Casimiro José Marques de Abreu (Silva Jardim, 4 de janeiro de 1839 — Nova Friburgo, 18 de outubro de 1860) foi um poeta brasileiro da
segunda geração romântica.
Foi filho de José Campos de Carvalho comerciante e fazendeiro português José
Joaquim Marques de Abreu[1] e
de Luísa Joaquina das Neves,foi seu vizinho uma fazendeira de Silva Jardim (na
época, Capivary), viúva do primeiro casamento. Com José Joaquim ela teve três
filhos, embora nunca tenham sido oficialmente casados. Casimiro nasceu na Fazenda
da Prata, em Casimiro de Abreu, propriedade herdada por sua mãe em
decorrência da morte do seu primeiro marido, de quem não teve filhos.
A localidade onde viveu parte de sua vida, Barra de São João, é hoje distrito domunicípio que leva
seu nome, e também chamada "Casimiro de Abreu", em sua homenagem.
Recebeu apenas a instrução primária no Instituto Freeze, dos onze aos treze
anos, em Nova Friburgo, então cidade de maior porte da região serrana do estado do Rio de
Janeiro, e para onde convergiam, à época, os adolescentes induzidos
pelos pais a se aplicarem aos estudos.
Aos treze anos transferiu-se para o Rio de Janeiro para trabalhar com o
pai no comércio. Com ele, embarcou para Portugal em
1853, onde entrou em contato com o meio intelectual e escreveu a maior parte de
sua obra. O seu sentimento nativista e as saudades da família escreve: "estando
a minha casa à hora da refeição, pareceu-me escutar risadas infantis da minha
mana pequena. As lágrimas brotavam e fiz os primeiros versos de minha vida, que
teve o título de Ave Maria".
Seus versos mais famosos do poema Meus oito anos: Oh!
Que saudades que tenho/da aurora da minha vida,/ da minha infância querida/que
os anos não trazem mais!/ Que amor, que sonhos, que flores,/naquelas tardes
fagueiras,/ à sombra das bananeiras,/ debaixo dos laranjais!
Em 1857 retornou ao Brasil para trabalhar no armazém de seu pai. Isso, no
entanto, não o afastou da vida boêmia. Escreveu para alguns jornais e fez
amizade com Machado de Assis. Escolhido para a recém
fundada Academia Brasileira de Letras, tornou-se
patrono da cadeira número seis.
Tuberculoso,
retirou-se para a fazenda de seu pai, Indaiaçu,
hoje sede do município que recebeu o nome do poeta, onde inutilmente buscou uma
recuperação do estado de saúde, vindo ali a falecer. Foi sepultado conforme seu
desejo em Barra de São João, estando sua lápide no cemitério da secular Capela
de São João Batista, junto ao túmulo de seu pai. Em 1859 editou as suas poesias
reunidas sob o título de Primaveras.
Espontâneo e ingênuo, de linguagem simples, tornou-se um dos poetas mais
populares do Romantismo no Brasil. Seu sucesso literário, no entanto,
deu-se somente depois de sua morte, com numerosas edições de seus poemas, tanto
no Brasil,
quanto emPortugal.
Deixou uma obra cujos temas abordavam a casa paterna, a saudade da terra natal,
e o amor (mas este tratado sem a complexidade e a profundidade tão caras a
outros poetas românticos). A despeito da popularidade alcançada pelos livros do poeta, sua
mãe, e herdeira necessária, morreu em 1859 na mais absoluta pobreza, não tendo
recebido nada em termos de direitos autorais, fossem do Brasil, fossem de
Portugal.
Principais
Obras
Poesias
§ Primaveras
(1859)
Teatro
§ Camões
e o Jau (1856)
Prosa Poética
§ A
virgem loura Páginas do coração (1857)
Romance
§ Carolina
(1856)
§ Camila
(inacabado) (1856)
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CARACTERÍSTICAS LITERÁRIAS
Sua poesia é das mais populares e mais lidas pelo povo
brasileiro, Meus Oito Anos [ver Antologia], por exemplo, mesmo não sendo das
melhores dentre seus contemporâneos. Sua popularidade se deve à linguagem
simples, terna, cativante e de leitura fácil que o poeta empregou para cantar
os temas mais comuns do Romantismo. O amor expresso em seus poemas é sempre
impossível, delicado, platônico e idealizado, entrando em atrito com a pureza,
a paixão contida e o receio de corresponder e se entregar à mulher amada.
