1881, o livro aborda as
experiências de um filho abastado da elite brasileira do século XIX, Brás
Cubas. Começa pela sua morte, descreve a cena do enterro, dos delírios antes de
morrer, até retornar a sua infância, quando a narrativa segue de forma mais ou
menos linear – interrompida apenas por comentários digressivos do narrador.
Narrador
A narração é feita em primeira pessoa e
postumamente, ou seja, o narrador se autointitula um defunto-autor – um morto
que resolveu escrever suas memórias. Assim, temos toda uma vida contada por
alguém que não pertence mais ao mundo terrestre. Com esse procedimento, o
narrador consegue ficar além de nosso julgamento terreno e, desse modo, pode
contar as memórias da forma como melhor lhe convém.
Foco
narrativo
Com a narração em primeira pessoa, a
história é contada partindo de um relato do narrador-observador e protagonista,
que conduz o leitor tendo em vista sua visão de mundo, seus sentimentos e o que
pensa da vida. Dessa maneira, as memórias de Brás Cubas nos permitirão ter
acesso aos bastidores da sociedade carioca do século XIX.
Tempo
A obra é apoiada em dois tempos. Um é o
tempo psicológico, do autor além-túmulo, que, desse modo, pode contar sua vida
de maneira arbitrária, com digressões e manipulando os fatos à revelia, sem
seguir uma ordem temporal linear. A morte, por exemplo, é contada antes do
nascimento e dos fatos da vida.
No tempo cronológico, os acontecimentos
obedecem a uma ordem lógica: infância, adolescência, ida para Coimbra, volta ao
Brasil e morte. A estranheza da obra começa pelo título, que sugere as memórias
narradas por um defunto. O próprio narrador, no início do livro, ressalta sua
condição: trata-se de um defunto-autor, e não de um autor defunto. Isso
consiste em afirmar seus méritos não como os de um grande escritor que morreu,
mas de um morto que é capaz de escrever.
O pacto de verossimilhança sofre um
choque aqui, pois os leitores da época, acostumados com a linearidade das obras
(início, meio e fim), veem-se obrigados a situar-se nessa incomum situação.
Enredo
A infância de Brás Cubas, como a de
todo membro da sociedade patriarcal brasileira da época, é marcada por
privilégios e caprichos patrocinados pelos pais. O garoto tinha como
“brinquedo” de estimação o negrinho Prudêncio, que lhe servia de montaria e
para maus-tratos em geral. Na escola, Brás era amigo de traquinagem de Quincas
Borbas, que aparecerá no futuro defendendo o humanitismo, misto da teoria
darwinista com o borbismo: “Aos vencedores, as batatas”, ou seja: só os mais
fortes e aptos devem sobreviver.
Na juventude do protagonista, as
benesses ficam por conta dos gastos com uma cortesã, ou prostituta de luxo,
chamada Marcela, a quem Brás dedica a célebre frase: “Marcela amou-me durante
quinze meses e onze contos de réis”. Essa é uma das marcas do estilo
machadiano, a maneira como o autor trabalha as figuras de linguagem. Marcela é
prostituta de luxo, mas na obra não há, em nenhum momento, a caracterização nesses
termos. Machado utiliza a ironia e o eufemismo para que o leitor capte o
significado. Brás Cubas não diz, por exemplo, que Marcela só estava interessada
nos caros presentes que ele lhe dava. Ao contrário, afirma categoricamente que
ela o amou, mas fica claro que, naquela relação, amor e interesse financeiro
estão intimamente ligados.
Apaixonado por Marcela, Brás Cubas
gasta enormes recursos da família com festas, presentes e toda sorte de
frivolidades. Seu pai, para dar um basta à situação, toma a resolução mais
comum para as classes ricas da época: manda o filho para a Europa estudar leis
e garantir o título de bacharel em Coimbra.
Brás Cubas, no entanto, segue
contrariado para a universidade. Marcela não vai, como combinara, despedir-se
dele, e a viagem começa triste e lúgubre.
Em Coimbra, a vida não se altera muito.