Sua obra, aliás, é quase toda tomada pelo tormentoso conflito
entre o desejo e o medo, a realidade perturbadora e a pureza da infância, da
natureza e dos sonhos, gerando a tristeza, a melancolia e o depressivo desejo
de morte. A saudade também é largamente cantada em seus versos, acentuando
desde as dores da distância da pátria e da família, até a distância da
infância, onde o poeta lamenta a pureza e os sonhos perdidos. A obra de
Casimiro de Abreu, no entanto, carece de uma linguagem mais rica e um estilo
mais criativo, aprofundado.
Sua poesia, entretanto, agradou muito a leitores menos exigentes
e donzelas ávidas por palavras e versos de amor, mas nunca chegou a ter a
riqueza de imagens que encontramos nos poemas mais fecundos de Gonçalves Dias e
Castro Alves. Tão pouco se aproxima dos versos mais irônicos e satânicos, mas
não menos ingênuos, de Álvares de Azevedo. Sua virtude está em exprimir e
traduzir de uma forma pura e delicada todos os sentimentos e emoções mais
latentes de um povo que ainda cantava as glórias da independência e a grandeza
da pátria, o que lhe atribuiu fama e popularidade fácil.
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AS PRIMAVERAS,
de Casimiro de Abreu
Em Primaveras, de Casimiro de Abreu, acham-se os temas
prediletos do poeta e que o identificam como lírico-romântico: a nostalgia da
infância, a saudade da terra natal, o gosto da natureza, a religiosidade
ingênua, o pressentimento da morte, a exaltação da juventude, a devoção pela
pátria e a idealização da mulher amada. A sua visão do mundo externo está
condicionada estreitamente pelo universo do burguês brasileiro da época
imperial, das chácaras e jardins. Trata de uma natureza onde se caça passarinho
quando criança, onde se arma a rede para o devaneio ou se vai namorar quando
rapaz.Este único livro de poesias escrito por Casimiro de Abreu, foi lançado em
7 de Setembro de 1859, e é uma coleção de poesias melancólicas e sentimetais
pela maior parte, em que a uma grande simplicidade na forma se alia um sentimento
apaixonado e veemente.
À simplicidade da matéria poética corresponde amaneiramento paralelo da forma. Casimiro de Abreu desdenha o verso branco e o soneto, prefere a estrofe regular, que melhor transmite a cadência da inspiração "doce e meiga" e o ritmo mais cantante. Colocado entre os poetas da segunda geração romântica, expressa, através de um estilo espontâneo, emoções simples e ingênuas. Estão ausentes na sua poesia a surda paixão carnal de Junqueira Freire, ou os desejos irritados, macerados, de Álvares de Azevedo. Ele pôde sublimar em lânguida ternura a sensualidade robusta, embora quase sempre bem disfarçada, dos seus poemas essencialmente diurnos, nos quais não se sente a tensão das vigílias. Vê-se então que o livro As primaveras articula-se em torno de três temas básicos:
À simplicidade da matéria poética corresponde amaneiramento paralelo da forma. Casimiro de Abreu desdenha o verso branco e o soneto, prefere a estrofe regular, que melhor transmite a cadência da inspiração "doce e meiga" e o ritmo mais cantante. Colocado entre os poetas da segunda geração romântica, expressa, através de um estilo espontâneo, emoções simples e ingênuas. Estão ausentes na sua poesia a surda paixão carnal de Junqueira Freire, ou os desejos irritados, macerados, de Álvares de Azevedo. Ele pôde sublimar em lânguida ternura a sensualidade robusta, embora quase sempre bem disfarçada, dos seus poemas essencialmente diurnos, nos quais não se sente a tensão das vigílias. Vê-se então que o livro As primaveras articula-se em torno de três temas básicos:
· o lirismo amoroso
· a saudade da pátria e da infância
· a tristeza da vida
Vivendo três anos em Portugal, onde elaborou boa parte de As
primaveras, Casimiro de Abreu desenvolveu o sentimento de exílio, que tanto
perseguia os românticos. Inspirado em Gonçalves Dias, escreveu uma série de
poemas impregnados de nostalgia da terra natal, denominados Canções do exílio.
Neles, contudo, não chega a alcançar o nível de seu modelo.
No entanto, não é apenas a saudade do Brasil e a correspondente sensação de estar exilado que anima a sua lírica. O que o consagrou foi a nostalgia (tipicamente romântica) daquelas realidades pessoais que ficam para trás: a mãe, a irmã, o lar, a infância. Tornou-se, por excelência, o poeta da "aurora da vida", do tempo perdido, das emoções da meninice. Mesmo sabendo que a infância não significa o paraíso, sucumbiu à doçura dessas lembranças.
No entanto, não é apenas a saudade do Brasil e a correspondente sensação de estar exilado que anima a sua lírica. O que o consagrou foi a nostalgia (tipicamente romântica) daquelas realidades pessoais que ficam para trás: a mãe, a irmã, o lar, a infância. Tornou-se, por excelência, o poeta da "aurora da vida", do tempo perdido, das emoções da meninice. Mesmo sabendo que a infância não significa o paraíso, sucumbiu à doçura dessas lembranças.
À parte isso, o poeta atrai o leitor com o ritmo fácil, a singeleza do pensamento,
a ausência de abstrações, o caráter recitativo e o tratamento sentimental que
empresta ao tema, garantindo a eternidade de pelo menos um poema, "Meus
oito anos":
Oh! que saudades que tenho
Da aurora da minha vida,
Da minha infância querida
Que os anos não trazem mais!
Que amor, que sonhos, que flores,
Naquelas tardes fagueiras
À sombra das bananeiras,
Debaixo dos laranjais!
Como são belos os dias
Do despontar da existência!
- Respira a alma inocência
Como perfumes a flor;
O mar é - lago sereno,
O céu - um manto azulado,
O mundo - um sonho dourado,
A vida - um hino d'amor!
Que auroras, que sol, que vida,
Que noites de melodia
Naquela doce alegria,
Naquele ingênuo folgar!
O céu bordado d'estrelas,
A terra de aromas cheia,
As ondas beijando a areia
E a lua beijando o mar!
Oh! dias da minha infância!
Oh! meu céu de primavera!
Que doce a vida não era
Nessa risonha manhã.
Em vez das mágoas de agora,
Eu tinha nessas delícias
De minha mãe as carícias
E beijos de minha irmã!
Livre filho das montanhas,
Eu ia bem satisfeito,
De camisa aberto ao peito,
- Pés descalços, braços nus –
Correndo pelas campinas
À roda das cachoeiras,
Atrás das asas ligeiras
Das borboletas azuis
Naqueles tempos ditosos
Ia colher as pitangas,
Trepava a tirar as mangas,
Brincava à beira do mar;
Rezava às Ave-Marias,
Achava o céu sempre lindo,
Adormecia sorrindo
E despertava a cantar!
Oh! Que saudades que tenho
Da aurora de minha vida (...)
No final de uma vida breve, pressentindo a morte, o poeta aprofunda o
sentimento de tristeza - já presente em seus textos saudosistas, até
transformá-lo num sentimento quase desesperado de impotência perante o destino,
conforme se pode verificar em Livro negro, composto por doze poemas doloridos.
Deles, o mais significativo é "Minha alma é triste":
Minha alma é triste como a rola aflita
Minha alma é triste como a rola aflita
Que o bosque acorda desde o albor da aurora
E em doce arrulo que o soluço imita
O morto esposo gemedora chora.
E, como rola que perdeu o esposo,
Minh'alma chora as ilusões perdidas
E no seu livro de fanado gozo
Relê as folhas que já foram lidas.
No poema de circunstância "A Faustino Xavier de Novais",
ele demonstra não ter sido somente o cantor de uma ternura ingênua. Imbuído do
mais puro sarcasmo, aponta suas armas, nesse poema, contra os desvios sociais
da época:
Venha a sátira mordente,
Brilhe viva a tua veia,
Já que a cidade está cheia
Desses eternos Manés:
Os barões andam às dúzias
Como os frades nos conventos,
Comendadores aos centos,
Viscondes - a pontapés.
(...)
Pinta este Rio num quadro:
As letras falsas dum lado,
As discussões do Senado,
As quebras, os trambolhões,
Mascates roubando moças,
E lá no fundo da tela
Desenha a febre amarela,
Vida e morte aos cachações.