Com o diploma nas mãos e total inaptidão para o trabalho, Brás Cubas retorna ao
Brasil e segue sua existência parasitária, gozando dos privilégios dos
bem-nascidos do país.
Em certo momento da narrativa, Brás
Cubas tem seu segundo e mais duradouro amor. Enamora-se de Virgília, parente de
um ministro da corte, aconselhado pelo pai, que via no casamento com ela um
futuro político. No entanto, ela acaba se casando com Lobo Neves, que arrebata
do protagonista não apenas a noiva como também a candidatura a deputado que o
pai preparava.
A família dos Cubas, apesar de rica,
não tinha tradição, pois construíra a fortuna com a fabricação de cubas,
tachos, à maneira burguesa. Isso não era louvável no mundo das aparências
sociais. Assim, a entrada na política era vista como maneira de ascensão
social, uma espécie de título de nobreza que ainda faltava a eles.
Não-realizações
O romance não apresenta grandes feitos,
não há um acontecimento significativo que se realize por completo. A obra
termina, nas palavras do narrador, com um capítulo só de negativas. Brás Cubas não
se casa; não consegue concluir o emplasto, medicamento que imaginara criar para
conquistar a glória na sociedade; acaba se tornando deputado, mas seu
desempenho é medíocre; e não tem filhos.
A força da obra está justamente nessas
não-realizações, nesses detalhes. Os leitores ficam sempre à espera do
desenlace que a narrativa parece prometer. Ao fim, o que permanece é o vazio da
existência do protagonista. É preciso ficar atento para a maneira como os fatos
são narrados. Tudo está mediado pela posição de classe do narrador, por sua
ideologia. Assim, esse romance poderia ser conceituado como a história dos
caprichos da elite brasileira do século XIX e seus desdobramentos, contexto do
qual Brás Cubas é, metonimicamente, um representante.
O que está em jogo é se esses caprichos
vão ou não ser realizados. Alguns exemplos: a hesitação ao começar a obra pelo
fim ou pelo começo; comparar suas memórias às sagradas escrituras;
desqualificar o leitor: dar-lhe um piparote, chamá-lo de ébrio; e o próprio
fato de escrever após a morte. Se Brás Cubas teve uma vida repleta de
caprichos, em virtude de sua posição de classe, é natural que, ao escrever suas
memórias, o livro se componha desse mesmo jeito.
O mais importante não é a realização ou
não dessas veleidades, mas o direito de tê-las, que está reservado apenas a uns
poucos da sociedade da época. Veja-se o exemplo de Dona Plácida e do negro Prudêncio.
Ambos são personagens secundários e trabalham para os grandes. A primeira
nasceu para uma vida de sofrimentos:“Chamamos-te para queimar os dedos nos
tachos, os olhos na costura, comer mal, ou não comer, andar de um lado pro
outro, na faina, adoecendo e sarando…”, descreve Brás. Além da vida de
trabalhos e doenças e sem nenhum sabor, Dona Plácida serve ainda de álibi para
que Brás e Virgília possam concretizar o amor adúltero numa casa alugada para
isso.
Com Prudêncio, vê-se como a estrutura
social se incorpora ao indivíduo. Ele fora escravo de Brás na infância e
sofrera os espancamentos do senhor. Um dia, Brás Cubas o encontra, depois de
alforriado, e o vê batendo num negro fugitivo. Depois de breve espanto, Brás
pede para que pare com aquilo, no que é prontamente atendido por Prudêncio. O
ex-escravo tinha passado a ser dono de escravo e, nessa condição, tratava outro
ser humano como um animal. Sua única referência de como lidar com a situação
era essa, afinal era o modo como ele próprio havia sido tratado anteriormente.
Prudêncio não hesita, porém, em atender ao pedido do ex-dono, com o qual não
tinha mais nenhum tipo de dívida nem obrigação a cumprir.
Conclusão
Machado alia nesse romance profundidade
e sutileza, expondo muitos problemas de nossa sociedade que existem até hoje.
Daí o prazer da leitura e a importância de seu texto, pois atualiza, de forma
irônica, os processos em que nosso país foi formado, suas contradições e os
desmandos que ainda estão presentes.
guiadoestudante.abril.com.br
DOM CASMURRO
Introdução
Maior escritor brasileiro de todos os tempos, Joaquim Maria Machado de
Assis (1839-1908) era um mestiço de origem humílima, filho de um mulato e de um
lavadeira portuguesa dos Açores. Moleque de morro, magro, franzino e doentio, o
maior escritor brasileiro se fez sozinho, adquirindo a sua vasta e espantosa
cultura de forma inteiramente autoditada.
Ao estudar a obra de Machado de Assis, a crítica divide-a em duas fases bem
distintas cujo marco deliminatório é o romance Memórias Póstumas de Brás Cubas
publicado em 1881. Até essa data, a obra machadiana é marcante romântica, e
nela sobressai poesia, conto e romances como Ressurreição (1872), A mão e a
luva (1874), Helena (1876) e Iaiá Garcia (1878). Tais obras pertencem pois, à
chamada primeira fase.
A partir de 1881, com a publicação das Memórias, Machado de Assis muda de
tal forma que Lúcia Miguel Pereira, biógrafa e estudiosa do escritor, chega a
afirmar que "tal obra não poderia ter saído de tal homem", pois,
"Machado de Assis liberou o demônio interior e começa uma nova
aventura": a análise de caracteres, numa verdadeira dissecação da alma
humana. É a Segunda fase, fase perpassada dos ingredientes do estilo realista.
Além de contos, poesia, teatro e crítica, integram essa fase os romances
seguintes, entre os quais está o nosso Dom Casmurro (1900): Memórias Póstumas
de Brás Cubas (1881), Quincas Borba (1891), Esaú e Jacó (1904) e Memorial de
Aires (1908), seu último livro, pois morre nesse mesmo ano.
Toda essa obra está ligada ao estilo realista, embora seja correto
reconhecer que um escritor da categoria ao estilo realista, embora seja correto
reconhecer que um escritor da categoria de Machado de Assis não pode ficar
preso às delimitações de um estilo de época.
Conforme observa Helen Caldwell, Dom Casmurro é "talvez o mais fino de
todos os romances americanos de ambos os continentes" ("perhaps the
finest of all American novels of either continent")
Construído em flash-back, o protagonista masculino (Dom Casmurro), já
cinqüentão e solitário, tenta "atar as duas pontas da vida" (infância
e velhice), contando a história de sua vida ao lado de Capitu, a qual acaba
tomando conta do romance, dada a sua força e o seu mistério.
Enredo de Dom Casmurro
A seguir, para que se possa acompanhar melhor a análise a que vamos
proceder neste trabalho, transcrevemos aqui o enredo elaborado por Marisa
Lajolo, em "Literatura comentada", da Abril Editora:
Dom Casmurro foi publicado em 1900 e é um dos romance mais conhecidos de
Machado. Narra em primeira pessoa a estória de Bentinho que, por circunstância
várias, vai se fechando em si mesmo e passa a ser conhecido como Dom Casmurro.
Sua estória é a seguinte: Órfão de pai, criado com desvelo pela mãe (D.
Glória), protegido do mundo pelo círculo doméstico e familiar (tia Justina, tio
Cosme, José Dias), Bentinho é destinado à vida sacerdotal, em cumprimento a uma
antiga promessa de sua mãe.
A vida do seminário, no entanto, não o atrai, já o namoro com Capitu, filha
dos vizinhos. Apesar de comprometido pela promessa, também D. Glóri a sofre com
a idéia de separar-se do filho único, interno no seminário. Por expediente de
José Dias, o agregado da família, Bentinho abandona o seminário e, em seu
lugar, ordena-se um escravo.
Correm os anos e com eles o amor de Bentinho e Capitu. Entre o namoro e o
casamento, Bentinho se forma em Direito e estreita a sua amizade com um
ex-colega de seminário, Escobar, que acaba se casando com Sancha, amiga de
Capitu.