Casimiro de Abreu, em As primaveras, registra o esquema
afetivo de sua geração. A rigor, os poetas dessa geração eram estudantes dados
à boemia, oriundos de famílias de classes abastadas, cujos padrões culturais
traduziam a assimilação de padrões da cultura européia.
www.passeiweb.com
Luís Nicolau Fagundes Varella (Rio Claro, 17 de agosto de 1841 — Niterói, 18 de
fevereiro de 1875) foi um poeta brasileiro, patrono na Academia Brasileira de Letras.
Filho do magistrado Emiliano Fagundes Varella e de Emília de Andrade,
ambos de ricas famílias cariocas.
Poeta romântico e boêmio inveterado, Fagundes Varella foi
um dos maiores expoentes da poesia brasileira, em seu tempo. Tendo ingressado
no curso de Direito (e frequentado aFaculdade de Direito de São Paulo e
a Faculdade de Direito do Recife),
abandonou o curso no quarto ano. Foi a transição entre a segunda e a terceira
geração romântica.
Diria, reafirmando sua vocação exclusiva para a arte, no poema "Mimosa",
na boca duma personagem: "Não sirvo para doutor"...
Casando-se muito novo (aos vinte e um anos) com Alice Guilhermina
Luande, filha de dono de um circo, teve um filho que veio a morrer aos três
meses. Este fato inspirou-lhe o poema "Cântico do Calvário",
expressão máxima de seus versos, tão jovem ainda. Sobre estes versos, analisou Manuel
Bandeira:
"...uma das mais belas e sentidas nênias da poesia em língua
portuguesa. Nela, pela força do sentimento sincero, o Poeta atingiu aos vinte
anos uma altura que, não igualada depois, permaneceu como um cimo isolado em
toda a sua poesia."
Casou-se novamente com uma prima - Maria Belisária de Brito Lambert,
sendo novamente pai de duas meninas e um menino, também falecido
prematuramente.
Embriagando-se e escrevendo, faleceu ainda jovem, vivendo à custa do
pai, passando boa parte do tempo no campo, seu ambiente predileto.
Fagundes Varella morreu com 34 anos de idade.
Obras
§ Noturnas -
1860
§ Vozes
da América - 1864
§ Pendão
Auri-verde - poemas patrióticos, acerca da Questão Christie.
§ Cantos
e Fantasias - 1865
§ Cantos
Meridionais - 1869
§ Cantos
do Ermo e da Cidade - 1869
§ Anchieta ou O
Evangelho nas Selvas - 1875 (publicação póstuma)
§ Diário
de Lázaro - 1880
Em 1878 seu amigo Otaviano Hudson organizou Cantos Religiosos,
cuja publicação destinava-se a auxiliar sua viúva e filhas.
Academia
Brasileira de Letras
Por instância de Lúcio de Mendonça, foi a sua cadeira nominada
em honra a Fagundes Varela. Considerado um dos maiores expoentes
das letras no Brasil, um seu busto orna o prédio do silogeu brasileiro.
Fagundes Varela – Wikipédia, a enciclopédia livrept.wikipedia
CARACTERÍSTICAS DO POETA
Em 1861 publicou o primeiro livro de poesia, Noturnas. No ano de 1859 Fagundes Varela viaja para São Paulo, e em 1862 matricula-se na Faculdade de Direito, que nunca seria concluída, optando pela literatura e dissipando-se na boemia, fortemente influenciado pelo ''byronismo'' dos estudantes paulistanos. No mesmo ano casou-se com Alice Guilhermina Luande, atriz circense da cidade de Sorocaba. Este matrimônio não era desejado pelas famílias do casal, assim a penúria financeira de Fagundes Varela foi agravada.Uma das mais belas obras do autor é o poema Cântico do Calvário, inspirado na morte precoce de Emiliano, seu primeiro filho, falecido aos três meses de vida. A partir deste momento, o poeta entrega-se definitivamente ao alcoolismo. Em contrapartida, cresce sua inspiração criadora.Vozes da América foi publicada em 1864, e sua obra-prima Cantos e Fantasias, em 1865. No ano seguinte, viaja para Recife e é avisado sobre o falecimento da esposa. Assim, em 1867 retorna para São Paulo e matricula-se novamente no 4º ano de Direito. Porém, abandona o curso mais uma vez e recolhe-se na casa paterna, em sua cidade natal. Fagundes Varela permanece até 1870 em Rio Claro, compondo suas obras entre noitadas boêmias, vagando indefinidamente pela vida.Casou-se pelas segunda vez com a prima Maria Belisária, com quem teve duas filhas e um filho que também morreu prematuramente. Em 1870 vai para Niterói na companhia de seu pai, estabelecendo-se ocasionalmente na casa de familiares e ainda frequentando a vida noturna carioca. Em 17 de fevereiro de 1875, morre aos 34 anos de apoplexia, já em estado de completo desequilíbrio mental.Em uma de suas primeiras obras (Arquétipo), Fagundes Varela revela-se um hábil na arte de versar. Além da angústia predominante em sua poesia, percebe-se também uma forte apelação religiosa e mística. A influência amorosa e até mesmo os temas sociais e patrióticos enquadram-se na totalidade de sua extensa obra.