Do casamento de Bentinho e Capitu nasce Ezequiel. Escobar morre e, durante
seu enterro, Bentinho julga estranha a forma qual Capitu contempla o cadáver. A
partir daí, os ciúmes vão aumentando e precipita-se a crise. Á medida que
cresce, Ezequiel se torna cada vez mais parecido com Escobar. Bentinho muito
ciumento, chega a planejar o assassinato da esposa e do filho, seguido pelo seu
suicídio, mas não tem coragem. A tragédia dilui-se na separação do casal.
Capitu viaja com o filho para a Europa, onde morre anos depois. Ezequiel,
já mocó, volta ao Brasil para visitar o pai, que apenas constata a semelhança
entre e antigo colega de seminário. Ezequiel volta a viajar e morre no
estrangeiro. Bentinho, cada vez mais fechado em usas dúvidas, passa a ser chamado de casmurro pelos amigos
e vizinhos e põe-se a escrever de sua vida (o romance).
Organização / Estrutura
1) Dom Casmurro é narrado em primeira pessoa pelo protagonista masculino que dá nome ao romance, já velho e
solitário, desiludido e amargurado pela casmurrice, conforme lhe está no
apelido. A visão, pois, que temos dos fatos é perpassada da sua ótica subjetiva
e unilateral: "tudo que sabemos do seu passado, de seus amores, de Capitu,
só o conhecemos do seu ângulo" - observa o Prof. Delson Gonçalves Ferreira
em estudo sobre Dom Casmurro. Em conseqüência disso, paira dúvida sobre o
adultério de Capitu - dúvida que não se tem dissipado ao longo dos anos.
2) O romance , como já observamos, é construído a partir de um flash-back,
por um cinqüentão solitário e casmurro, "à la recherche de temps perdu" ("à procura do tempo
perdido"), o qual procura "atar as duas pontas da vida" (
infância e velhice). Perpassa. Pois, o romance uma atmosfera memorialista,
dando a impressão de autobiografia, a qual, com o se sabe, não tem nada a ver com
Machado de Assis.
3) O título do livro ("Dom Casmurro") reflete uma das
características mais marcantes do protagonista masculino no crepúsculo da
existência: a visão amarga e doída de quem foi traído e machucado pela vida, e,
em conseqüência disso vai-se isolando e ensimesmando. "Não consultes
dicionários, Casmurro não está aqui no sentido que eles lhe dão, mas no que lhe
pôs o vulgo de homem calado e metido consigo. Dom veio por ironia, para
atribuir-me fumos de fidalgo" (Cap. I).
4) O romance se compõe de 148 capítulos curtos, com títulos bem precisos,
que refletem o seu conteúdo. A narrativa vai lenta até o capítulo XCVII, a
partir do qual se acelera, como declara o próprio narrador, ao dar-se conta da
sua lentidão: "Agora não há mais que levá-la a grandes pernadas, capítulo
sobre capítulo, pouca emenda, pouca reflexão, tudo em resumo. Já esta página
vale por meses, outras valerão por anos, e assim chegares ao final" (Cap.
XCVII).
5) Assim, pois, até o capítulo XCVII, quando o narrador sai do seminário,
"com pouco mais de dezessete anos", focaliza-se, em câmera lenta, a
infância e a adolescência, dada necessidade do narrador traçar o perfil dos
protagonistas da estória (Bentinho e Capitu), revelando, desde as entranhas, o
caráter e as tendências de cada um: afinal, o adulto sempre se assenta no pilar
da infância, como insinua Dom Casmurro, no final da narrativa, ao referir-se a
Capitu: "Se te lembras bem da Capitu menina, hás de reconhecer que uma
estava dentro da outra, como a fruta dentro da casca" (Cap. CXLVIII).
6) Quanto ao lugar em que decorre a ação, trata-se do Rio de Janeiro da
época do Império: há inúmeras referências a lugares, ruas, bairros, praças,
teatros, salões de baile que evocam essa cidade imperial. Por outro lado, há
também ligeiras referências a São Paulo, onde foi estudar Direito o
ex-seminarista Bentinho, e também à Europa onde morre Capitu, e mesmo aos
lugares sagrados, onde morre Ezequiel (Jerusalém).
7) Cronologicamente falando, a narrativa decorre durante o segundo Império,
detendo-se mais o autor na inicia pela razão exposta no item 5. Contudo,
construído sob a forma de flash-back; “o que domina no livro não é esse tempo
cronológico; é o psicológico, que se passa dentro das personagens, dentro da
própria vida”, observa o Prof. Delson Gonçalves. Debruçado sobre a reconstrução
da longínqua inicia de outrora, o solitário e magoado Dom Casmurro vai
reconstituindo o “tempo perdido” de sua existência, filtrando os fatos sob sua
ótica de cinqüentão amargurado, revivendo a vida subjacente, que jaz nas suas
entranhas.
DOM CASMURRO - Machado de
Assis ( Resumo) - www.mundovestibular.com.br
ESAÚ E JACÓ
A Obra
Publicado em 1904,
Esaú e Jacó é o penúltimo romance de Machado de Assis.
O título é extraído
da Bíblia, remetendo-nos ao Gênesis: à história de Rebeca, que privilegia o
filho Jacó, em detrimento do outro filho, Esaú, fazendo-os inimigos
irreconciliáveis. A inimizade dos gêmeos Pedro e Paulo, do romance de Machado,
não tem causa explícita, daí a denominação de romance "Ab Ovo" (desde
o ovo).
É o romance da
ambigüidade, narrado em 3ª pessoa, pelo Conselheiro Aires. Pedro e Paulo seriam
"os dois lados da verdade". Filhos gêmeos de Natividade e Agostinho
Santos, à medida que vão crescendo, os irmãos começam a definir seus
temperamentos diversos: são rivais em tudo. Paulo é impulsivo, arrebatado,
Pedro é dissimulado e conservador - o que vem a ser motivo de brigas entre os
dois. Já adultos, a causa principal de suas divergências passa a ser de ordem
política - Paulo é republicano e Pedro, monarquista. Estamos em plena época da
Proclamação da República, quando decorre a ação do romance.
Para apaziguar a
discórdia fraterna, de nada valem os conselhos de Aires, amigo de Natividade,
nem as previsões de discórdia e grandeza feitas por uma adivinha (A Cabocla do
Castelo), quando os gêmeos tinham ainda um ano.
Até em seus amores,
os gêmeos são competitivos. Flora, a moça de quem ambos gostam, se entretém com
um e outro, sem se decidir por nenhum dos dois: a moça é retraída, modesta, e
seu temperamento avesso a festas e alegrias, isso levou o Conselheiro Aires a dizer
que ela era "inexplicável".
O conselheiro Aires
é mais um grande personagem da galeria machadiana, que reaparecerá como
memorialista no próximo e último romance do autor: velho diplomata aposentado,
de hábitos discretos e gosto requintado, amante de citações eruditas, muitas
vezes interpreta o pensamento do próprio romancista.
As divergências
entre os irmãos continuam, muito embora, com a morte de Flora, tenham jurado
junto a seu túmulo uma reconciliação perpétua. A morte da moça, porém, une temporariamente
os gêmeos, mais tarde, também a morte de Natividade cria uma trégua entre
ambos, mas logo se lançam às disputas.
Continuam a se
desentender, agora em plena tribuna, depois que ambos se elegeram deputados por
dois partidos diferentes, absolutamente irreconciliáveis: cumpre-se, portanto,
a previsão da adivinha: ambos seriam grandes, mas inimigos.
Comentário e estudo:
100 ANOS DE ESAÚ E JACÓ, por Fabio Guimenes.
O penúltimo romance
de Machado de Assis reflete com maestria sua ambígua posição política
Joaquim José Maria
Machado de Assis (1839-1908) é unanimemente celebrado como um dos maiores
escritores brasileiros. Nenhum outro reuniu um interesse tão generalizado em
torno de sua vida e obra. Este prestígio, que outros escritores mais populares
não conseguiram alcançar, o situa à parte, representando por si só um momento
incomparável na sucessão das escolas literárias. Destoante pelo pensamento e
pelo estilo da tradição literária, Machado de Assis marca seu próprio estilo,
fazendo crer ao seu leitor que se colocava face aos acontecimentos históricos
que presenciou como simples espectador.