Fagundes Varela - Brasil Escola www.brasilescola.com
O ROMANTISMO E A RELIGIOSIDADE EM "CÂNTICO DO CALVÁRIO",de Fagundes Varela
O poema pode ser lido neste mesmo blog:
Reflexões e análise
Sobre seus críticos pode-se dizer que não eram unânimes quanto à
importância de Fagundes Varela para o cenário literário brasileiro, como diz
Orna Messer Levin na introdução da obra Cantos
e Fantasias e Outros Contos, organizado pela autora:
No quadro geral da poesia brasileira, Fagundes Varela
(1841-18750) ocupa uma posição de trânsito situando-se ao lado da segunda
geração romântica, em relação à qual foi visto ora como um mero seguidor, ora
como crítico, consciente dos excessos e desgastes da lírica sentimental e cujo
mérito maior teria sido o de preparar o caminho para os vôos elevados da poesia
condoreira.
E sobre a obra do autor, diz Levin:
(...) podemos reconhecer a irregularidade do poeta, nem sempre
feliz nas escolhas, entregue a uma sentimentalidade crônica. Sobressai, no
entanto, o aspecto polivalente de sua escrita, que evolui de maneira desigual,
avançando e retrocedendo com passos e contrapassos.
A unanimidade da crítica se dá apenas em relação ao poema em
análise neste trabalho. Sobre ele, dizem os críticos ser um dos mais belos
poemas da literatura brasileira, concordando também que é o mais célebre de
Fagundes Varela. Diz Manuel Bandeira:
(...) uma das mais belas e sentidas nênias da poesia em língua
portuguesa. Nela, pela força do sentimento sincero, o poeta atingiu aos vinte
anos uma altura que, não igualada depois, permaneceu como um cimo isolado em
toda a sua poesia.
Se o Romantismo é “o primado exuberante da emoção, imaginação,
paixão, intuição, liberdade pessoal e interior” como diz Vagner Camilo, temos
então em Cântico do Calvário uma obra romântica por excelência.
O filho falecido é apresentado por meio de um léxico sublimizante já nos
primeiros versos: pomba,
estrela, messe, idílio, glória, inspiração e pátria. Nesta mesma estrofe, alguns versos
podem ser analisados sob a perspectiva bíblica, como os versos de 1
a 3:
Eras na vida a pomba predileta
Que sobre um mar de angústias conduzia
O ramo da esperança.
Estes versos podem ser vistos como referência ao Dilúvio,
narrado no livro do Gênesis (capítulo 7, versículos de 1
a 14). Após
as chuvas pararem, Noé deseja saber se as águas já baixaram e solta um corvo e
uma pomba para fora da arca. O corvo, que faz seu ninho nos altos picos das
montanhas volta para a arca, e a pomba, que não encontra lugar para pousar as
patas também retorna. Após sete dias, Noé envia novamente a pomba que retorna à
arca com um ramo novo de oliveira no bico, sinal de que a vida poderia ser
reiniciada.
Continuando nesta estrofe, podemos notar o que pode ser mais uma
referência bíblica nos versos 3, 4 e 5:
Eras a estrela
Que entre as névoas do inverno cintilava
Apontando o caminho para o pegureiro
De acordo com o Evangelho de Mateus
(capítulo 2), que narra a visita dos magos à Jesus; vindos do oriente eles
seguem uma estrela e chegam ao local de nascimento do Menino. Também em relação
ao termo “pegureiro”, que segundo o Houaiss quer dizer “pastor”, pode
referir-se ao Evangelho de Lucas; quando o evangelista narra o nascimento de
Jesus no capítulo 2, versículos de 8
a 12, fala
de pastores que estavam nos campos das proximidades da manjedoura e que foram
avisados por anjos sobre o nascimento.