“As décadas situadas em torno da transição dos séculos XIX e XX (...)” diz
Nicolau Svcenko, em seu livro Literatura como Missão - Tensões Sociais e Criação
Cultural na Primeira República , “(...) assinalavam mudanças drásticas em todos
os setores da vida brasileira. Mudanças que foram registradas pela literatura,
mas, sobretudo mudanças que se transformaram em literatura.”
Nos primeiros anos da República, a
intranqüilidade social e política abatia a todos os que tinham esperança no
novo regime. Numa época em que os Realistas se desdobravam em detalhes
grosseiros, Machado preferia sugerir a declarar. Olhando a natureza como um
míope, ele, em compensação, devassa e penetra a alma dos homens, para aí sim,
exibi-la em opulência de detalhes. O estudo da obra machadiana ainda nos coloca
uma série de obstáculos. Como diz José Barreto Filho em seu livro Introdução à
obra de Machado de Assis , “Machado nos quis dizer um segredo, mas o fêz com
tanta reserva que não pôde formular talvez, nem para si mesmo”.
Definir em que
consiste este universo tem sido tema de artigos, livros e pesquisas, cada qual
trazendo sua interpretação. O objetivo deste ensaio é mostrar como Machado de
Assis tornou-se um excelente retratista de seu tempo. Através de sua
literatura, pode-se conhecer o que de mais característico havia no Rio de
Janeiro.
Machado não escreveu
a História dos Subúrbios, prometida em Dom Casmurro através do
personagem-narrador, mas, em compensação, compôs, através de sua visão, a
história política e social de toda a cidade, quando esta exercia ainda segundo
Sevcenko “papel preponderante, senão hegemônico, como capital cultural, além de
ser o centro das decisões políticas e administrativas”.
Em sua dissertação de mestrado, defendida em
1985 na UFF intitulada A República do Pica-pau Amarelo , o Professor Doutor
André Luiz Vieira de Campos diz que “mais do que simples testemunho da
sociedade, a literatura pode revelar seus conflitos dissimulados e desejos não
realizados”.
Não há produção
humana desvinculada da realidade de seu tempo; por isso, a literatura sempre
foi um importante instrumento na formação da mentalidade das elites do país.
Esaú e Jacó , escrito em 1904, foi o penúltimo
romance de Machado de Assis, trazendo uma particularidade: reflete a posição
política de um homem tido como alheio aos movimentos de tal natureza.
O escritor retoma,
no título, a referência bíblica — típica de sua ficção — remetendo a história
de Pedro e Paulo ao episódio do Antigo Testamento ( Gênesis, capítulos 27 a 33)
. Os gêmeos nos trazem reflexões políticas que, certamente, ocupavam o
imaginário da época, além de Flora, apaixonada pelos irmãos, que caracteriza a
indecisão, marca registrada da obra machadiana, que nada afirma sem, logo a
seguir, meter a dúvida de permeio. Machado de Assis utiliza as duas personagens
— Pedro e Paulo — para, em cada uma, incorporar seu espírito hesitante e em
constante luta íntima na grande questão que nos traz esta obra: Monarquia X
República.
A grande preocupação dos estudiosos da obra
machadiana é situar suas tendências políticas ao lado da República contra o
Império. Mas como diz H. Pereira da Silva em seu livro Sobre os Romances de
Machado de Assis , “determinar-lhe o comportamento político só mesmo pelo
método dedutivo. E deduzi-lo partidário da República implica em sofismar mais
do que em deduzir”.
“Há nos mais
graves acontecimentos, muitos pormenores que se perdem, outros que a imaginação
inventa para suprimir os perdidos, e nem por isso a história morre”, prega um trecho de Esaú e Jacó . O livro possui uma
particularidade: refletir a posição política de um homem tido como alheio a
movimentos de tal natureza. Acusado de indiferente, frio e inteiramente
desligado das paixões políticas, Machado de Assis, nesta obra, discute e analisa
uma das mais importantes épocas da política brasileira.
ESAÚ E JACÓ - Machado de
Assis (Resumo) - www.mundovestibular.com.br
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