Porém, opondo-se
à imagem sublimada do filho, há uma quebra da sequência harmônica, como diz
Levin, e que enfatiza a fatalidade das ações:
Pomba – varou-te a flecha do destino!
Astro – engoliu-te o temporal do norte!
Teto – caíste! – criança, já não vives!
Orna Levin faz uma ótima reflexão a respeito desta quebra:
A síntese decorrente da justaposição de imagens fortes de queda
tenta reproduzir o efeito da interrupção abrupta da energia vital ascendente,
ao qual o fluxo das metáforas iniciais aludia. A morte, uma vez reproduzida
enquanto corte, deixa de ser apenas marca de uma existência física interrompida
para se configurar como um motivo de reflexão poética, permitindo que o autor
passe em revista a própria ideia de inspiração.
Não temos nestes versos um simples transbordamento de
sentimentalismo, da dor de um pai que acaba de perder seu filho e procura
desabafar do modo que lhe parece melhor. A angústia, a tortura e a dor da
ausência do ser amado transforma-se em força motora na criação de uma elegia,
onde a estética romântica atinge seu auge, não apenas nas metáforas mas também
no encadeamento dos versos e no jogo sintático utilizados pelo poeta.
Seguindo esta linha de reflexão, vale também destacar os versos 21
a 25:
São mortos para mim da noite os fachos,
Mas Deus vos faz brilhar, lágrimas santas,
E à vossa luz caminharei nos ermos!
Estrelas do sofrer – gotas de mágoa,
Brando orvalho do céu! – Sede benditas!
Refletindo sobre a importância da Natureza para o poeta romântico,
Camilo diz que ela “converte-se em palco de confissões e lamentos da alma
ferida”. É o local de encontro do poeta consigo mesmo, seulocus amenus espiritual, onde chora e lamenta
aquilo de que foi privado. Nos versos acima as palavras noite e ermos são muito utilizadas neste período
como metáfora de sofrimento, de obscuridade em relação aos sentimentos. Mas é
como se para Varela houvesse uma esperança. Apesar de dizer que os fachos da
noite estão mortos para ele, o poeta também acredita que as lágrimas santas o
ajudarão a caminhar no ermo. Voltando à Bíblia, no livro do profeta Isaías,
capítulo 45, versos de 1
a 8, temos
a narração da profecia sobre Ciro, rei persa, que marchou vitoriosamente sobre
a região do Oriente Médio por volta do ano 538
a.C. Iahweh chama Ciro de “seu ungido” criando assim um
paradoxo, já que este epíteto é utilizado aqui para nomear um soberano
estrangeiro que não conhece a Iahweh. O fato é que nos versos finais deste
trecho bíblico, temos Iahweh dizendo que tudo criou, luz e trevas, que assegura
o bem-estar e a desgraça; ordena ainda que o orvalho desça dos céus e que da
terra brote a felicidade.
A felicidade de Fagundes Varela em ser pai pode ser mensurada nos
versos 82
a 87:
Quando fitei teus olhos sossegados,
Abismos de inocência e de candura,
E baixo e a medo murmurei: meu filho!
Meu filho! frase imensa, inexplicável,
Grata como o chorar de Madalena
Aos pés do Redentor...
A metáfora utilizada pelo poeta adquire
uma força grandiosa se observarmos o trecho bíblico que nos conta a história de
Maria Madalena, ou Maria de Magdala como também é conhecida. No Evangelho de
Lucas, Maria, chamada Madalena é aquela de cujo corpo haviam sido expulsos sete
demônios. Ela pertencia ao grupo das mulheres que acompanhavam Jesus e seus
apóstolos e aparece no capítulo 8 deste evangelho, versos de 1 a 3. É uma
personagem de grande importância na narrativa sobre a paixão e morte de Jesus
Cristo, tanto que é mencionada nos três Evangelhos sinóticos – Mateus, Marcos e
Lucas – e também no Evangelho de João. Esteve aos pés da cruz juntamente com
Maria, a mãe de Jesus. Mas por que o poeta diz “grata como o chorar de Madalena
aos pés do Redentor”? Há um discurso muito comum que atribui a Maria Madalena a
passagem da prostituta que é perdoada por Jesus no capítulo 7, versículos 36 a 50 do
Evangelho de Lucas, porém não há nenhuma menção ao nome desta mulher que
“demonstrou muito amor”; neste trecho Jesus diz a Simeão: “(...) seus numerosos
pecados lhe serão perdoados porque ela demonstrou muito amor. Mas aqueles a
quem pouco foi perdoado mostra pouco amor”. Na sequência bíblica vemos a
referência a “Maria, chamada Madalena, da qual haviam saído sete demônios”
(Lucas cap. 8, vers. 2); é senso comum entre os estudiosos da bíblia que as
doenças e possessões demoníacas eram vistas pelos judeus como punição pelos
pecados cometidos; este pecado poderia ter origem no próprio enfermo ou em
algum de seus antepassados – consideravam que o pecado era transmitido para as
gerações seguintes –, o que fazia de Madalena uma pecadora grave, pois não foi
apenas um demônio que saiu de seu corpo e sim sete! E ela demonstra tanto amor
que segue Jesus até sua cruz, o momento em que até os seus discípulos, exceto
João, o abandonam por medo de sofrer a mesma condenação; chora a perda do
Mestre, aquele que lhe devolveu a dignidade. Vale destacar também que Madalena
foi a mensageira da ressurreição de Jesus para os discípulos.
Estes versos que se referem a Madalena
podem, partindo de uma livre interpretação dos fatos, ser um sinal do
arrependimento do poeta, cuja vida foi desregrada do ponto de vista da moral da
sociedade de sua época, fortemente marcada por valores cristãos-católicos.
Talvez o nascimento do filho tenha tocado de tal forma Varela que ele realmente
se sentiu uma Madalena aos pés do Redentor. Friso aqui a palavra Redentor. O poeta
poderia ter escrito “aos pés de Jesus”, mas prefere utilizar o termo “Redentor”
talvez porque acredite que ele realmente possa redimir os pecados. Não há
muitos textos para embasar esta perspectiva, mas vale destacar o que diz Orna
Levin quando fala sobre a obra Anchieta:
(...) o fato é que seu vício se incorporou
ao imaginário dos leitores, e nem o domínio dos processos poéticos que
demonstra nesta redação, nem a erudição bíblica, quiçá motivada pela
necessidade de uma reconciliação pela fé, atenuaram-lhe a imagem degradante de
poeta alcoolizado e sem rumo. Na tentativa de restaurar a má fama e divulgar a
conversão do irmão, Ernestina Varela dedicou-se a reunir os esparsos de Cantos
religiosos (1868) e
transferir a ênfase crítica para o veio místico que atravessa a religiosidade
romântica de sua obra.
Podemos encontrar várias outras
referências religiosas e bíblicas emCântico do Calvário que
mereceriam uma análise mais aprofundada,incluindo as que aqui já foram
abordadas. O próprio título do poema é uma referência direta ao Calvário de
Jesus Cristo (Lucas cap. 23, vers. 26 a 32), cujo
cântico entoado só pode ser de dor e lamento, assim como o cântico do poeta.
Cabe um último destaque para os quatro versos finais do poema:
Quando a morte fria
Sobre mim sacudir o pó das asas,
Escada de Jacó serão teus raios
Por onde asinha subirá minh’alma.
Temos uma referência explícita à escada que aparece no sonho de Jacó, narrada no livro do Gênesis, capítulo 28, versículos 10 a 22. Após
reclinar a cabeça sob uma pedra, Jacó adormece e em sonho vê uma escada que se
ergue da terra e cujo topo atingia o céu. Por ela os anjos de Deus subiam e
desciam. Neste mesmo sonho, Iahweh aparece diante de Jacó, também chamado de
Israel e dá a ele e sua descendência aquela terra. A escada de Jacó é vista por
muitos biblistas como uma prefiguração da morte: por ela os anjos descem e por
ela devem os homens subir ao encontro da vida eterna. Com certeza a escolha
desta imagem sublimada da morte, não foi à toa para fechar o poema. Se de fato
ele se converteu ou se apenas escreveu o poema movido por um profundo
sentimento de dor pela perda do filho amado, pode-se perceber nestes versos
finais a esperança de salvação que toca o poeta e que o faz crer que
reencontrará o filho que já está nos braços do Criador naquele momento do qual
nenhum ser humano poderá se livrar: a morte.
Temos uma referência explícita à escada que aparece no sonho de Jacó, narrada no livro do Gênesis, capítulo 28, versículos
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